FOLHA ENERGIA

Descarbonização: via para transformação em prol do meio ambiente

Entre os segmentos responsáveis pela poluição, o setor de transportes está em destaque, sendo responsável por 16,2% do total de CO2 emitido mundialmente

O gás natural veicular é uma das alternativas à emissão de CO2, pois apresenta baixo índice de emissão de poluentes - Paulo Maciel/Grande Recife

Parte essencial do enfrentamento das mudanças climáticas, a descarbonização passa por diversas etapas. Para isso, o primeiro passo deve ser a compreensão do cenário atual de emissões de CO2 e do seu impacto no planeta. 

Sem uma política climática adequada, a projeção da Universidade de Oxford é que, até  2100, cerca de três bilhões de pessoas se tornarão refugiadas do clima.

Para evitar esse cenário, é preciso que o nível de emissões de poluentes seja reduzido drasticamente.

Setor de transportes
Em todo o mundo, o uso de energia aparece como o fator responsável pela maior parte das emissões de gases poluentes na atmosfera.

Entre os segmentos, um dos destaques está no setor de transportes que é responsável por 16,2% do total de CO2 emitido mundialmente. No Brasil, apesar de ser menor, cerca de 13%, o índice revela o potencial de descarbonização do segmento.

Lidar com as emissões realizadas pelo transporte é um desafio que envolve um grande ciclo. Isso porque o cenário deve ser observado de forma global, avaliando as emissões realizadas “do poço à roda”.

Nessa perspectiva, são contabilizados os lançamentos de poluentes realizados durante toda a etapa de vida do transporte, partindo da fabricação até à queima do combustível ou da geração de eletricidade ao seu uso nos veículos.

A avaliação envolve pontos como eficiência energética veicular, emissões de gases do efeito estufa, medição da pegada de carbono do combustível durante a fabricação da matéria-prima, produção e utilização.

Entre o segmento de transportes, o setor rodoviário é o que se destaca como responsável por 73,46% das emissões totais realizadas. Por isso, a diminuição do lançamento de poluentes pelo segmento é vista como essencial para o processo de descarbonização. 

Alternativas 
Um dos principais combustíveis que deverá ajudar na redução da emissão de gases poluentes é o etanol. Biocombustível limpo e acessível, o etanol também é uma fonte de energia de baixo carbono. De acordo com a União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica), o etanol emite até 90% menos CO2 do que a gasolina. 

Levando em consideração o conceito do poço à roda, o etanol demonstra uma grande eficiência por conta da capacidade da cana-de-açúcar de absorver, durante o seu ciclo de desenvolvimento vegetal, entre 70% e 80% do CO2 liberado na produção. 

No último ano, 36% dos veículos comercializados no Brasil já podiam ser considerados de baixo carbono por estarem adaptados ao uso de etanol. Além disso, outros 1,1% também fazem parte do grupo de baixo carbono. No entanto, no lugar do etanol, os veículos foram fabricados para utilizar a energia elétrica. 

João Irineu Medeiros, vice-presidente de Assuntos Regulatórios da Stellantis para a América do Sul | Foto: Stellantis/Divulgação

Veículos
Para os próximos anos, a expectativa é de que a presença de veículos híbridos ou bio-híbridos (abastecidos tanto por etanol quanto por energia elétrica), aumente no mercado brasileiro. 

A opção é vista como a alternativa que melhor se adequa à realidade durante o processo de transição energética. A opinião é de João Irineu Medeiros, vice-presidente de Assuntos Regulatórios da Stellantis para a América do Sul.

“A nossa realidade é que não conseguimos ir para o 100% elétrico em toda a produção porque ele é caro, especialmente por causa da infraestrutura. As soluções eletrificadas que são mais baratas podem ser combinadas com flex, com o etanol”, afirma.

Desafio
Avaliando que o desafio da descarbonização é transversal, Irineu considera que a troca de experiências pode, inclusive, auxiliar no enfrentamento da crise para além de um único setor da economia. Para tal, ele aponta que o mercado de carbono pode auxiliar no processo necessário de integração.

“Esse é um problema transversal que não está localizado em um único setor de negócios. A descarbonização deve ser maior do que a indústria automotiva, é uma questão que está presente em todos os setores produtivos. Por isso, é fundamental que eles estejam conectados, e o mercado de carbono seguramente vai ajudar nessa conexão”, observa.

 No cenário de busca por soluções, João Irineu destaca a importância da integração entre instituições. “É importante que as empresas criem esse ecossistema em torno delas para que possam absorver conhecimento e tecnologia e materializar esse processo de inovação”, continua.

A perspectiva passa também por um processo de adaptação do mercado que tem voltado suas atenções para o aumento da demanda de fontes renováveis. 

Gás Natural 
Entre as opções de baixo carbono no Brasil, um dos destaques é o Gás Natural Veicular (GNV), que apresenta um baixo índice de emissão de poluentes. 

Além de eliminar a fumaça que é lançada na atmosfera, o combustível também viabiliza uma redução de até 98% do óxido de enxofre e 70% do óxido de nitrogênio emitidos na comparação com o óleo diesel. Já com relação ao monóxido de carbono, a redução é de cerca de 90% no comparativo com a gasolina.

 

O gás  pode ser uma solução para aumentar a eficiência do sistema | Foto: Divulgação

Transporte público
Um dos principais desafios para a redução do uso de combustíveis fósseis é a mudança no transporte público.

Recentemente, um projeto lançado pelo Governo de Pernambuco - por meio da Secretaria de Mobilidade e Infraestrutura (Semobi) em parceria com o Grande Recife Consórcio de Transporte (CTM), a Companhia Pernambucana de Gás (Copergás) e a Conorte - iniciou os testes de ônibus movidos a GNC (Gás Natural Comprimido). 

Para o diretor-presidente do Grande Recife Consórcio, Matheus Freitas, a modificação auxiliaria não só a diminuição da emissão de gases de efeito estufa como também pode ser uma solução para aumentar a eficiência energética do sistema.

“O modelo em teste tem capacidade para transportar 86 passageiros. Se a experiência se mostrar exitosa, poderemos ampliar essa iniciativa.”

Os veículos funcionam com gás metano, o que permite o uso tanto do GNC como do biometano como fontes de combustível.

O novo modelo emite 20% a menos CO2 do que um modelo equivalente a diesel. Já a redução de emissão de óxidos de nitrogênio (NOx) é de quase 90% e a de material particulado, 85%.

De acordo com o diretor-presidente da Copergás, Felipe Valença, o uso do gás natural em veículos pesados ainda precisa de parâmetros para ser considerado economicamente viável. 

“Estamos observando a questão do rendimento porque também existe esse viés econômico, o mesmo vale para os caminhões.” 

Veículos leves 
O gás natural veicular (GNV) também é visto como uma das soluções para o setor de transportes. Alinhada a essa realidade, a Copergás tem incentivado o uso do combustível de baixo carbono em Pernambuco.

“No Estado, temos a quarta maior frota de GNV do Brasil. Conseguimos esse número com uma agenda de incentivos e iniciativas para aumentar a frota. Em parceria com o Governo de Pernambuco, o Estado hoje concede um desconto de 40% no IPVA para os carros a gás que também proporciona uma economia com relação à gasolina”, afirma.

Além dos incentivos, a companhia também tem investido na expansão da rede para garantir que os motoristas que optam pelo GNV possam ser atendidos em todo o Estado.

“Com essa expansão, hoje é possível cruzar o Estado utilizando GNV.”

Esse preparo é considerado fundamental para a absorção de uma demanda que tende a crescer nos próximos anos, incluindo veículos leves e pesados.

“É um negócio que já está acelerando em algumas regiões, não só do Brasil”, conclui Felipe. 

Transporte marítimo
Dentro do cenário de descarbonização, também existe a necessidade de pensar nas formas de reduzir o consumo de carbono em outros segmentos. 

Alinhado à necessidade global, o Complexo de Suape tem buscado opções para reduzir a emissão de poluentes. Segundo o diretor-presidente Márcio Guiot, um estudo de resiliência climática foi realizado para definir um plano de ação para a descarbonização do complexo.

Dividido em eixos que tratam desde a emissão realizada pela administração do complexo portuário até a das cargas que circulam no local, o plano busca identificar e neutralizar ou mitigar todos os pontos de emissões do complexo. 

“Nosso desafio é que o complexo esteja neutralizado até 2038. Para caminharmos nessa direção, um dos pontos que estão sendo estudados com relação aos navios é o fornecimento de energia. No Brasil, nós saímos na frente porque já temos uma matriz energética muito limpa”, explica Márcio.

Conexão
Para ele, a conexão dos navios à rede elétrica é uma grande tendência mundial e deverá auxiliar no processo de descarbonização.

De acordo com um estudo de viabilidade técnica já realizado em Suape, foi constatada a capacidade do complexo de fornecer essa energia para os navios.

Agora, será realizado um estudo de viabilidade econômica da solução encontrada.

Outra alternativa seria o uso de metanol para transporte marítimo. Tendo em vista esse potencial, o Complexo de Suape deverá abrigar a primeira planta de metanol do Brasil.