Projeto de Pacheco para dívidas estaduais pode elevar dívida pública em R$ 462 bi até 2033
Levantamento foi feito por Felipe Salto, economista especialista em contas públicas
O projeto de renegociação da dívida dos estados apresentado pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), pode elevar a dívida pública em R$ 462,2 bilhões até 2033, nos cálculos do economista-chefe da corretora Warren Rena, Felipe Salto, e do analista Gabriel Garrote.
Em relação à estimativa da corretora, a dívida bruta em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) em 2033 passaria de 94,1% para 96,5%. Só em 2025, a perda para a União poderia chegar a R$ 33,5 bilhões.
De acordo com a proposta, os estados endividados poderão repassar ativos, como estatais, para a União para abater a dívida e reduzir os juros pagos em até 2 pontos percentuais em relação à regra geral de IPCA + 4%.
Em relação aos demais 2 pontos acima do IPCA, 1 pp deverá ser repassado a um fundo de equalização destinado a todos os estados da federação e o restante poderá ser revertido em investimentos em áreas específicas, sobretudo em educação.
Na prática, a União vai deixar de receber juros sobre o dinheiro emprestado aos Estados, restando apenas a correção monetária pelo IPCA. Em relatório, Salto e Garrote destacam que a medida não impacta o resultado primário do governo central, mas aumentará o déficit primário do setor público (resultado que inclui os estados e municípios, além de estatais) e a dívida pública.
“Nada contra renegociar a dívida estadual em momentos de dificuldade para os estados, como foi o período 2014-2016. Atualmente, no entanto, o problema mais grave reside na delicada situação da União. Este ente está com um déficit primário de R$ 299,1 bilhões no acumulado de doze meses até maio. Já os governos estaduais estão com superávit de R$ 40,1 bilhões. Quem precisa da ajuda é a União”, destaca o relatório.
Os cálculos da Warren Rena levam em conta que uma redução dos juros reais (acima da inflação) pagos pelos estados para zero aumentará o saldo negativo de juros da União, atualmente em R$ 679,3 bilhões e são integralmente financiados com emissão de dívida pública.
“Todo o pagamento a menos feito pelos estados por conta da renegociação se refletirá nesse montante, elevando ainda mais a dívida pública, que já segue em trajetória desfavorável.”
Incentivo para gastos
Além disso, como a proposta incentiva os investimentos dos estados, aumentará a despesa estadual, pressionando o resultado primário dos governos regionais. Segundo Salto e Garrote, ao final, é como se os gastos primários extras dos estados estivessem sendo bancados com o aumento da dívida da União junto ao mercado.
Eles alertam ainda que há um risco de repasse de ativos para o governo federal com valores superestimados diante da dificuldade de fazer uma avaliação correta, especialmente a cessão de créditos inscritos na dívida ativa. Além disso, avaliam que há um desincentivo para quitação dos compromissos em dia.
“É razoável esperar também que estes estados passem a demandar benefícios junto à União, por outros canais, o que agravará ainda mais o quadro fiscal. O fundo de estabilização previsto no projeto de lei complementar para distribuir dinheiro a todos os estados já seria o começo disso.”
O fundo de equalização é uma tentativa de alcançar um maior equilíbrio federativo com a proposta, dividindo o benefício que os estados superendividados terão com as demais unidades da federação. Atualmente, São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul respondem por quase 90% da dívida estadual com a União.
Estados se queixam
Mesmo assim, os estados com dívidas baixas ou que não estão devendo nada para o Tesouro Nacional ainda não consideram a proposta justa.
O governador do Piauí, Rafael Fonteles, afirmou que os cinco estados mais endividados, o que também inclui Goiás, podem ter uma redução superior a R$ 25 bilhões por ano nos encargos da dívida, enquanto o fundo seria irrigado com menos de R$ 6 bilhões por ano.
“Continuamos defendendo que é mais justo que o valor anual da redução dos encargos da dívida dos cinco estados seja igual ao valor anual disponibilizado para os demais 22 estados, através do fundo de equalização federativa”, disse nas redes sociais.
Há uma proposta também para que o repasse para o fundo seja representa 2 pontos percentuais dos juros, em vez de 1 ponto. Não há consenso, porém, entre os estados menos endividados. Parte dos governadores teme perder os recursos referentes a 1 ponto já acordado.
Mesmo entre os mais endividados, Goiás também tem divergência em relação à proposta atual de Pacheco. Segundo o governo goiano, o projeto não proporcionará a redução dos juros como se vinha discutindo, de IPCA + 1% ou IPCA + 2%, porque dependerá do repasse de ativos, cuja aceitação depende da União.
“O governo de Goiás reconhece a importância da iniciativa, todavia aponta que a proposta, em sua forma atual, não atenderá plenamente às necessidades do estado”, diz, em nota.