Ricardo Nunes oficializa ex-coronel da PM indicado por Bolsonaro como vice
Acerto do prefeito de São Paulo com Mello Araújo foi marcado por resistências entre os 12 partidos da base aliada
O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), anunciou nesta sexta-feira (21) que seu vice na disputa à reeleição será Ricardo Augusto Nascimento de Mello Araújo (PL), ex-coronel da Polícia Militar e ex-presidente da Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp).
A decisão acata a indicação feita pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) em janeiro. O anuncio foi feito pelo governador Tarcísio de Freitas(Republicanos).
— A gente convergiu com o nome do Mello Araújo. É um nome que agrega muita qualidade. Tem uma trajetória ilibada na Polícia Militar, foi testado como gestor no Ceagesp e se saiu muito bem. Agrega, soma, a gente está muito confortável com essa indicação — falou Tarcísio.
Nunes afirmou que, quando Bolsonaro lhe apresentou o nome de Araújo, não tinha muita simpatia, mas que com um “processo democratico de diálogo” e conhecendo sua gestão na Ceagesp, passou a se agradar com o nome.
— É preciso valorizar esse processo. O Tarcísio passou a defender, depois veio o Apoio do PP, do Republicanos, e fico muito satisfeito que foi uma decisão vinda do melhor ato da democracia, que é o diálogo. Já vou começar a procurá-lo para ajudar no plano de governo. Corajoso, determinado, não aceita questões de corrupção e crime organizado e estamos aí para enfrentar essas questões — falou o prefeito.
O anúncio foi feito durante agenda conjunta do prefeito com o governador na Zona Sul da capital, onde os dois anunciaram a extensão da Linha 5-Lilás do Metrô até o Jardim Ângela.
Foi um evento com ares de campanha, com a presença de vários vereadores, e a escolha do local teve um peso simbólico: uma quadra esportiva no reduto eleitoral do vereador Milton Leite, presidente da Câmara Municipal e principal liderança do União Brasil na capital.
Leite foi um dos aliados de Nunes que mais se posicionaram contra a indicação de Araújo, mas cedeu após fazer um acordo com o PL paulistano: a anuência com o vice em troca de apoio para a eleição da mesa diretora da Câmara Municipal em 2025.
A escolha de Araújo como vice foi marcada por resistências por parte do próprio prefeito e de partidos da base aliada, que disputavam com o PL a prerrogativa de sugerir alguém para o posto.
Dentro do próprio PL, havia outros nomes cotados, como as vereadoras Sonaira Fernandes e Rute Costa, além da delegada Raquel Gallinatti, mas ao fim prevaleceu a vontade de Bolsonaro.
O desejo do prefeito era aguardar até julho para definir a questão, mas foi pressionado a acelerar o processo após a entrada do coach Pablo Marçal (PRTB) na disputa eleitoral. Isso porque, até então, Nunes figurava como principal pré-candidato do campo da direita, mas a chegada de Marçal ameaçou dividir esse eleitorado.
As discussões entre Nunes e os partidos que o apoiam se intensificaram nas últimas duas semanas, após Bolsonaro vir a São Paulo almoçar com o prefeito junto a Mello Araújo.
O governador, que até pouco tempo atrás também defendia um diálogo entre todas as siglas da base e uma definição mais tardia, passou a endossar publicamente o nome do ex-coronel e teve papel fundamental para chegar a um consenso, assumindo a missão do ex-presidente de emplacar um "bolsonarista nato" na chapa do emedebista.
O discurso oficial de Nunes na demora para anunciar o vice é de que, diferentemente de seu adversário Guilherme Boulos (PSOL) — que escolheu Marta Suplicy (PT) como vice por indicação de Lula (PT) —, ele não aceitaria “imposição” de ninguém, e que preza pelo diálogo democrático.
Entretanto, havia outros motivos para a resistência. Um deles é que Nunes tem reforçado a ideia de que é apoiado por uma “frente ampla”, agregando tanto partidos da direita quanto de centro, e por isso havia o receio de que um vice aliado de primeira hora de Bolsonaro pudesse afetar seu desempenho no segundo grupo.
O fato de São Paulo não ser uma cidade bolsonarista é um ponto de atenção para a pré-campanha, pois a maioria dos paulistanos votou em Lula (53,54%) e em Fernando Haddad (54,41%) em 2022.
Pesquisa Datafolha divulgada em 30 de maio mostrou que Bolsonaro é um padrinho rejeitado por 61% dos eleitores da capital, contra 45% de Lula.
Nunes não cultiva uma relação próxima com Araújo, e os dois haviam se encontrado poucas vezes, apenas quando Araújo presidia a Ceagesp entre 2020 e 2022.
Outro fator levado em consideração é que a chegada de um ex-Rota na chapa possa trazer à baila com mais força o tema da segurança pública, que é uma seara que o prefeito busca evitar em seus discursos porque a competência principal para resolver o problema é do governo estadual.
Mas, nos últimos dias, o prefeito já vinha adotando uma estratégia nova para se referir ao coronel: destacar seu trabalho na Ceagesp, e não como policial. Nunes tem dito que ficou “encantado” ao saber mais sobre a atuação de Araújo no local, pois ele teria acabado com esquemas de corrupção e de abuso sexual que ali ocorriam.
Além do MDB e PL, estão com o prefeito PSD, PP, Republicanos, Solidariedade, Avante, PRD, Podemos, Agir, Mobilização Nacional e União Brasil.
O coronel aposentado da PM Ricardo Mello Araújo coleciona posicionamentos alinhados aos do ex-presidente da República, de quem é fiel escudeiro.
Nas redes sociais, o militar já manifestou apoio ao impeachment de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), levantou suspeitas sobre o processo eleitoral e discursou contra o passaporte da vacina e a política de isolamento social em meio à pandemia da Covid-19.
Como comandante das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota), batalhão de elite da Polícia Militar paulista, Mello Araújo defendeu que a abordagem policial precisa ser diferente em bairros de elite, como os Jardins, e na periferia.
O ex-PM também já se posicionou a favor da extinção da Ouvidoria da polícia, que recebe denúncias e reclamações de policiais, e das câmeras em uniformes de agentes de segurança.
Em agosto de 2021, quando já ocupava o cargo de presidente da Ceagesp, o bolsonarista convidou veteranos da PM de São Paulo para uma manifestação no dia 7 de setembro. “Não podemos permitir que o comunismo assuma nosso país”, disse ele, em vídeo no Instagram.
A Corregedoria da PM chegou a instaurar um inquérito para apurar a conduta do coronel, mas o procedimento foi arquivado.
Mello Araújo assumiu a presidência da Ceagesp em outubro de 2020, tendo ficado no cargo até janeiro de 2023. À frente do entreposto, ele promoveu a militarização do armazém, nomeando 22 policiais militares para cargos comissionados.
Foi sob a gestão Mello Araújo que a Ceagesp alugou uma sala em sua sede, na Zona Oeste da capital paulista, para a instalação de um clube de tiro da empresa Seven Shooting Academia de Tiros e Comércio de Importação Ltda, cujo nome fantasia é g16 universidade do tiro e caça premium.
Em sua passagem pela estatal, o militar ainda entrou em conflitos com o Sindicato dos Empregados em Centrais de Abastecimento de Alimentos do Estado de São Paulo (Sindbast).
Em 2021, representantes do sindicato afirmaram que Mello tentou expulsá-los da sede que ocupam no local, em retaliação a denúncias feitas por trabalhadores ao Ministério Público do Trabalho contra o então presidente.
Mello, entretanto, disse que a ideia era fazer uma troca do espaço ocupado pelo sindicato com outra sala, já que o local estaria subutilizado.
O caso foi parar na Justiça, que autorizou a troca de lugar. Mas Mello acionou a Justiça também de forma individual, pedindo indenização por danos morais por ter sido chamado de “fascistinha” e “autoritário” pelo presidente do sindicato. A juíza Mariana Horta Greenhalgh negou o pedido em dezembro do ano passado.