Quase 70 mil desalojados e mais de um milhão de lares sem água por chuvas no Rio Grande do Sul
Em seu último boletim, o órgão também disse que as inundações já afetam meio milhão de habitantes da região sul
Quase 70 mil pessoas tiveram que deixar suas casas e mais de um milhão de lares estão sem abastecimento de água no Rio Grande do Sul, atingido por uma catástrofe climática, informou a Defesa Civil neste sábado (4).
Em seu último boletim, o órgão também disse que as inundações já afetam meio milhão de habitantes da região sul, onde as autoridades trabalham contra o relógio para resgatar pessoas em risco.
À medida que as horas passam, a crise provocada pelas fortes chuvas se torna mais evidente: cerca de 69.200 pessoas deixaram suas casas, mais de um milhão de lares estão sem água e os danos nas infraestruturas são, por enquanto, incalculáveis, segundo a Defesa Civil.
O estado precisará de uma espécie de "Plano Marshall" para ser reconstruído, afirmou o governador Eduardo Leite (PSDB-RS).
Porto Alegre, com uma população de quase 1,4 milhão, e especialmente sua região metropolitana, foram muito afetadas.
Segundo a prefeitura, o nível do rio Guaíba, que corta a cidade, atingiu 5,09 metros, acima do recorde de 4,76 metros registrado durante as históricas inundações de 1941.
A cidade estava em estado de caos, constatou a AFP. Muitas ruas permaneciam alagadas e os moradores tentavam evacuar suas casas.
No meio das operações de resgate, uma forte explosão em um posto de gasolina deixou dois mortos no norte da cidade, constatou um jornalista da AFP presente no momento da explosão.
O incidente ocorreu quando veículos envolvidos nos resgates estavam abastecendo no posto de gasolina inundado, de onde saiu uma espessa nuvem de fumaça, visível de longe.
Em muitos lugares, formaram-se longas filas para tentar pegar um ônibus, enquanto os motoristas de carros tentavam abrir caminho em meio às inundações.
A situação também obrigou a cancelar a chegada e saída de ônibus na estação principal da cidade, localizada às margens do Guaíba.
O aeroporto internacional de Porto Alegre suspendeu suas operações na sexta-feira por tempo indeterminado.
No bairro Navegantes, zona norte de Porto Alegre, José Augusto Moraes de Lima pediu ajuda aos bombeiros para resgatar uma criança que estava presa em sua casa, já que um problema na perna o impediu de levá-la consigo.
"De repente, em questão de minutos, em menos de uma hora, encheu tudo. Perdi tudo, televisão, guarda-roupa, cama, frigideira, tudo", disse à AFP o comerciante de 61 anos, angustiado.
O governador Leite disse em transmissão ao vivo no Instagram neste sábado que esta é uma situação "dramática" e "absolutamente sem precedentes".
Em coletiva de imprensa ao lado de ministro do governo, que viajaram a Porto Alegre para cooperar, o governador disse temer que o abastecimento e a cadeia de produção da região seja comprometida.
Em uma corrida contra o relógio, "amanhã [domingo] será um dia-chave para os resgates", disse o ministro-chefe da Secretaria de Comunicação da Presidência, Paulo Pimenta (PT-RS).
O prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo (MDB-RS), pediu à população que racione água, depois que quatro das seis plantas de tratamento da cidade tiveram que ser fechadas.
Resgate de um bebê
Porto Alegre é a capital de um dos estados mais prósperos do Brasil, com o quinto PIB do país e uma produção essencialmente agrícola, com grandes cultivos de soja, arroz, trigo e milho.
No estado, brigadas de resgate tentam alcançar e abastecer vários municípios isolados, sem comunicações e com estradas bloqueadas, e inclusive sem luz ou água.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva publicou um vídeo de membros das Forças Armadas resgatando um bebê em um helicóptero. Nas imagens, um agente pode ser visto batendo no telhado de uma casa com um tijolo para retirar o bebê, enrolado em um cobertor.
A Defesa Civil informou neste sábado que há 57 mortos, 67 desaparecidos, 74 feridos e 32.600 evacuados.
As autoridades estão trabalhando para instalar abrigos em centros esportivos e outros estabelecimentos, que até agora receberam mais de 9.500 pessoas em todo o estado, segundo a Defesa Civil.
Em um deles, instalado em um centro cultural de Gravataí, subúrbio da zona norte de Porto Alegre, está Claudio Almiro.
"Quando saí de casa, estava com água até a cintura", disse à AFP o homem de 55 anos com o rosto abatido. "Eu perdi tudo".
"Muita gente morreu, por isso levo as mãos para o céu e dou graças a Deus por ter sobrevivido", afirmou.
'Combinação desastrosa'
Imagens aéreas da área mostram enormes superfícies totalmente inundadas, pontes e estradas destruídas e resgates de pessoas em telhados com helicópteros.
A previsão antecipa até domingo chuvas de "altíssima severidade" que irão sobrecarregar ainda mais os rios e poderão provocar grandes deslizamentos de terra, informou na sexta-feira a Defesa Civil.
As chuvas atingem também o estado de Santa Catarina, onde foi registrada na sexta-feira a morte de um homem quando seu carro foi arrastado pela correnteza no município de Ipira.
A "combinação desastrosa" da mudança climática com o fenômeno meteorológico El Niño favoreceu as chuvas devastadoras que atingem o sul do país e outros eventos extremos, explicou à AFP o climatologista Francisco Eliseu Aquino, chefe do departamento de Geografia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
O estado do Rio Grande do Sul sofreu vários eventos climáticos extremos no ano passado; o mais grave, a passagem de um ciclone em setembro, deixou mais de 30 mortos.