Netanyahu evita falar sobre responsabilidade nos ataques de 7 de outubro
Premier se apresentou como o mais indicado para garantir a segurança do território israelense, mas, sob seu mandato, país vive acúmulo de tensões sem previsão para acabar
O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, se recusa a se desculpar por ter deixado o Estado judeu vulnerável ao ataque terrorista do Hamas em 7 de outubro, quando cerca de 1,2 mil pessoas morreram e mais de 250 foram sequestradas.
Em entrevista à revista americana Time, realizada no último domingo e publicada nesta quinta-feira, ele disse “lamentar profundamente” que algo do tipo tenha acontecido, e que até pensa se poderiam ter feito algo para evitar o atentado.
No entanto, quando questionado sobre qual sua parcela de responsabilidade, ele declarou que “lidar com isso agora”, em meio à guerra, “é um erro”.
— Pedir desculpas? Claro, lamento profundamente que algo assim tenha acontecido — disse o primeiro-ministro à revista Time. — Acho que nós vamos examinar em detalhes essa questão [no futuro]. Como isso aconteceu? Como essa falha de inteligência, capacidade operacional e outras políticas contribuíram [para o ataque]? Haverá tempo suficiente para lidar com isso. Mas acho que lidar com isso agora é um erro. Estamos no meio de uma guerra, um conflito de sete frentes. Acho que temos que nos concentrar em uma coisa: vencer.
Seu mandato cumulativo de quase 17 anos faz dele, que se apresentou como o mais indicado para garantir a defesa do território israelense, o primeiro-ministro que mais tempo esteve no cargo em Israel.
Apesar disso, o país agora se vê numa guerra contra o Hamas que já deixou quase 40 mil mortos na Faixa de Gaza e aumentou as tensões na região, que também espera por um ataque aéreo do Irã – o segundo em quatro meses – a qualquer momento.
Somado a isso, mais de 100 reféns ainda estão mantidos no enclave, e, apesar dos apelos internacionais, não há um plano confiável articulado para dar fim ao conflito.
— Estamos diante de um eixo iraniano completo e entendemos que precisamos nos organizar para uma defesa mais ampla — disse Netanyahu, reconhecendo que Israel hoje enfrenta hostilidades com o grupo xiita Hezbollah no Líbano; com os Houthis no Iêmen e, mais importante, com o Irã.
Enquanto o trauma coletivo após os ataques do Hamas parece ter unido os judeus israelenses, diz a Time, ele também aprofundou as dúvidas sobre as dúvidas sobre a gestão de Netanyahu, com 72% acreditando que ele deveria renunciar – agora ou depois da guerra, de acordo com uma pesquisa de julho conduzida no país.
No exterior, o isolamento também foi crescente: mandados de prisão foram emitidos pelo Tribunal Penal Internacional (TPI) contra Netanyahu e o ministro da Defesa israelense, Yoav Gallant, por supostos crimes de guerra, e campi universitários americanos realizaram protestos contra Israel – os maiores do tipo desde a Guerra do Vietnã.
Em 25 de julho, durante sua primeira viagem ao exterior desde o início da guerra, Netanyahu discursou numa sessão conjunta do Congresso americano na esperança de reforçar a aliança com seu maior e mais essencial aliado.
No entanto, por trás dos aplausos que recebeu, outra questão foi unânime: o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, a vice Kamala Harris e o ex-presidente Donald Trump concordaram que era hora de acabar com a guerra em Gaza.
Dois dias depois e sem avisar a Casa Branca, porém, uma bomba quase certamente plantada por Israel matou o líder político do Hamas, Ismail Haniyeh, no Irã.
Críticos da administração do premier israelense indicam que ele pode estar prolongando o conflito na Faixa de Gaza por razões políticas pessoais.
Isso porque, dizem eles, um acordo de cessar-fogo permanente traria de volta os reféns e abriria porta para novas eleições em Israel que poderiam resultar na remoção de Netanyahu do cargo.
À Time, o ex-primeiro-ministro israelense Ehud Barak, que por quatro anos também serviu como ministro da Defesa, disse que “Netanyahu está focado em sua longevidade no poder mais do que nos interesses do povo israelense ou do Estado de Israel”.
O atual premier, no entanto, insiste que o objetivo em Gaza deve ser uma vitória tão decisiva que o Hamas não será capaz de reivindicar o governo em territórios palestinos – e tampouco poderá representar uma ameaça a Israel.
Caso contrário, ele argumenta, isso apenas condenará o território israelense a um futuro de mais massacres.
A visão do premier vai de encontro com o que o principal porta-voz do Exército de Israel, o contra-almirante Daniel Hagari, já afirmou.
Em junho, ele declarou que não é possível eliminar o grupo terrorista por meio da guerra, já que o Hamas também é uma ideologia.
— Não podemos eliminar uma ideologia. Dizer que vamos fazer o Hamas desaparecer é jogar areia nos olhos das pessoas — disse Hagari em entrevista à emissora israelense Canal 13. — Se não oferecermos uma alternativa, no final, teremos o Hamas no poder em Gaza.