Lula muda foco de discursos e reduz menções a Bolsonaro e Moro
Por pressão de auxiliares, Lula deixou de investir na polarização, reduzindo ataques ao ex-presidente e ao ex-juiz da Lava-Jato
Depois de um esforço de convencimento por parte de seus auxiliares, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem reduzido o foco na polarização. A diminuição dos ataques diretos ao seu principal adversário, Jair Bolsonaro, foi uma das inflexões que o petista concordou em fazer depois que pesquisas apontaram queda em sua popularidade.
O chefe do Executivo também deixou de mencionar com frequência o senador Sergio Moro (União-PR), outro rival, e de criticar a Operação Lava-Jato. A avaliação no entorno de Lula é que, quando fala dos adversários, a divulgação das iniciativas do governo ficam em segundo plano.
Apesar de publicamente ministros terem tentado minimizar o impacto dos levantamentos, os números, divulgados a partir de março, geraram um sinal de alerta no Palácio Planalto. Pesquisas do Datafolha, da Quaest e do Ipec mostraram queda ou oscilação para baixo na avaliação positiva e aumento do percentual dos que consideram a gestão ruim ou péssima.
A última referência mais dura de Lula a Bolsonaro foi no dia 18 de março, na abertura da primeira reunião ministerial do ano. Na ocasião, o presidente disse que não houve golpe no fim de 2022 “porque o (ex-)presidente é um covardão”, sem citar o nome do adversário.
O ataque dominou a repercussão da reunião ministerial e deixou os temas tratados em segundo plano. O caso foi usado como exemplo por auxiliares nas conversas internas com Lula.
'Não queria falar o nome'
Três dias antes, em entrevista a uma rádio de Salvador, o presidente havia falado o nome do antecessor, apesar de dizer que essa não era a sua intenção inicial.
— Quem é contra o sistema hoje, que critica tudo, é o (presidente Javier) Milei, na Argentina. Até o Banco Central ele quer fechar, quer cortar tudo com serrote. E aqui o Bolsonaro, que eu não queria falar o nome dele, mas é a negação. Até hoje ele não reconhece a derrota dele.
Em café da manhã com jornalistas no último dia 23, Lula se antecipou a uma pergunta sobre o ato convocado por Bolsonaro, que havia acontecido no domingo anterior no Rio, ao dizer que nem sequer havia visto:
— Alguém vai me perguntar, já vou responder logo: “Presidente, o que você achou do ato em Copacabana?” Eu não vi o ato porque eu estava fotografando a casa do Minha Casa Minha Vida do joão-de-barro. Eu descobri, no Palácio da Alvorada, quatro casas de joão-de-barro e descobri mais três em uma árvore e resolvi fazer um filme e publicar na internet. Por isso que eu não vi. Então não me preocupam os atos dos fascistas, o que me importa é o seguinte, eu vou fazer este país dar certo.
Além de defender que o presidente foque na divulgação das iniciativas do governo, a avaliação no entorno de Lula é que referências ao adversário acirram o clima político. Para auxiliares do petista, essa atitude é incoerente com o discurso sobre a necessidade de pacificação do país, feito por Lula no dia em que venceu a eleição presidencial em outubro de 2022.
Por isso, houve empenho de auxiliares para que o petista mudasse o foco. Com o sinal de alerta enviado pelas pesquisas, o presidente cedeu ao apelo.
Marqueteiro convocado
Depois dos levantamentos com números negativos, o presidente convocou o marqueteiro Sidônio Palmeira, que cuidou da campanha presidencial, a ajudar na estratégia de comunicação do governo, e ele passou a circular com mais frequência por Brasília. Sidônio é um dos defensores da tese que Bolsonaro deve ser deixado de lado, assim como o ministro da Comunicação Social (Secom), Paulo Pimenta.
Uma campanha publicitária lançada nesta semana pelo governo visa destacar os resultados positivos da gestão na economia, com o mote de que isso é “bom para todo mundo”. A aposta da Secom é que, com a divulgação de iniciativas que afetam diretamente a vida das pessoas, o governo consiga dialogar com uma parcela da população que votou em Bolsonaro em 2022, mas não é radical.
Um dos principais conselheiros de Lula, o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), comemora a nova postura do presidente em relação ao adversário:
— Se dependesse de mim, não tinha falado nunca. Toda vez que eu tive reunião, sempre disse para ele (Lula) e para todo mundo que ficar falando o nome do adversário não resolve nada. É uma forma de ficar ressuscitando. Precisamos falar do que estamos fazendo.
Além de Bolsonaro, o presidente já havia deixado, mesmo antes da inflexão motivada pela queda nas pesquisas em março, de falar de um outro adversário, o senador e ex-juiz Sergio Moro. Em março do ano passado, em uma entrevista ao site Brasil 247, o presidente contou que, quando estava preso em Curitiba, entre 2018 e 2019, sempre que recebia visitas e essas pessoas perguntavam se ele estava bem, respondia: “Só vou ficar bem quando foder com o Moro”.
A fala foi duramente criticada. Lula, então, deixou de citar o senador paranaense, mas manteve os ataques à Lava-Jato. Em janeiro deste ano, ao participar da cerimônia de retomada das obras da Refinaria Abreu e Lima, no litoral de Pernambuco, o presidente dedicou boa parte de sua fala para atacar a operação e disse que a investigação foi orquestrada por “alguns juízes e procuradores desse país subordinados ao Departamento de Justiça dos Estados Unidos, que não queriam e nunca aceitaram que o Brasil tivesse uma empresa como a Petrobras”. A Lava-Jato apontou que houve corrupção e superfaturamento na construção da refinaria.
Na mesma época em que abandonou os ataques diretos a Bolsonaro, a partir de março, Lula também deixou de criticar a operação que o mandou para a cadeia. Além de alterar o alvo de suas falas, o presidente, após a queda nas pesquisas, passou a dar mais atenção à articulação política e tentou conter confrontos com o Congresso. Nas duas últimas semanas, se reuniu com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
Apesar de saudarem a inflexão de Lula, aliados são cuidadosos ao celebrar o novo momento. Sabem que o presidente está sempre sujeito a descartar os scripts definidos. Em entrevista para a imprensa japonesa nesta semana, o presidente disse que “esse cidadão tentou dar um golpe no país em 8 de janeiro (de 2023)”.