Venezuela

Parlamento da Venezuela aprova projeto de lei que mira ONGs após distúrbios causados pela reeleição

Texto aprovado pela Assembleia Nacional, de maioria chavista, integra pacote legislativo solicitado pelo presidente do país após manifestações contrárias à sua reeleição

A Assembleia Nacional da Venezuela durante sessão extraordinária - Federico Parra/AFP

A Assembleia Nacional Venezuelana, de maioria chavista, aprovou por unanimidade, e sob aplausos, o projeto de lei que busca controlar as ONGs do país, nesta quinta-feira.

Amplamente criticado por ativistas, que afirmam que ele restringirá os direitos civis, o projeto foi sancionado em segunda discussão e é o primeiro de um pacote legislativo solicitado pelo presidente Nicolás Maduro em meio à crise gerada após sua questionada reeleição em 28 de julho a ser aprovado.

A aprovação não foi uma surpresa, já que o chavismo tem 256 dos 277 deputados da Assembleia Nacional venezuelana.

A regulamentação dessas ONGs, frequentemente alvo de ataques pelo governo, era o primeiro projeto de lei que o parlamento buscava aprovar, de acordo com seu presidente, Jorge Rodríguez, para "impor o respeito ao resultado eleitoral" em meio a alegações de fraude na reeleição de Maduro.

O chavista foi proclamado vencedor com 52% dos votos, resultado que a oposição, liderada por María Corina Machado, contesta, argumentando que o candidato Edmundo González Urrutia é o verdadeiro vencedor.

As alegações foram consideradas por Maduro como incitamento a um "golpe de Estado".

Com a lei, as ONGs serão obrigadas, por exemplo, a se registrar localmente e a fazer uma "lista das doações recebidas com a identificação completa dos doadores, indicando se são nacionais ou estrangeiros".

O texto também proíbe "promover o fascismo" e "a intolerância ou o ódio", bem como "realizar atividades próprias dos partidos políticos". Na região, há regulamentações semelhantes em Cuba, Nicarágua, Guatemala e Bolívia.

O não cumprimento acarreta multas de até US$ 10 mil.

Mas ativistas e defensores dos direitos humanos alertaram que a lei limita os direitos civis e temem uma restrição do espaço cívico.

A proposta também acendeu o alerta da comunidade internacional, que teme o recrudescimento da repressão no país.

Desde que o Conselho Eleitoral Nacional (CNE) venezuelano proclamou presidente, apesar de ter apenas 80% das urnas apuradas, pelo menos 25 pessoas morreram, 192 ficaram feridas, segundo o procurador-geral do país, Tarek William Saab, e mais de 2,4 mil pessoas foram detidas durante as manifestações contrárias à reeleição de Maduro.

Já a ONG Repórteres Sem Fronteiras contabilizou 70 violações à liberdade de expressão em 15 dias, incluindo a prisão de nove jornalistas, quatro ainda detidos por acusações de conspiração, terrorismo, incitação à violência e atividades subversivas.

O Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos pediu às autoridades que parassem de aprovar "leis que minam o espaço cívico e democrático" e enfatizou que há um "clima de medo" no país, no qual "é impossível implementar princípios democráticos e proteger os direitos humanos".

O projeto, cujo conteúdo não foi divulgado na íntegra, já passou por diversas modificações, e sua primeira discussão remonta a 2023. Desta vez, deputados chavistas pediram alterações em um artigo que versa sobre os motivos que podem levar à dissolução de uma ONG.

O pacote de leis solicitado por Maduro também inclui a regulamentação das redes sociais e uma normativa para punir o "fascismo", termo com o qual o governo costuma se referir a seus críticos.

A lei contra o fascismo pune a promoção de reuniões ou manifestações que façam "apologia ao fascismo" e propõe a ilegalização de partidos políticos e multas de até US$ 100 mil (cerca de R$ 549 mil) para empresas, organizações ou meios de comunicação que financiem atividades ou divulguem informações que "incitem ao fascismo".