Deputado é alvo de disputa judicial envolvendo compra de fazenda registrada em nome de pessoa morta
Investigação da Polícia Civil apontou fraude em escritura pública do imóvel vendido ao parlamentar. A defesa nega as fraudes
O deputado federal Éder Mauro (PL-PA) é alvo de um processo de reintegração de posse de uma fazenda no interior do Pará que, segundo a Polícia Civil, foi registrada em nome de uma pessoa que já estava morta antes de a propriedade ser transferida ao parlamentar, após uma série de transações. Uma investigação concluiu que há indícios de que o imóvel rural, batizado de "Bênção Divinal", teve seus registros forjados para que pudesse ser negociada. A defesa do parlamentar, que é pré-candidato à prefeitura de Belém (PA), nega participação na suposta fraude. Ele não foi alvo do inquérito.
A disputa pela fazenda "Bênção Divinal", o equivalente a 510 campos de futebol, começou antes mesmo de ser comprada pelo deputado. Em 2017, o imóvel pertencia a um dono de uma serraria no Pará, que negociou a venda para o empresário Cleber Eduardo de Lima Ferreira por R$ 500 mil. A transação, segundo investigação da Polícia Civil, nunca foi oficializada, porque houve divergências quanto ao pagamento total. Com isso, os documentos nunca foram entregues.
Sem receber os registros da propriedade, o empresário, segundo a investigação, criou um suposto documento falso do imóvel em nome de uma idosa — que morreu antes do negócio e que não tinha relação com a propriedade rural.
— É uma fraude rebuscada. A idosa (morta em 2003) nunca esteve no cartório. O filho e o neto dela alegaram que ela nunca foi proprietária de imóvel rural algum — afirmou o delegado da Polícia Civil Alexandre do Nascimento, responsável pelas investigações na época.
Em 2020, a fazenda Bênção Divinal foi novamente vendida, dessa vez para o deputado Éder Mauro (PL-PA), que pagou R$ 330 mil pelo imóvel — uma depreciação de 34% da primeira venda ocorrida em 2017. Em 2022, o parlamentar declarou a propriedade ao Tribunal Superior Eleitoral, quando concorreu a uma vaga na Câmara.
No mesmo ano, o primeiro dono do imóvel decidiu entrar com uma ação de reintegração de posse contra Éder Mauro para reaver a fazenda. Antes disso, foi feita uma denúncia anônima para a Polícia Civil, que passou a investigar o caso em 2020.
O advogado Jânio Nascimento, que representa Éder Mauro, afirmou que o dono da serraria é um "grileiro" e nunca teve domínio da fazenda Bênção Divinal.
— Se o deputado comprou uma propriedade toda documentada, legalizada, e lá na frente vier a constar que havia um documento falso, ele seria, então, vítima de estelionato. Porque ele mesmo não falsificou documento algum. Não participou da lavratura de documento algum — disse o advogado.
Procurado, o empresário Cleber Ferreira, que participou da primeira transação do imóvel, nega qualquer fraude e diz que contratou uma empresa para fazer o trabalho de organização da documentação da escritura.
— O cartório tinha fé pública. Na minha cabeça, estou tranquilo. Não fiz nada de errado — disse ele, que chegou a ser preso provisoriamente no decorrer das investigações da Polícia Civil.
Os registros do imóvel mostram que, após adquirir a fazenda, o empresário Cleber Ferreira transferiu a propriedade para sua companheira, que, na sequência, vendeu a uma contadora, pelo valor de R$ 290 mil. Um mês depois desse negócio, a fazenda foi comprada pelo deputado, por R$ 330 mil.
Em depoimento em 2021, o primeiro dono da fazenda Bênção Divinal afirmou à polícia que chegou a procurar Éder Mauro para alertá-lo sobre as irregularidades envolvendo a fazenda. O encontro, segundo ele, ocorreu em janeiro de 2020, quatro meses antes de o deputado registrar a compra do imóvel.
No processo de reintegração de posse, o deputado confirma que foi procurado, mas diz que o homem apenas afirmou que tinha uma dívida pendente do imóvel. O advogado de Éder Mauro, contudo, afirma que o parlamentar não se lembra de quando ocorreu o encontro, se antes ou depois de ele adquirir a fazenda Bênção Divinal.
A conclusão do inquérito da Polícia Civil, que constatou indícios de fraude, embasou o pedido à Justiça de reintegração de posse do primeiro dono da fazenda contra Éder Mauro. A investigação resultou em uma ação penal que tornou réus três pessoas envolvidas na transação imobiliária. O deputado não foi alvo da acusação. O caso ainda não foi julgado e está sob sigilo.