Religião

Na busca pelo apoio evangélico, governadores acenam com isenções em ICMS, gás e luz das igrejas

A pauta da imunidade tributária é uma das principais da bancada evangélica neste ano

Igreja evangélica - Luis Quintero / Pexels

Ao isentar entidades religiosas de pagarem o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) na importação de produtos relacionados ao exercício da fé, na semana passada, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), se juntou aos do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL); do Pará, Helder Barbalho (MDB); e do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), na concessão de benefícios ao segmento nos últimos 12 meses.

A imunidade tributária para os templos religiosos está prevista na Constituição Federal, mas o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) é de que a medida se aplica somente aos tributos diretos — tais como IPTU do imóvel da igreja ou Imposto de Renda.

Pastores têm se articulado junto aos parlamentares que compõem a bancada evangélica para que a imunidade também recaia sobre os tributos indiretos, a exemplo do ICMS isentado por Tarcísio.

No Rio e no Pará, Cláudio Castro e Helder Barbalho também promoveram isenções neste tributo, mas nas contas de gás e luz dos templos.

— Talvez aqueles que não professem nenhuma fé ou tenham uma visão econômica achem e tenham a triste visão de que é uma lei ruim, que tira recurso. E, para esses, digo que talvez falte entrar num trabalho social de uma igreja, de qualquer templo religioso, ou de um terreiro, e entender o quanto essas pessoas se devotam para fazer que o outro tenha uma vida melhor — disse Castro durante o anúncio.

Terrenos regularizados

Em março deste ano, Ibaneis Rocha assinou um decreto que regularizou os terrenos de 400 igrejas, templos e entidades de assistência social no DF. A iniciativa faz parte do programa “Igreja Legal”, implementado em 2019, que pretende regularizar, sem custo e com o perdão de tributos retroativos, templos de pequeno porte.

Na avaliação de especialistas, o intuito desses benefícios é expandir a influência política entre o público cristão — incluindo também a Igreja Católica.

— São velhas práticas de clientelismo, fazendo as igrejas como receptoras de benesses estatais para agradar aos líderes que têm poder político e congregam em torno de si uma multidão de pessoas — afirma o cientista político Vinicius do Valle, do Observatório dos Evangélicos.

A opinião é compartilhada pelo professor Paulo Baía, da UFRJ, que diz haver uma competição entre políticos por esse eleitorado.

Apesar da opinião dos especialistas, o pastor Silas Malafaia, líder da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, nega que as benesses sejam acenos:

— A minha opinião é de que não fazem mais que a obrigação. As entidades religiosas, não só a Igreja Evangélica, têm imunidade tributária para qualquer bem da instituição.

Desde a Constituição, diversas leis foram sancionadas para especificar o que em tese já teria sido previsto em 1988. Exemplo disso ocorreu em 1997, quando os veículos registrados em nome das igrejas foram reafirmados na isenção do IPVA. Posteriormente, novos impostos foram criados e, por consequência, incluídos na lista de isenções.

Em 2000, o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), incidente em doação ou transmissão de bens, já foi sancionado sem contar com a arrecadação dos templos. Isto significa que os dízimos, contribuições dos fiéis à igreja, não são descontados pelo Estado.

Entre 2001 e 2019, não houve mudanças na tributação para as igrejas, até Jair Bolsonaro (PL), que contava com amplo apoio entre evangélicos, assumir o mandato de presidente e aprovar uma medida por ano. Ainda em 2019, o ex-presidente liberou as igrejas de pagarem o principal imposto estadual, o ICMS, que incide em serviços e produtos, tais como a conta de luz, por até 15 anos.

Dois anos depois, o ex-presidente perdoou a dívida de R$ 1,4 bilhão referente ao pagamento da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), imposto da União que incide sobre o lucro líquido dos templos. Faltando duas semanas para a campanha eleitoral de 2022, Bolsonaro sancionou lei sobre a contribuição previdenciária que beneficia pastores.

Em janeiro deste ano, contudo, a Receita Federal cancelou este benefício fiscal, gerando mal-estar entre Lula e evangélicos. Passados cinco meses, o Ministério da Fazenda mantém a anulação, mas tem se reunido periodicamente com o segmento para tentar um acordo sobre o tema.

Imunidade total

A pauta da imunidade tributária é uma das principais da bancada evangélica neste ano. Atualmente, na Câmara, tramita uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) de autoria do deputado federal Marcelo Crivella (Republicanos), que busca expandir a imunidade para todos os tributos.

— A nossa intenção é que as igrejas possam usar as doações para comprar mantimentos, equipamentos, sem ter que pagar imposto. É a luz para fazer o culto, o ar-condicionado do casamento, a reforma dos templos... — afirmou Crivella.

Em 2023, na tramitação da Reforma Tributária, o governo fez seu maior aceno ao grupo ao incluir um trecho na proposta que expande a isenção fiscal para todas as organizações filantrópicas e associações ligadas às igrejas. O acordo foi costurado pelo deputado federal Cezinha de Madureira (PSD-SP), junto aos ministros Fernando Haddad (Fazenda) e Alexandre Padilha (Relações Institucionais).