Izquierdo: "5 minutos é o tempo máximo que o cérebro aguenta sem oxigenação", diz cardiologista
Presidente da Sociedade Brasileira de Arritmias Cardíacas (Sobrac), Alexsandro Fagundes explica o que é a alteração nos batimentos sofrida pelo jogador durante partida
Na última quinta-feira, durante partida em São Paulo, o jogador do Nacional do Uruguai Juan Manuel Izquierdo, de 27 anos, passou mal em campo devido a uma arritmia cardíaca.
Ao chegar no Hospital Albert Einstein, o atleta estava sofrendo uma parada cardiorrespiratória e precisou ser reanimado. No último boletim, o hospital disse que exames realizados no domingo revelaram “progressão do comprometimento cerebral e aumento da pressão intracraniana”. O jogador segue internado.
Ao Globo, o cardiologista Alexsandro Fagundes, presidente da Sociedade Brasileira de Arritmias Cardíacas (Sobrac), explicou o que é o diagnóstico e quando ele pode levar a casos graves, como a parada cardíaca.
O médico disse ainda que, após cerca de cinco minutos sem oxigenação, o risco de sequelas neurológicas irreversíveis é alto, por isso a importância do rápido atendimento.
— Arritmias são alterações do ritmo cardíaco que podem ser graves ou não. Precisamos entender se ela deixou a frequência irregular, se acelerou os batimentos, se desacelerou, cada caso tem uma conotação diferente. E o que depende também é a causa subjacente, o mecanismo que levou àquela alteração do ritmo — diz o especialista.
O presidente da Sobrac explica que casos como o de Izquierdo, em que a arritmia evolui rapidamente para uma parada cardíaca, fazem parte dos considerados graves e potencialmente fatais, que demandam uma resposta rápida para salvar a vida do paciente:
— Geralmente a taquicardia ou fibrilação ventricular é o quadro mais comum que leva à parada cardíaca. Ela faz com que a frequência do coração fique inaceitável, acima de 200, 300 batimentos por minuto, o que leva a musculatura do órgão a parar de contrair. Com isso, o coração deixa de mandar sangue para o organismo, e o primeiro efeito é que a pessoa perde a consciência. Nesse caso o atendimento precisa ser urgente para não levar o paciente à morte.
Ele diz que a única maneira de salvar esse paciente é reconhecer o quadro e iniciar imediatamente as manobras de ressuscitação cardiopulmonar, que realizam uma compressão no tórax da vítima para manter o fluxo sanguíneo até o socorro chegar com um desfibrilador – aparelho que produz um choque elétrico no coração para restabelecer o ritmo cardíaco.
— Se não houver o socorro imediato e o desfibrilador, a chance de sobrevivência chega a menos de 15%. Quatro, cinco minutos são o máximo de tempo que o tecido cerebral aguenta ficar sem a oxigenação. Depois disso, a sequela pode ser irreversível. E até colocar na ambulância, levar para o hospital, não leva menos de 20 minutos, por isso é importante ter uma estrutura pronta — diz.
Ele lembra o caso de Christian Eriksen, jogador dinamarquês que sofreu uma parada cardíaca em campo durante um jogo da Eurocopa, em 2021. Ele foi reanimado ainda no estádio, e a equipe médica da partida foi posteriormente premiada pela União das Associações Europeias de Futebol (Uefa) pelo rápido socorro. Em junho, três anos depois, Eriksen voltou às partidas.
No caso de Izquierdo, segundo as informações divulgadas até agora, a parada cardíaca teria iniciado quando o atleta já estava a caminho do hospital.
— Não sabemos exatamente como foi na ambulância. E se o socorro demora um pouco mais no desfibrilador, mas a compressão está adequada, pode ser que a pessoa fique sem sequelas mesmo que o choque dure mais de 5 minutos. Só que a partir do momento em que o tempo vai passando, a expectativa de recuperação sem sequelas se torna muito baixa — avalia Fagundes.
O médico esclarece ainda por que o cérebro é o primeiro afetado no caso de uma parada cardíaca:
— Todas as células do nosso corpo estão vivas às custas de combustível. Os tecidos cerebrais, ou seja, os neurônios, utilizam basicamente oxigênio e glicose. E isso vem pelo sangue transportado pelas artérias, que circula graças ao trabalho cardíaco do coração. Se ele para, tem alguns tecidos que aguentam horas sem oxigenação, mas o cérebro é o tecido mais nobre que temos, e qualquer redução nesse combustível em minutos já faz uma diferença muito grande.
O cardiologista conta que, embora pessoas que tenham um histórico de doença cardíaca tenham maior predisposição, a maioria dos casos de uma parada súbita são em indivíduos que eram considerados saudáveis, muitas vezes por não saberem estar com uma saúde cardiovascular debilitada ou possuir uma doença genética.
— Em relação às causas, na maioria das vezes detectamos obstruções nas artérias coronárias do paciente que estavam prestes a levar a um infarto. Mas abaixo dos 35 anos, em que isso é menos provável, geralmente as causas são doenças geneticamente adquiridas ou hereditárias. Mas existe um percentual de 10% a 20% que você classifica como arritmia idiopática, que ela não teve uma causa específica identificada.
Nesta segunda-feira, o Secretário Nacional de Esportes do Uruguai, Sebastián Bauzá, disse à rádio uruguaia Carve Deportiva que Izquierdo já tinha apresentado uma "leve arritmia" em testes médicos realizados por um programa do governo há 10 anos: — Ele passou por um eletrocardiograma. Juan tinha 17 anos, tinha uma pequena arritmia e foi informado.
Segundo o último boletim do Einstein, o atleta segue internado na unidade de terapia intensiva (UTI) sob cuidados intensivos neurológicos e dependente de ventilação mecânica.