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Candidatura de José Dirceu à Câmara contraria ala do PT

Para recuperar a elegibilidade, ex-ministro precisa derrubar outra condenação da Lava-Jato, que tem um recurso para ser analisado no Superior Tribunal de Justiça

Ex-ministro José Dirceu - Arthur Mota/Folha de Pernambuco

O plano do ex-ministro José Dirceu de concorrer a uma vaga à Câmara dos Deputados por São Paulo em 2026 preocupa setores do PT. Parte da legenda entende que sua candidatura possa dar fôlego ao discurso bolsonarista e reabilite o debate dos escândalos de corrupção dos governos petistas.

Outra ala de petistas, contudo, enxerga a possibilidade de Dirceu retornar ao Legislativo como reparação histórica. O retorno após 20 da cassação de seu mandato durante o escândalo do mensalão.

Ao Globo, Dirceu afirmou que a decisão sobre a candidatura será tomada no segundo semestre de 2025, após uma conversa com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e com a direção do PT. O petista afirma que quer ouvir onde será mais útil ao PT. O ex-ministro, no entanto, considera que seria uma questão de justiça voltar à Câmara.

— A decisão (sobre candidatura) será tomada no segundo semestre de 2025. Porque eleição é só 2026. Não tenho pressa. Quero ajudar nas eleições municipais. Ano que vem quero ajudar na renovação do PT. E no segundo semestre de 2025 tomarei decisão sobre concorrer. Vou consultar presidente Lula e direção do PT, não posso tirar da minha cabeça que sou candidato. Tenho dito que até por justiça eu mereço voltar para Câmara dos Deputados, mas quem vai decidir isso é o povo de São Paulo — disse.

A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) considerou extinta uma pena imposta ao ex-ministro José Dirceu por corrupção passiva na Operação Lava-Jato, devido à prescrição. Dirceu já tinha sido absolvido por lavagem de dinheiro no STJ neste processo. Para recuperar a elegibilidade, no entanto, ainda seria preciso derrubar outra condenação da Lava-Jato, que tem um recurso para ser analisado no Superior Tribunal de Justiça (STJ). A defesa aposta que o entendimento do Judiciário será o mesmo ao do STF.

—Recebo com tranquilidade a decisão porque era de Justiça. Já tinha sido absolvido por lavagem de dinheiro no STJ. Era um processo kafkaniano. A empresa foi absolvida, o consultor foi absolvido e eu estava condenado. Era condenação para me manter preso. Era um processo bem típico da Lava Jato. Se empresa foi absolvida por lavagem de dinheiro, se o consultor foi absolvido por lavagem de dinheiro. O fim natural desse processo era anulação. Tenho outro processo no STJ, que por extensão, deve ter o mesmo fim.

Petistas que veem com reserva a candidatura admitem que Dirceu não ampliaria o número de votos da bancada em São Paulo e, provavelmente, ocuparia uma das nove vagas da bancada petista do estado, colocando em risco a renovação de mandatos dos atuais. O argumento usado é de que Dirceu, embora seja um dos quadros partidários mais relevantes da sigla, não expande seu eleitorado para campos políticos para fora do PT, o que acaba atraindo um voto de opinião da esquerda que já está dentro da bancada. Também temem pelo retorno ao debate de temas como mensalão e a Lava-Jato, que desgastaram a imagem do partido nas últimas duas décadas. Dirceu foi preso no âmbito das duas operações: em 2013, pelo mensalão, e em 2015, 2018 e 2019 por processos da Lava-Jato. Em todas as vezes foi solto por decisões do STF.

Há um consenso, no entanto, de que, pelo peso político do ex-ministro, ninguém verbalizará a Dirceu contrariedade a sua candidatura, nem mesmo Lula. Além de coordenador da campanha de Lula em 2002, Dirceu foi homem forte do presidente no seu primeiro mandato, como chefe da Casa Civil entre 2003 e 2005.

Mesmo ainda sem habilitação a disputar eleição, Dirceu nunca deixou de se articular politicamente e é figura procurada por políticos de várias legendas em Brasília. Seu aniversário, em março, teve a presença do vice-presidente Geraldo Alckmin, políticos do centrão e quatro pré-candidatos à presidência da Câmara. No governo Lula, tem atuado nos bastidores como um conselheiro informal de ministros petistas e da base aliada. Não foi convidado para a posse de Lula em 2023, mas a acompanhou no meio da militância.

Na articulação de eleições municipais, Dirceu se empenhará diretamente na campanha de Guilherme Boulos (PSOL) em São Paulo, mas também tem olhado para o resto do país. Recentemente esteve em Teresina (PI), Fortaleza (CE) para conversas políticas e pretende ir a Salvador (BA), Recife (PE) e São Luís (MA). Assim como em 2022, a atuação do petista será discreta e de bastidores. Longe dos holofotes, Dirceu quer amenizar resistências, tanto no campo político quanto entre empresários com quem transita.

O ex-ministro tem dito que PT precisa ampliar número de vereadores pelo país e defende que a legenda lance candidatos a prefeito em pequenas e médias cidades onde há chance de vitória ou apoie aliados competitivos. O PT atualmente não comanda nenhuma capital.