CAIXA

Petrobras: entenda o acordo bilionário que a estatal pode fechar no Carf

Estatal pode se beneficiar de desconto para quitar a dívida, mas dividendos extraordinários podem sofrer impacto

Sede da Petrobras - Fernando Frazão/Agência Brasil

O conselho de administração da Petrobras discute nesta segunda-feira o pagamento em caráter extraordinário de cerca de R$ 20 bilhões à Receita Federal, com o objetivo de encerrar litígios da estatal com o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), conforme adiantou o colunista do Globo, Lauro Jardim.

A decisão ocorre justamente em um momento que o governo se esforça para arrumar renda extra para reduzir o déficit as contas públicas. Procurada, a estatal não confirmou a reunião.

Analistas do mercado financeiro estimam que o valor devido pode ser menor. E ponderam que, se por um lado a Petrobras pode se beneficiar de descontos oferecidos pelo Carf para quitar a dívida, por outro pode ter que reduzir o pagamento de dividendos extraordinários no curto prazo.

Impostos
Assim como outras empresas do setor, a Petrobras foi autuada anos atrás por um suposto artifício nos contratos de exploração de petróleo usado para pagar menos imposto.

O preço do contrato era dividido em duas partes. A primeira era relativa ao chamado afretamento, ou seja, o aluguel da embarcação — isento de pagamento de imposto de renda na fonte. Já a segunda era relativa à prestação de serviço, a própria exploração do óleo, que sofria cobrança de PIS/Cofins e Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE).

Para pagar menos tributo, Roberto Duque Estrada, sócio do Brigagão, Duque Estrada Advogados, explica que a maioria dos contratos da Petrobras informava que 90% do valor era equivalente ao aluguel da embarcação, enquanto só 10% eram relativos a serviços.

Cobrança retroativa
A Receita Federal, porém, notou a artimanha e, por isso, cobrou imposto sobre o valor total dos contratos anteriores, além de ter aplicado multa. O entendimento foi que a Petrobras estava contratando uma prestação de serviço instalado numa embarcação. Dessa forma, a plataforma seria apenas um acessório do serviço.

Estrada questiona a cobrança retroativa de imposto já que uma medida provisória do Governo Temer estabeleceu o percentual máximo dos contratos que poderia ser justificado como afretamento, reduzindo a insegurança jurídica e permitindo que as companhias continuassem a adotar o procedimento de contratos bipartidos.

— O que poderia ser discutido era a ausência de uma regra que limitasse o valor de afretamento. Mesmo assim, o Fisco deveria ter partido para autuação legislativa, ao invés de cobrar impostos direto — opina.

Já Djalma Rodrigues, sócio da área tributária do escritório Miguel Neto Advogados, avalia que a cobrança pode ser justificada sim pela desproporcionalidade entre serviço e aluguel de embarcações nos contratos. Para ele, o pagamento pode ser uma boa saída para a Petrobras, devido às condições oferecidas pelo Carf.

Condição especial para pagamento
A empresa devedora pode se beneficiar de um desconto de 60% do total, além de usar até 10% do prejuízo fiscal para abater da dívida depois dos descontos. O saldo pode ser pago com entrada de 30% e parcelamento do restante em até seis vezes. Há ainda a alternativa de obter desconto menor e quitar com entrada de 10% e 24 parcelas.

Cálculos feitos pelo advogado considerando as condições de pagamento e os depósitos judiciais estimam que o valor da dívida final seria de R$ 15,2 bilhões.

— É importante lembrar que uma das condições para fechar esse acordo seria concordância em obedecer às regras da Receita Federal, desistindo de discutir no futuro qualquer outra autuação relacionada a isso — alerta Rodrigues.

Valor a ser pago
Ilan Arbetman, analista da Ativa Investimentos, também avalia que o desembolso efetivo pela Petrobras seja menor que R$ 20 bilhões. Pelos seus cálculos, o montante ficaria em torno de R$ 14 bi. Por isso, avalia o acordo como um “bom negócio”:

— É um passivo que deveria ser pago. Não considero negativo. Tem que perceber o que é melhor para a saúde financeira da companhia a longo prazo, apesar dos impactos a curto prazo, como a redução de dividendos.

A chance de impactos nos dividendos extraordinários no segundo trimestre desagrada os investidores, avalia Flávio Conde, da Levante Investimentos. Para ele, apesar de o pagamento da dívida ser algo esperado, o apressamento gera insatisfações.

— Tem várias empresas grandes com pendências no CARF. A Petrobras, por ter o governo como acionista principal, tende a cumprir a ordem sem muito questionar, enquanto as empresas privadas brigam mais — critica.

A má impressão pelo efeito nos dividendos pode se dissipar, na opinião de Paulo Luives, especialista da Valor Investimentos, com a eliminação das disputas com o Carf, que vêm se arrastando há bastante tempo:

— Se tudo for resolvido, a empresa se livra de obrigações futuras, o que gera instabilidade nos preços dos papéis pela dúvida sobre quanto a empresa teria que pagar.

Frederico Nobre, líder da área de análise de ações na Warren, também acha que o acordo pode “sair barato” para a Petrobras:

— A companhia vai ter uma saída de caixa relativamente baixa, com benefício de usar crédito de prejuízo fiscal. Para a União é bom porque está precisando melhorar a arrecadação, e o governo tem uma meta fiscal bastante ousada que o mercado não está comprando.