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Stalker de Débora Falabella: histórias de perseguição também ameaçam homens e mulheres

Primeiro encontro da stalker com Débora aconteceu no Rio de Janeiro, em 2013, quando elas entraram no mesmo elevador

Débora Falabella - João Miguel Jr./Divulgação

A atriz Débora Falabella sofre há 10 anos com uma história estarrecedora de stalking, termo em inglês para a perseguição reiterada a alguém. Uma mulher, moradora de Recife, Pernambuco, ultrapassou todos os limites de uma fã enviando mensagens invasivas, presentes e já chegou a ir à porta do condomínio da atriz, em São Paulo. Tudo começou em 2013, no Rio de Janeiro, quando a mulher entrou no mesmo elevador que a artista e pediu uma foto.

Depois disso, a "stalker" enviou diversos presentes ao camarim da atriz, como uma toalha branca, objetos e uma carta com teor íntimo e invasivo. Em 2015, ela tentou acessar um local restrito do Sesc Copacabana, no Rio de Janeiro, onde Débora fazia uma peça.

A atriz registrou o caso na delegacia. Já em 2018, a mulher apareceu na primeira fileira de uma peça que Débora estava apresentando na cidade de São Paulo e saiu logo após a atriz entrar em cena. Enquanto isso, em 2022, ela criou um grupo com Débora e irmã da atriz para enviar diversas mensagens. Em um dos textos, ela diz ter uma ligação telepática com Débora e que mantém relações sexuais nesse formato.

No mesmo ano, a mulher apareceu na porta do condomínio da artista e tentou entrar, mas foi impedida. Em dezembro, ela descobriu que Débora estava hospedada em uma pousada na Bahia e foi até o local, para tentar encontrá-la. Ao voltar a São Paulo, a atriz recebeu o livro Romeu e Julieta, enviado pela stalker, com a mensagem: “Para o meu Romeu, com muito amor”.

Só depois disso, a Justiça de São Paulo concedeu uma medida protetiva à atriz, e estabeleceu a distância mínima de 500 metros, sob pena de prisão. No ano passado, o Ministério Público ofereceu denúncia, que foi recebida pela Justiça, o que tornou a suspeita ré pela prática de perseguição contra Débora.

Porém, em setembro do ano passado, a mulher descumpriu as medidas protetivas ao entrar em contato com Débora tanto pelo Instagram como pelo WhatsApp. Por isso, um mandado de prisão preventiva foi expedido em outubro. Em março deste ano, a mulher foi presa pela Polícia Civil de Pernambuco por descumprir a medida protetiva.

Segundo o G1, a prisão ocorreu numa clínica psiquiátrica em Camaragibe, no Grande Recife, e a suspeita foi levada à Colônia Penal Feminina do Recife, no bairro da Iputinga, na Zona Oeste da capital.

A mulher solicitou a revogação da prisão e alegou transtornos mentais (esquizofrenia e bipolaridade), porém a Justiça negou o pedido e reiterou a necessidade de realização de um exame psiquiátrico. No final do mês, a mulher foi submetida a uma perícia psiquiátrica, sendo diagnosticada com esquizofrenia. Assim como Débora, homens e mulheres no Rio vivem casos assustadores de perseguição.

Quando Lúcia (nome fictício), de 28 anos, decidiu pôr um ponto final no relacionamento com seu namorado, em 2021, o que ela esperava era encerrar um ciclo. No início, o sonho era construir uma família; logo, o namoro virou um pesadelo de xingamentos e agressões. Cansada, a jovem, que tem uma filha de 5 anos com o homem, decidiu voltar para a casa dos pais.

A mudança, porém, desencadeou novo tipo de violência: o stalking— uma atitude que virou crime no mesmo ano em que Lúcia se separou e que, apenas em 2024, teve 876 condenados no Rio, ou o equivalente a uma sentença a cada quatro horas, em média.

Dados do Tribunal de Justiça do Rio (TJRJ) aos quais O GLOBO teve acesso mostram que as punições pelo delito de perseguição, estabelecido no artigo 147-A do Código Penal, subiram 79% entre 2022 e o ano passado, passando de 952 condenações para 1.700. Este ano, até maio, as 876 sentenças já representam mais da metade do total de 2023.

Os registros na polícia seguem a mesma tendência das ações judiciais. Números do Instituto de Segurança Pública (ISP) sobre ocorrências de stalking, obtidos pelo GLOBO via Lei de Acesso à Informação, revelam que 4.068 casos foram registrados no ano passado nas delegacias do estado: um aumento de 43% em relação a 2022. Nove em cada dez vítimas são do sexo feminino, mas há 300 homens que foram alvo de perseguição no ano passado. Quase 39% dos casos são na cidade do Rio, e os bairros com mais registros são Campo Grande, Centro, Recreio dos Bandeirantes e Jacarepaguá.

Ameaças e medo
Durante um ano, Lúcia conviveu com o medo das perseguições incessantes, em casa, no trabalho e na rua. Independentemente do lugar ou da hora, um carro preto sempre estava à espreita, acompanhando seus passos.

"A vida do meu ex-namorado paralisou. Ele passou a viver em função de me perseguir o tempo todo. Chegou a ir ao meu trabalho. Eu ia fazer uma visita na casa dos meus amigos e eles me mostravam que o carro dele estava lá. O meu ex sempre sabia onde eu estava, não tinha como fugir" diz ela.

Além da perseguição, havia ameaças constantes. Até que, em 3 de julho de 2021, por volta das 7h, o stalker sequestrou a jovem na porta de casa, em Piedade, na Zona Norte do Rio. Depois de dirigir por 14 quilômetros, até o acesso à Cidade de Deus, o homem golpeou a mulher com 12 facadas. Mesmo ferida, ela conseguiu pular do carro em movimento. Em julho do ano passado, o ex-namorado de Lúcia foi condenado a 16 anos de prisão, por tentativa de feminicídio agravada pelo crime de perseguição.

Assim como Lúcia, Amanda (nome fictício), de 26 anos, viu a sua vida se transformar ao postar um vídeo dançando nas redes sociais, em 2022. O conteúdo alcançou mais de 50 mil visualizações, centenas de elogios chegavam, mas um em especial chamou sua atenção:

"Apareceu um garoto me elogiando, só que ele dizia coisas sem nexo. Eu achei estranho, mas agradeci da mesma forma. Depois, ele enviou mais de 30 mensagens, falando que se eu não o respondesse, ele se mataria. Eu fiquei assustada e bloqueei.

Mesmo preocupada com a situação, Amanda continuou postando conteúdo na internet. Algumas semanas depois, enquanto esperava o ônibus num ponto de Vila Isabel, na Zona Norte do Rio, recebeu, via aplicativo de mensagem, uma foto sua no local."

"A mensagem dizia: “Não adianta se esconder de mim, eu sei onde você está”. Fiquei muito abalada, a minha vontade de fazer vídeos acabou. Tranquei o meu perfil nas redes sociais e hoje só mexo mais no meu Instagram profissional" diz.

Para a delegada Tatiana Ribeiro, titular do Departamento-Geral de Polícia de Atendimento à Mulher, esses números representam um maior conhecimento da população sobre a existência do crime.

"O termo stalkear ficou conhecido de maneira saudável, quando aquele pretendente vai lá e olha as redes sociais da pessoa, curte as fotos, manda uma mensagem. Acontece que isso pode se tornar um crime se for feito de maneira repetitiva e de forma incisiva, de um jeito que a vítima não tem mais direito de ir e vir. Ninguém está imune a esse crime, eu mesma fui vítima de stalking nas minhas redes sociais" diz.

De acordo com a delegada, é importante que a vítima procure uma delegacia:

"Como é um crime de ação penal, é necessário que a vítima esteja ali para poder representar contra a pessoa."

"I love you, xuxu"
A advogada Larissa Martins, especialista em Direito Digital, Tecnologia, Mídia e Telecomunicações, ressalta a importância de a vítima guardar provas e até mesmo registrar uma ata notarial:

"A vítima pode reunir prints e gravações de tela. No entanto, podem alegar que um print foi editado, então a vítima pode fazer uma ata notarial em cartório. Ali ficará atestado que o conteúdo é verdadeiro. Com isso, o autor pode pegar uma condenação de seis meses a dois anos, podendo chegar a três anos com agravantes."

Já no caso de Antônio (nome fictício), de 46 anos, dono de uma loja na Zona Sul do Rio, a stalker é uma ex-colega de escola. Desde fevereiro deste ano, a mulher tem realizado diversas ligações para o empresário, que é casado, e para seus parentes, enviando também nudes e mensagens de conotação sexual.

“Amor, preciso quitar meu apartamento para ficar livre das prestações mensais na CEF, para sermos donos de tudo! Lindo igual ao meu irmão. Vamos ser amigos de vida! I love you, xuxu”, escreveu a mulher num e-mail.

"Ela manda imagens dela nua e meus funcionários ficam recebendo. Isso me gera muita ansiedade, um dia até desmaiei. Ela liga até para os meus pais" reclama Antônio.

Enquanto isso, Rogério (nome fictício), de 48 anos, diz que é perseguido pela síndica e pelos dois conselheiros do prédio onde mora, na Zona Sul. Ele conta que a mulher joga objetos na sua porta e envia drones para monitorar sua cobertura:

— Minha casa virou um reality show. Fomos obrigados a nos adaptar à rotina de medo e constrangimento. Fico apreensivo com a saúde física e mental dos meus filhos. Ela tem imagens deles e nem sei o que está fazendo com elas.