Justiça espanhola quer extrair vídeos e fotos do celular da ex-mulher de Alberto Fernández
O promotor Ramiro González administra um mecanismo de colaboração para acessar as provas diretamente, e não às capturas de tela enviadas pela denunciante
Enquanto na Argentina avançam as declarações de testemunhas sobre a denúncia de agressões do ex-presidente Alberto Fernández à sua ex-mulher, Fabiola Yañez, o promotor federal Ramiro González busca extrair diretamente do celular da ex-primeira-dama os vídeos e fotos que serviriam como evidências dessas agressões.
Até agora, é a acusação de Yañez, assistida pela advogada Mariana Gallego, que tem apresentado as provas, ainda que de forma esparsa. Inicialmente, foram apresentadas duas fotografias: uma do dia 11 de agosto, mostrando um hematoma em um olho, e outra com evidências de hematomas nos braços, como se tivesse sido sacudida.
Na sexta-feira, foi apresentado um documento e um vídeo mostrando Yañez tratando um hematoma no olho. Este último vídeo é do dia 22 de junho passado, segundo pessoas próximas à ex-primeira-dama, o que indicaria que houve agressões em dois meses. Além disso, chats e declarações de Yañez sugerem que ela pode ter sofrido outros golpes em julho.
Essa diferença é importante, pois a acusação contra Fernández é por lesões leves e graves, com agravantes. Caso se prove que houve vários episódios, as possíveis penas por cada um deles seriam somadas, expondo o ex-presidente a uma condenação severa.
Nesta segunda-feira, o promotor González tomará o depoimento de Daniel Rodríguez, ex-prefeito da Quinta de Olivos. Rodríguez é uma testemunha chave, pois pode ter visto ou ouvido alguma agressão. Até o momento, nenhum testemunha afirmou ter visto Alberto Fernández agredir sua ex-mulher. Os testemunhas disseram ter sabido dos ataques através de Yañez, e alguns deles viram as fotos.
Por isso, o depoimento de Rodríguez é crucial. Entre os investigadores, cresce a ideia de que, a partir de sua declaração, novos nomes de testemunhas podem surgir para serem convocados. Na época das agressões denunciadas, cerca de 80 pessoas trabalhavam na Quinta de Olivos em turnos rotativos. A Justiça busca determinar quem poderia ter estado trabalhando no momento em que as fotos e vídeos supostamente mostram as agressões. O mesmo se aplica se Rodríguez identificar algum fato de violência.
Além disso, está sendo feito um esforço para concretizar o depoimento da mãe da ex-primeira-dama, Miriam Yañez Verdugo, que vive na Espanha com sua filha, para confirmar as denúncias e determinar se presenciou alguma das agressões.
O promotor González está avaliando a melhor forma de formalizar esse depoimento, seja por meio de um pedido formal à Audiencia Nacional de Madrid através do Ministério das Relações Exteriores ou por meio de um acordo de colaboração com a Associação Ibero-Americana de Ministérios Públicos, uma rede de promotores.
A ideia é que o depoimento ocorra “o quanto antes”, disse uma fonte do caso. Se for concretizado esse mecanismo da rede de promotores, também se buscará realizar a extração de dados do celular de Yañez diretamente na Espanha.
Essa é uma forma de começar a controlar as provas e ter acesso completo a esses registros. A promotoria espera que, nesta semana, sejam realizadas novas medidas de prova, além dos novos testemunhas que a advogada Gallego disse que apresentará para apoiar a denúncia de sua cliente.
Fontes próximas à acusação afirmaram que não possuem o telefone em si — Yañez afirmou ter perdido o aparelho —, mas que os mensagens do WhatsApp estão disponíveis na "nuvem". No entanto, o promotor busca acessar essa informação para conhecer a evidência completa, com os metadados de cada imagem, e não apenas capturas de tela, como foram vistas até agora nos mensagens enviados ao chat de María Cantero, a ex-secretária de Alberto Fernández.
As provas apresentadas pela acusação também incluem capturas de tela com novos diálogos entre Yañez e Fernández, onde o ex-presidente tenta conter o escândalo propondo que sua ex-mulher assine um comunicado conjunto negando qualquer agressão.
Yañez apresentou na sexta-feira à Justiça um novo vídeo dela com um hematoma no olho direito. Trata-se de uma gravação em close de seu rosto, onde ela aparece aplicando uma esfera refrigerante ao redor do olho, normalmente usada para descongestionar e reduzir inchaços.
Este novo vídeo, acompanhado por uma foto semelhante, foi apresentado pela ex-primeira-dama junto com um documento na promotoria. Fontes próximas à ex-primeira-dama disseram ao jornal LA NACIÓN que este vídeo seria do dia 21 de junho de 2021.
Outra foto, que está no processo há mais de um mês, mostra um hematoma semelhante, mas maior, no mesmo olho. Essa foto é uma imagem que Yañez enviou a María Cantero, a histórica secretária privada de Fernández, no dia 13 de agosto de 2021. Na mesma data, Yañez enviou outra foto mostrando um hematoma em um braço e capturas de um suposto diálogo via chat com Fernández, onde Yañez o recriminava por ataques reiterados.
Cantero depôs ontem nos tribunais de Comodoro Py e confirmou que a ex-primeira-dama lhe enviou todas essas imagens em 2021, no contexto de uma série de mensagens nas quais Yañez revelou que Fernández a agredia. Isso é importante porque confirma que recebeu essas mensagens em capturas de tela.
Segundo fontes informadas sobre o depoimento de ontem, Cantero disse que ficou “muito surpresa” quando Yañez contou o que estava passando.
Os chats que Yañez enviou a Cantero em 2021 foram encontrados pelo juiz Julián Ercolini enquanto revisava o conteúdo das comunicações da ex-secretária de Fernández no âmbito de outro caso, o processo por corrupção suposta com seguros de entidades públicas, um inquérito no qual Cantero está indiciada, acusada de ter feito gestões ilícitas para seu marido, o corretor Héctor Martínez Sosa.
Como os chats de Yañez não estavam relacionados ao objeto daquela investigação, mas poderiam indicar outro possível delito, Ercolini os separou e entrou em contato com a ex-primeira-dama para perguntar se ela queria iniciar um processo penal para investigar essas supostas lesões. Ela inicialmente disse que não, mas depois mudou de opinião: denunciou o ex-presidente e o acusou de lesões graves com agravantes e ameaças coativas.