ESCÓCIA

Mulher sofre múltiplos coágulos sanguíneos depois de receber indicação para pílula anticoncepcional

Entidades contraindicam métodos contraceptivos combinados, com a presença de estrogênio, para pacientes que tenham enxaqueca com aura

Mulher sofre múltiplos coágulos sanguíneos depois de receber indicação para pílula anticoncepcional - reprodução/redes sociais

Uma britânica de 32 anos compartilhou quase ter morrido após desenvolver coágulos sanguíneos semanas após ter começado a utilizar uma nova pílula anticoncepcional. O problema seria a formulação do medicamento, já que a pílula combinada é contraindicada em casos de pacientes que tenham enxaqueca com aura.

Os coágulos são espécies de barreiras, conhecidas como trombos, que podem ser formados em vasos e artérias. Eles são perigosos pois impedem a passagem do sangue e, consequentemente, a oxigenação de partes do corpo. Geralmente ocorrem nas pernas, mas podem viajar para outros lugares do corpo: ao chegarem no pulmão, por exemplo, ocorre o tromboembolismo pulmonar.

O caso de Emma Tuthill, que mora na Escócia, teve início quando ela começou a tomar pílula anticoncepcional em março, seis meses depois que havia dado à luz seu último filho, Kaiden. Em abril a frequência cardíaca da britânica disparou de repente, e ela desmaiou em casa.

Na ocasião, os médicos afirmaram que não havia nada de errado, porém dias depois Emma sofreu uma convulsão que a deixou com dificuldades para se locomover. Ela foi levada às pressas para o hospital, onde foi identificado um coágulo sanguíneo na perna e uma tromboembolia nos pulmões.

— William (marido de Emma) chamou a ambulância e os paramédicos disseram que meus níveis de oxigênio estavam perigosamente baixos. Depois da convulsão, quando voltei a mim, senti que não conseguia respirar. Era como se alguém estivesse me sufocando, foi horrível — contou Emma ao DailyMail.

O médico do hospital falou que ela poderia ter morrido e que acreditava que o caso era uma possível consequência da pílula. O medicamento de fato eleva o risco de coágulos, porém de forma rara, o que faz com que, no geral, os benefícios superem, e muito, os riscos, segundo avaliações de autoridades como a Agência Reguladora de Medicamentos e Produtos de Saúde (MHRA).

No entanto, há um aumento diferente, maior, relacionado a um tipo específico da pílula, a combinada, e ao uso por pacientes com diagnóstico de enxaqueca com aura. O medicamento combinado envolve dois hormônios, o estrogênio e a progesterona, enquanto a outra versão do comprimido leva apenas progesterona.

A enxaqueca com aura é um tipo de enxaqueca em que alguns sintomas, principalmente visuais, precedem a dor de cabeça, como luzes piscantes na borda da visão, visão em túnel, incapacidade de enxergar metade do campo de visão, enxergar pontos brilhantes, entre outros.

Alguns estudos apontam que a pílula combinada eleva de forma mais significativa o risco de problemas vasculares em pacientes com enxaqueca com aura. Por isso, diretrizes como da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) e do Serviço Nacional de Saúde do Reino Unido (NHS), contraindicam o uso do medicamento por essas mulheres.

A Febrasgo diz que "há uma associação com aumento de risco de infarto do miocárdico e de acidente vascular cerebral, que se eleva na utilização de hormonais combinados pela presença do estrogênio". O NHS cita números que revelam um risco “inaceitável”.

De acordo com o serviço britânico, geralmente 1 em cada 100 mil mulheres com menos de 35 que não tenham enxaqueca, nem façam o uso do anticoncepcional, vai sofrer um infarto a cada ano. Entre aquelas que não têm enxaqueca, mas usam o medicamento, esse número sobe para 5 casos a cada 100 mil, mas continua baixo.

Porém, entre as pacientes que têm enxaqueca com aura e também utilizam a pílula combinada, são 28 casos de infarto a cada 100 mil mulheres por ano. “Isso significa que é um risco inaceitável tomar qualquer medicamento anticoncepcional combinado se você sofre de enxaqueca com aura”, diz o NHS.

Em comunicado da Fundação Americana de Enxaqueca, Jelena Pavlovic, professora de neurologia da Faculdade de Medicina Albert Einstein e especialista em cefaleia, diz que, em geral, para mulheres com enxaqueca com aura, “a decisão passa a ser equilibrar benefício versus risco, usar a menor dose possível e ter uma conversa realmente profunda com a paciente sobre todos os possíveis resultados adversos”.

É o que afirmam também pesquisadores numa revisão sobre o tema publicada no Cleveland Clinic Journal of Medicine: “Para uma paciente com histórico de enxaqueca com aura, se o objetivo for apenas evitar a gravidez, recomendamos outra opção contraceptiva que não envolva estrogênio”.

No entanto, continuam, "consideraríamos a prescrição de um contraceptivo hormonal combinado em um regime de baixa dosagem se a paciente preferir esse regime por outros benefícios à saúde (por exemplo, controle da acne), se ela não tiver outros fatores de risco para AVC e se ela der seu consentimento informado após uma discussão sobre os riscos e benefícios".

Emma conta não ter sido advertida pelos médicos sobre os riscos ligados à pílula combinada. — Meu próprio clínico geral me telefonou para pedir desculpas porque, afinal, eu não deveria ter voltado a tomar a pílula porque sofro de enxaqueca — contou.

Agora, ela ainda se recupera do processo: — Minha perna ainda está extremamente inchada, não consigo ficar em pé por muito tempo. Fico sem fôlego com muita facilidade. Só consigo subir as escadas. Tenho que voltar ao hospital para ver se há algum dano duradouro em meu coração e pulmões. Fico apavorado com a possibilidade de ter morrido naquele dia, principalmente porque eles ainda estão em meus pulmões.