OPINIÃO

O fator China

Em 13 de setembro de 2023, 10 meses antes da eleição, Nicolás Maduro encontrou o líder chinês Xi Jinping, com quem assinou o “Tratado de parceria estratégica sob todas as condições”, incluindo participação no programa espacial do gigante asiático.

A China é o 2º maior parceiro comercial da Venezuela, ficando atrás dos Estados Unidos, que retomaram a compra de petróleo depois que o governo Maduro prometeu eleições livres e transparentes.

A China tem um objetivo geopolítico claro: romper a bipolaridade do poder no planeta, incluindo a adoção de novo padrão monetário capaz de rivalizar com o dólar e o euro. O país asiático deu suporte à Rússia com seu sistema financeiro, a ponto de neutralizar as sanções impostas pela Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte).

Maduro foi à China para fazer uma espécie de seguro contra a crise política perfeitamente previsível. Ele sabia de antemão da sua derrota para a oposição. A Venezuela entrou para os Brics muito mais pelas mãos de Xi Jinping do que pelas de Lula. E, agora, diante da turbulência e das exigências da comunidade internacional, tentará se agarrar aos chineses para garantir a sobrevivência do regime chavista.

A China emprestou ao governo de Caracas US$ 50 bilhões, pagos com remessas de petróleo e dos quais ainda há um saldo devedor de US$ 10 bilhões.

Desde 2019, com o fim das sanções negociadas por Donald Trump, a Chevron e a PetroChina estão operando refinarias. O petróleo venezuelano é vital para as economias dos EUA e da China, e Maduro sabe disso. Por isso, trouxe para o palco um novo ator relevante na geopolítica da América Latina.

Os chineses estão chegando aqui com a mesma força com que desembarcaram na Europa. Dominam pequenos comércios, empregam toda a família, trabalham todos os dias da semana e vão se enraizando na sociedade.

Eles se adaptam facilmente, aprendem a língua e os costumes. No Natal de 2023, eu estava no interior do Chile e a única loja da cidade a abrir as portas foi a do chinês, onde se podia comprar literalmente qualquer coisa. Ele me contou que recebeu ajuda de seu governo para aprender espanhol, estudou o país e se preparou para trabalhar do outro lado do Pacífico. Esta história se repete em Peru, Argentina, Uruguai, Equador, Venezuela, toda a Europa e até nos Estados Unidos.

O governo dos Estados Unidos fez uma declaração dura contra a falta de transparência das eleições. Cobra a vitória de Edmundo González. O mesmo faz a OEA (Organização dos Estados Americanos). Brasil, Colômbia e México, governados pela esquerda, estão ajudando Maduro a ganhar tempo. A China foi a primeira grande economia a reconhecer a vitória de Maduro, dando sequência aos 31 acordos de “Parceria estratégica sob todas as condições”. Tudo indica que não será possível negociar uma saída para a crise da eleição sem os chineses que, certamente, exigirão algo em troca se Maduro for apeado do poder.

Nessa confusão da Venezuela, o mais curioso é que a oposição mostrou boletins de urnas, ou atas eleitorais, com números indicando a clara vitória de Edmundo González, e nem o governo ou os apoiadores do chavista disseram que os documentos eram falsos ou manipulados. Enquanto isso, Maduro diz que venceu, mas não mostra a prova da vitória.

Nós, brasileiros, sabemos muito bem como funciona o sistema eletrônico de votação. Somos pioneiros nessa tecnologia. Esses resultados são automáticos e as urnas, como assegura nosso TSE (Tribunal Superior Eleitoral), não sofrem interferência da internet e, por isso, não sofrem ataques hackers. E mesmo que tenham acontecido, os boletins seguiram preservados. Há ainda o voto impresso auditável, que não existe no Brasil e garante a auditagem rápida. Quanto mais passa o tempo, mais difícil de explicar.

O cenário de impasse mostra que o Caribe está se transformando num novo ponto de conflito global, o 3º depois da Ucrânia e de Israel. Faz pouco tempo que Maduro ameaçou – e ainda ameaça – invadir a Guiana, para resgatar o Essequibo.

Neste Caribe petroleiro, ileso de conflitos mundiais nas últimas 5 ou 6 décadas (a última foi a crise dos mísseis no governo John Kennedy), está sendo criada uma disputa econômica entre os gigantes da economia mundial.

Nessa briga, os atores políticos regionais, como Brasil, México e Colômbia, tendem a ter um peso reduzido, porque já optaram por ficar ao lado da China e da Venezuela de Maduro. Ainda que a oposição tenha apoio da Otan, a permanência de Maduro pode se prolongar pelas pressões diplomáticas da China e o apoio de Brasil, Colômbia e México. O chavismo luta pela sobrevivência, numa batalha de vida ou morte.

 

*Jornalista