CINEMA

Mulheres poderosas roubam a cena no início do Festival de Cannes

O cinema francês está em meio a uma onda de alegações de abuso, na esteira do movimento #MeToo que abalou o setor em todo o mundo em 2017

Festival de Cannes - Valery Hache/AFP

A atriz Judith Godrèche, a voz que leva o #MeToo à França, e seu curta-metragem que dá voz às vítimas de abuso sexual, a lendária atriz Meryl Streep e a jovem Anya Taylor-Joy, a guerreira de "Furiosa: Uma Saga Mad Max", foram as estrelas do primeiro dia de competição do Festival de Cinema de Cannes nesta quarta-feira (15).

"Moi aussi" ("Eu também"), o aguardado curta-metragem de Godrèche, que denunciou por estupro dois cineastas que supostamente abusaram dela quando era adolescente, reúne o testemunho de mil vítimas de abuso sexual.

O curta-metragem, exibido fora da competição, é uma forma de dar um rosto às vítimas, disse Godrèche.

"O cinema tem uma função simbólica, quase divina. Ser a atriz principal em um filme que vai para Cannes lhe dá um status. Dizer que as pessoas anônimas que estão no filme serão os atores principais de um filme em Cannes: é esse status que me interessa", disse a atriz de 52 anos à AFP.

O cinema francês está em meio a uma onda de alegações de abuso, na esteira do movimento #MeToo que abalou o setor em todo o mundo em 2017, após o caso do poderoso produtor Harvey Weinstein.

A única mulher"
A Meryl Streep, de 74 anos, foi outra estrela do dia, um dia depois de receber uma Palma de Ouro honorária. Streep revelou uma série de curiosidades das dezenas de filmes que fez, incluindo "Kramer vs. Kramer", "A Escolha de Sofia" e "Entre Dois Amores", em um bate-papo com o público.

A lendária atriz, com 21 indicações e três estatuetas do Oscar, celebrou o papel das mulheres na indústria cinematográfica.

"As maiores estrelas do mundo hoje são mulheres", disse ela a um público admirado, acrescentando que se sentia "intimidada" por atrizes como Reese Witherspoon e Nicole Kidman, que criaram sua própria produtora.

Streep também disse que, se alguns de seus papéis de protagonista são tão memoráveis, é "porque ela era a única mulher no filme".

A atriz francesa Léa Seydoux ("A Bela e a Fera") disse que percebeu que agora "há respeito no set, não há mais aquela familiaridade, mesmo em cenas íntimas".

"Sinto essa mudança global, o respeito está mais presente", acrescentou a atriz, uma das mulheres que denunciaram o comportamento de Weinstein.

Uma das estreias mais aguardadas do evento, "Furiosa: Uma Saga Mad Max", foi exibido fora de competição.

No tapete vermelho, sua protagonista, Anya Taylor-Joy, de 28 anos, trocou o visual de guerra do filme por um vestido de pérolas decotado e um penteado clássico.

Nessa 'prequela' da franquia criada por George Miller, a atriz americana, que cresceu na Argentina e fala espanhol perfeitamente, interpreta uma guerreira que é sequestrada por uma gangue de vilões e precisa superar várias provações para sobreviver.

Protagonistas femininas fortes
A competição da Palma de Ouro foi oficialmente aberta com dois filmes que apresentam protagonistas femininas fortes.

"Diamant brut", a estreia da diretora francesa Agathe Riedinger, trata das aspirações de uma garota do sul da França de participar de um reality show na TV. É o único longa-metragem de estreia na competição.

"É um filme sobre a necessidade de amor", disse a diretora à AFP. "A personagem de Liane combina todos os arquétipos da jovem mulher que é tachada de desmiolada.

O filme "Pigen med nålen", de Magnus Von Horn, conta a história, baseada em fatos reais, de uma mulher que assassinou bebês em Copenhague após a Primeira Guerra Mundial.

No total, 22 filmes estão concorrendo à Palma de Ouro, quatro deles dirigidos por mulheres, três a menos do que na edição anterior.

Apesar dessa desproporção, a atriz e diretora norte-americana Greta Gerwig, que está presidindo o júri deste ano, saudou o aumento geral da presença de mulheres no setor.

"Quinze anos atrás, eu não poderia imaginar que haveria tantas mulheres representadas no mundo do cinema", disse a cineasta de 40 anos, que no ano passado se tornou a primeira diretora de um filme, "Barbie", a ultrapassar US$ 1 bilhão (5 bilhões de reais) em bilheteria.