CONGRESSO

Disputa no Congresso coloca em xeque negociação do governo, e Lula tem risco de ter veto derrubado

Gestão havia costurado com líderes que para que R$ 11,3 bilhões fossem destinado às emendas de comissão; Casa havia pleiteado R$16,7 bilhões

Chefes de Câmara, Planalto e Congresso, Lira, Lula e Pacheco - Jefferson Rudy/Agência Senado

Alvo de uma queda de braço entre Executivo e Legislativo, as emendas de comissão passaram a também ser motivo de batalha entre senadores e deputados. Após o governo avançar na costura de um acordo com líderes partidários para devolver cerca de 65% dos R$ 5,6 bilhões cortados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em janeiro, a divisão dessa quantia extra tem gerado divergências no Parlamento, colocando em xeque a negociação e aumentando a possibilidade de derrubada total do veto presidencial na sessão do Congresso marcada para a próxima quinta-feira (9).

Comissão poupada
Entre as comissões que escaparam do corte de Lula está a de Saúde da Câmara, que ficou com a maior quantia, R$ 4,5 bilhões, o que corresponde a 40% do total. Além disso, há outras modalidades de emenda disponíveis aos parlamentares, como as individuais, que somam R$ 25 bilhões — R$ 19,4 bilhões para deputados e R$ 5,6 bilhões a senadores —, e as de bancada, dividida igualitariamente entre as duas Casas.

Segundo o líder do PSD no Senado, Otto Alencar (BA), em reunião na semana passada com o presidente da Casa, Rodrigo Pachceco (PSD-MG), foi feito um acordo para a divisão dos valores.

"A Câmara já teve um valor maior nas (demais) emendas. Então, nesse caso, ficou R$ 1,9 bilhão para compensar o Senado e R$ 1,7 bilhão para a Câmara" disse ele.

O acordo, contudo, é contestado pelos deputados. Correligionário de Otto, o líder do PSD na Câmara, Antonio Brito (BA), disse a interlocutores que tradicionalmente sua Casa legislativa recebe um valor maior e que isso não deveria mudar agora.

Parlamentares da oposição também dizem discordar do acordo citado pelo líder do PSD do Senado e defendem a derrubada integral do veto de Lula, recuperando todos os R$ 5,6 bilhões cortados em janeiro.

"O PL vai trabalhar para derrubar os vetos. Nós vamos trabalhar para derrubar tudo em relação ao Orçamento" avisou o líder do partido na Câmara, Altineu Cortês (RJ). A bancada do PL é a maior da Casa, com 95 deputados.

O mesmo entendimento é apontado pelo deputado Danilo Forte (União-CE), que é presidente da Comissão de Desenvolvimento Econômico da Câmara e relatou a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2024.

O deputado disse que, para viabilizar o acordo proposto pelo governo, os parlamentares teriam que aceitar manter o veto no valor de R$ 5,6 bilhões e aguardar que o Executivo mandasse um projeto de lei ao Congresso Nacional (PLN) para recompor os R$ 3,6 bilhões prometidos.

"Não é uma substituição imediata, é uma coisa que vai ser construída ainda. E está tudo muito atrasado, já estamos em maio. Nesse ano vamos ter uma suspensão das atividades parlamentares praticamente em junho, com o recesso e depois as eleições municipais. O cronograma já está muito atrasado" criticou Forte.

A insatisfação dos deputados não é apenas com a divisão das emendas de comissão, mas com o fato de Pacheco ter adiado sucessivas vezes a sessão do Congresso na qual os parlamentares devem analisar os vetos. A nova data é a próxima quinta-feira e, segundo interlocutores do presidente do Senado, responsável por marcar as reuniões, não há mais como adiar.

Para conter os danos que o governo corre o risco de sofrer na sessão, Lula tem apostado na boa relação com Pacheco. Na noite de quinta-feira, o petista teve uma reunião a sós com ele no Palácio da Alvorada e depois continuou o diálogo com a presença de ministros e mais senadores.

Segundo relatos dos presentes, na reunião, Lula pediu aos parlamentares que relatassem qual o clima da sessão que vai analisar os vetos presidenciais e demonstrou preocupação, principalmente em relação ao orçamento e ao projeto que restringre as chamadas "saidinhas" do presos. Nos dois casos, o cenário traçado foi o de que há grande chance de derrota do governo.

Outros temas
Por conta da ausência da sessão com senadores e deputados — nenhuma foi realizada ainda em 2024 —, outros temas também considerados importantes pelos parlamentares estão indefinidos, como mudanças na lei dos agrotóxicos, vetos nas leis orgânicas dos Policiais Militares e Civis, na lei geral do esporte, na regulamentação das apostas esportivas e na previsão de reserva de, no mínimo, 30% de recursos a programas de moradia, como o Minha Casa Minha Vida, para cidades com até 50 mil.

Por isso, o acordo em relação às emendas de comissão têm sido tratado como prioridade por articuladores políticos do Planalto, como uma espécie de "contenção de danos" para evitar uma derrota maior.

Porém, para pôr em prática os R$ 3,6 bilhões prometidos ao Congresso, o governo ainda tenta aprovar o projeto que recria o seguro DPVAT (Danos Pessoais por Veículos Automotores Terrestres), considerado essencial por conter um dispositivo que abre espaço fiscal de mais de R$ 15 bilhões no Orçamento. O texto foi aprovado pela Câmara no início de abril, mas a votação tem sido adiada pelos senadores. Ainda assim, a expectativa é que o Senado aprove a iniciativa antes da sessão do Congresso de quinta-feira.

Para isso, contam com a ajuda do senador Davi Alcolumbre (União-AP), que tem estreitado a relação com o Planalto de olho na sucessão de Pacheco, no ano que vem. Como presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), ele tem ajudado o governo a articular a aprovação da proposta.

"Nada passa no Senado sem carimbo do Davi Alcolumbre. Nada passa sem a comissão da CCJ aprovar, para o negócio andar. E ele lidera esse debate lá" afirmou o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, em evento no Amapá no qual fez elogios ao senador.

Há ainda a tentativa de acordo em outros vetos, como no da lei geral do esporte. Neste caso, a negociação é para preservar algumas das decisões do presidente.

"Não serão todos (os vetos) derrubados, ainda estamos conversando" disse a senadora Leila Barros (PDT-DF), relatora do projeto. (Colaborou Jenifffer Gularte)