Tecnologia

Remuneração de conteúdo é um dos principais pontos da regulação de IA, diz relator

Preocupação é evitar desinformação e violação de direitos autorais

Senador Eduardo Gomes (PL-TO), relator do projeto que regulamenta o uso da inteligência artificial - Geraldo Magela/Agência Senado

O senador Eduardo Gomes (PL-TO), relator do projeto que regulamenta a aplicação da Inteligência Artificial (IA) no Brasil, afirma ter certeza de que o Congresso brasileiro irá aprovar o conjunto de regras para essa tecnologia. Gomes disse ainda que a remuneração pelo uso de obras protegidas por direitos autorais na construção de ferramentas de IA é um dos principais pontos do texto, que ele pretende votar até junho.

— Essa discussão tem consequências econômicas, sociais e humanas. É um tema difícil, mas a história vive de temas difíceis. Eu tenho certeza de que nós vamos regular a Inteligência Artificial. É um tema difícil, mas que precisa ser enfrentado — disse o Senador.
 

O projeto é de autoria do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). A proposta cria o Sistema Nacional de Regulação e Governança de Inteligência Artificial, uma estrutura para implementar e fiscalizar o cumprimento da lei.

Pelo texto, essa autoridade, chamada de SIA, estabelecerá um ambiente regulatório para tratar da remuneração e transparência em relação a conteúdo protegido por direitos autorais utilizados no desenvolvimento de sistemas de Inteligências Artificiais disponibilizados com finalidade comercial.

Na lista de produções que trata a lei estão, por exemplo, publicações jornalísticas e demais conteúdos protegidos por direitos autorais.

— Eu considero esse um dos principais pontos do projeto porque tem que defender propriedade intelectual, o direito autoral. Por mais tecnologia que exista, o conteúdo é produzido a partir da capacidade de criação humana. Não faz o menor sentido que não tenha isso. Essa é uma discussão mundial — disse o senador.

Gomes afirma que o risco de não regulamentar a Inteligência Artificial é maior do que simplesmente não tratar do assunto.

— Deixar de regular, não ter nenhuma regulação, é ter mais riscos. Com a inteligência artificial, o maior risco é não correr riscos. Acaba comprando o risco dos outros — argumentou.

O projeto estabelece que a remuneração a ser paga aos titulares de direitos autorais irá considerar o grau de utilização do conteúdo. Diz também que o titular dos direitos poderá autorizar a utilização das obras de forma gratuita ou mediante pagamento.

Nesta semana, o Google anunciou que vai levar a Inteligência Artificial generativa para a sua ferramenta de buscas, responsável por 90% das pesquisas feitas em internet no mundo.

Assim, ao pesquisar um assunto, o usuário de internet terá respostas elaboradas por IA, muitas vezes sem que os links originais dos produtores desses conteúdos estejam claramente visíveis no resultado.

O anúncio do Google preocupou o setor de mídia no Brasil. O presidente-executivo da Associação Nacional de Jornais (ANJ), Marcelo Rech, disse que “as mais graves preocupações da indústria jornalística estão se materializando" e que vê a nova ferramenta da companhia como uma "ameaça à sustentabilidade do jornalismo".

— O Google vai apresentar resumos para as respostas dos usuários. Ainda que pretenda oferecer secundariamente links para quem deseja saber mais, é uma clara desvalorização das fontes originais que produzem aquele conteúdo — disse Rech.

Análise da consultoria Gartner, especializada em tecnologia, prevê que o volume de tráfego para publicações jornalísticas vindo dos mecanismos de busca vai cair 25% até 2026 com a proliferação dos sistemas de IA generativa. Em entrevista ao Washington Post, Ross Hudgens, CEO da Siege Media, consultoria especializada em SEO (ou otimização dos mecanismos de busca), estimou um impacto de 10% a 20%, podendo ser ainda maior, a depender do veículo.

Outra preocupação de especialistas é com a possibilidade de isso ampliar a desinformação.

O relator do projeto que tramita no Senado afirmou que essa a massificação do uso da IA generativa, que ganhará impulso com sua adoção pelo Google, será levada em consideração na elaboração do relatório definitivo.

Relatório apresentado

O senador apresentou uma versão preliminar do seu parecer no mês passado e abriu novo prazo para receber sugestões. Ele afirma que entre as recomendações recebidas, até agora, há o debate sobre o uso da IA generativa em sites de buscas, mas evitou entrar em detalhes. A IA generativa é usada para criar novos conteúdos, como texto, imagens, música, áudio e vídeos, a partir de fragmentos desses conteúdos disponíveis na internet.

O relator irá receber sugestões até o dia 5 de junho e quer apresentar novo relatório no dia 10.

A proposta diz também que não constitui ofensa aos direitos autorais a utilização de conteúdos protegidos no desenvolvimento de sistemas de inteligências artificial por organizações e instituições de pesquisa, jornalismo, museus, arquivos, bibliotecas a educacionais, desde que não tenha fins comerciais.

O projeto foi elaborado a partir de sugestões de uma comissão composta por estudiosos do Direito. Inicialmente, a comissão acabaria no final de abril, mas o funcionamento dela foi prorrogado para dia 23 de maio. O texto define diretrizes para o desenvolvimento, implementação e uso de sistemas de inteligência artificial no Brasil.

A aprovação do texto é uma das prioridades de Pacheco.

— São 45 artigos basicamente, justamente para que haja um limite em relação à Inteligência Artificial, não só para as eleições que se avizinham, municipais e as outras eleições, mas para a nossa convivência, a convivência entre homens e mulheres, entre instituições, de haver uma disciplina em relação a esse tema, também então uma lei que deve ser entregue em breve pelo Congresso Nacional à sociedade brasileira — disse Pacheco no início do ano.

Outras propostas

Há ainda outros projetos em tramitação no Congresso Nacional que preveem a remuneração de conteúdos jornalísticos e artísticos veiculados em plataformas digitais. Um deles está na Câmara sob a relatoria do deputado Elmar Nascimento (União-BA).

O texto prevê que as plataformas com mais de 2 milhões de usuários no Brasil façam pagamentos às empresas responsáveis pelo conteúdo pela veiculação de textos, vídeos, áudios ou imagens. O texto pontua que “em nenhuma hipótese a remuneração poderá onerar o usuário que compartilhou a informação”.

Atualmente, a legislação protege obras intelectuais, musicais e audiovisuais veiculadas em ambiente digital, prevendo a remuneração dos seus titulares. Porém, a legislação de Direitos Autorais é anterior ao surgimento de novos tipos de plataforma. Nascimento argumenta que isso abre espaço para plataformas regulamentarem “unilateralmente” a lei em sua aplicação no ambiente digital, o que gera remunerações “baixas ou nulas”.