São Paulo

Em áudio, Marçal se ofereceu para enviar e-mails usados por grupo que aplicava golpes bancários

No diálogo, líder do esquema recusou a oferta, mas conversa foi usada como prova pela Justiça para condenar o ex-coach; candidato diz que não tinha conhecimento da fraude

Pablo Marçal é pré-candidato à Prefeitura de São Paulo - Instagram/@pablomarcal1/Reprodução

Áudios obtidos pela Polícia Federal mostram o ex-coach Pablo Marçal conversando sobre a captura de endereços de e-mails que foram usados para atrair vítimas de um esquema de golpes bancárias.

O diálogo foi utilizado pela Justiça para fundamentar a condenação do candidato do PRTB à prefeitura de São Paulo por integrar o grupo criminoso.

A pena dele, porém, foi extinta por prescrição do processo.

De acordo com a sentença, o grupo disparava e-mails com assuntos chamativos, como avisos falsos de inadimplência ou de irregularidades no CPF e na declaração de Imposto de Renda, para atrair vítimas e ter acesso a senhas.

Marçal foi apontado pela Justiça como o encarregado de capturar as listas de e-mails.

Posteriormente, o grupo que o contratou infectava os computadores das vítimas com os programas invasores.

Procurado via assessoria, o ex-coach não se manifestou.

Quando questionado sobre o caso, ele disse em depoimento que apenas atuava na manutenção de computadores e que não sabia da atuação criminosa.

Em um dos áudios, Marçal conversa sobre a seleção de e-mails com o acusado de liderar o grupo.

Um programa era usado para captar as contas que eram de fato acessadas pelos usuários, aumentando a chance de as vítimas clicarem nos links maliciosos.

Quero ver a produção de e-mail capturado. Aqueles e-mails que você capturou no primeiro dia não estavam bons cobrou o chefe do grupo.

Em resposta, Marçal perguntou se ele próprio não poderia disparar os e-mails.

Não tem jeito de eu enviar de lá (endereço onde o grupo se reunia)? Eu mesmo pôr para enviar os que eu estou pegando? questionou Marçal.

O interlocutor, então, recusa a oferta e orienta Marçal a apenas "capturar" os e-mails.

A sentença que condenou o ex-coach a quatro anos e cinco meses de prisão cita outros seis áudios que, conforme decisão, comprovam a participação do candidato no esquema.

Em um deles, Marçal diz que está zipando (compactando) os e-mails capturados e que vai mandá-los para o líder do grupo.

O candidato diz que dois computadores estão capturando os endereços eletrônicos e outros dois estão enviando as mensagens.

Outra conversa mostra o acusado de liderar o esquema dando orientações sobre como fazer a seleção das listas de e-mails, para evitar "problemas" como endereços inativos.

Em resposta, Marçal afirma que "vai fazer isso".

Em outro diálogo obtido pela PF, Marçal diz que precisava da chave do escritório onde os computadores do grupo ficavam sediados.

Decisão judicial
Na decisão que condenou Marçal, o magistrado diz que, "apesar da negativa de participação nos fatos delituosos, as próprias declarações de Pablo Henrique (Marçal) na polícia são discrepantes com a tese de inocência defendida" pelo ex-coach.

O juiz acrescenta que os "conhecimentos" do candidato em "informática" possibilitavam a ele "claramente compreender a perfeita dimensão do que ocorria, ainda mais com os programas maliciosos existentes nos computadores".

O juiz afirma que, ao mesmo tempo que dizia desconhecer os golpes, Marçal caiu em contradição num depoimento ao afirmar que o homem acusado de liderar o esquema disse a ele que um outro integrante do grupo faria "programas invasores que simulariam páginas de instituições bancárias para com isso capturar dados de correntistas"

Em depoimento à PF, Marçal reiterou que não tinha conhecimento do golpe.

Eu cheguei a perguntar para ele (líder do grupo) para que que servia. Ele falou que era para um trabalho de publicidade que ele fazia para um amigo dele, um médico. Aí ele falava assim que não tinha... não tinha problema, que ele vendia era produto médico ou anunciava trem de médico. Eu não sabia a finalidade que era a lista. Para mim não tinha nada de ilegal. (...) Ele é pastor, né? Conheço ele de muitos anos, achava ele uma pessoa idônea, não tinha motivo de desconfiança dele disse Marçal à época.

Questionado em um dos interrogatórios em novembro de 2005, o acusado de liderar o esquema disse que Marçal não sabia para qual finalidade seriam usadas as listas de e-mail captadas, mas confirmou que o candidato atuava na captação das contas e não apenas na manutenção dos equipamentos.

Pelos serviços, o ex-coach recebeu a promessa de remuneração de R$ 400, mas acabou recebendo entre R$ 300 e R$ 350 mensais, pouco mais que um salário mínimo à época.

Ao condená-lo, o juiz afirma que Marçal "dava suporte aos furtos perpetrados", mas tinha uma atuação "de menor importância e secundária".