Regulação vai ajudar na descarbonização
Em discussão no Congresso Nacional, legislação voltada ao mercado de carbono deverá auxiliar o Brasil a se adequar aos parâmetros internacionais
Em debate no Congresso Nacional, a criação de uma regulação brasileira para o mercado de carbono poderá ajudar o País a se adequar aos parâmetros internacionais que buscam incentivar a descarbonização da indústria.
Iniciado em 1997 durante a terceira Conferência das Partes (COP), o debate tem avançado em conjunto com a demanda por uma limitação da emissão de poluentes para lidar com o agravamento da crise climática global.
No último ano, a necessidade de uma transição energética e do abandono dos combustíveis fósseis foi citada pela primeira vez em um relatório da COP. Assinado por 195 países, incluindo o Brasil, o documento traz a perspectiva de que o tema se torne foco das próximas conferências.
Confirmada no Brasil em 2025, a COP 30 deverá colocar o assunto em destaque outra vez. No preparo para sediar o evento, o País tem avançado na discussão do uso de combustíveis fósseis e das etapas necessárias para a transição energética. Entre elas, a regulação do mercado de carbono.
A criação de limites para a emissão de combustíveis fósseis é considerada essencial para evitar que a temperatura global ultrapasse em até 1,5º C os níveis pré-industriais, o que poderia acarretar consequências irreversíveis para o planeta e a humanidade.
Planejamento
A principal ferramenta para enfrentar a mudança do clima é o Plano Clima, que guiará a política do setor até 2035.
Elaborado por um Comitê Interministerial que reúne mais de 20 ministérios, o planejamento é formado por planos setoriais e estratégias nacionais de mitigação e adaptação.
Com relação à mitigação, o foco será a redução das emissões brasileiras de gases de efeito estufa. Entre os esforços possíveis para ampliar o enfrentamento da mudança climática, a criação do mercado de carbono é vista como uma das maiores apostas.
O sistema deverá funcionar com créditos que são obtidos por meio de projetos que reduzem ou eliminam a emissão de gases causadores do efeito estufa. Por regra, um crédito de carbono é conquistado por cada tonelada que deixou de ser emitida para a atmosfera.
Esses créditos podem ser negociados entre as empresas que também receberão incentivos pela adoção das boas práticas.
Com a regulação, o objetivo é que os estímulos gerados fomentem o controle da emissão de carbono realizada pelas instituições privadas, auxiliando na conquista das metas estabelecidas pelo Brasil.
No entanto, o País ainda não possui uma legislação específica que limite ou regule a emissão de poluentes. Apesar disso, diversos projetos de lei que tratam do mercado de carbono têm avançado no Congresso Nacional.
Mercado de carbono
Uma das propostas mais recentes traz os parâmetros de funcionamento do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE).
Apresentado neste ano, o projeto prevê a criação de metas para a adequação do País ao sistema que deverá ser implementado em cinco fases com durações variadas.
Entre os modelos de regulamentação disponíveis, dois são apresentados como alternativa para o Brasil. Batizado de carbon tax, o primeiro realiza a taxação da emissão de carbono e efetua cobranças pelos gases lançados na atmosfera.
Já o outro modelo, denominado de cap and trade, prevê a existência de um teto para as emissões que é definido de acordo com cada instituição. Para as empresas que ultrapassarem o limite definido é apresentada a opção de realizar a compra de créditos de outras empresas que não atingiram o teto.
Em junho, uma audiência pública, realizada pela Subcomissão do Mercado de Ativos Ambientais, reuniu especialistas para debater a regulamentação do mercado de crédito de carbono no Brasil.
Durante a audiência, a coordenadora-geral de Finanças Verdes do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), Beatriz Soares, em entrevista para a Agência Senado, avaliou que os ativos ambientais previstos do sistema brasileiro — as cotas e os créditos — deverão contribuir para a proteção climática, além de auxiliar na redução do volume de emissões realizadas no Brasil.
Além disso, o projeto de lei também cria a figura dos operadores que podem decidir medidas de mitigação. Para tal, será necessário definir o ano base a partir do qual vão ser coletadas as informações de emissão.
O debate contou ainda com a participação da advogada Caroline Prolo, cofundadora e presidente do Conselho da Laclima (Latin American Climate Lawyers Initiative for Mobilizing Action), uma rede de advogados de mudanças climáticas na América Latina.
Em conversa com a Agência Senado, Caroline afirmou que o mercado de carbono deverá ter um papel essencial na descarbonização e manutenção da biodiversidade brasileira.
“A história de como o Brasil vai passar a precificar os ativos começa com o projeto de lei que vai ser capaz de colocar um valor para o carbono no Brasil servindo como um tubo de ensaio”, comentou Caroline.
Segundo a advogada, o sistema proposto terá a vantagem de oferecer a possibilidade de que os ativos do mercado voluntário migrem para o regulamentado. Dessa forma, os ativos ambientais passarão a ter um maior valor.
A advogada destaca ainda a necessidade de um preparo no país para lidar com a crise climática que pode trazer consequências avassaladoras.
“Isso exige ações de redução dos gases de efeito estufa assim como de adaptação à mudança do clima”, concluiu.
Foto: Geraldo Magela /Agência Senado
Experiências
Atualmente, uma experiência relacionada ao mercado de carbono já está em vigor no Brasil. A iniciativa foi adotada pelo estado do Tocantins que estabeleceu, ainda no ano de 2008, uma política estadual das mudanças climáticas.
No último ano, de acordo com o diretor-presidente da Tocantins Parcerias, Aleandro Lacerda, o estado também aprovou a Lei do Fundo Clima e a Política Estadual de pagamento por serviços ambientais.
Segundo Aleandro Lacerda, sempre houve dificuldades na busca por recursos para uma política que tem um produto invisível, mas que tem como ser certificado.
“Quanto mais o Brasil demora em regulamentar o carbono, mais barato ele vai ficando”, afirmou em entrevista para a Agência Senado.
Para garantir uma regulamentação, o estado do Tocantins destina os recursos obtidos com a venda de carbono para um fundo estadual que tem uma governança participativa das comunidades e do estado.
“Queremos trabalhar com carbono, com as comunidades, mas com nível de qualidade técnica e jurídica”, finalizou Aleandro.