EUA, França, Alemanha e Reino Unido anunciam sanções contra o Irã por vendas de armas à Rússia
Novos armamentos devem ajudar Moscou a intensificar seus esforços para destruir a infraestrutura civil do território ucraniano
O secretário de Estado americano, Antony Blinken, afirmou nesta terça-feira, durante uma visita ao Reino Unido, que o Irã forneceu mísseis à Rússia para serem usados “nas próximas semanas” na Ucrânia.
Ele anunciou novas sanções dos Estados Unidos contra o governo de Teerã — medida também adotada pela França, Alemanha e Reino Unido. Blinken explicou que as novas sanções serão impostas especialmente contra a companhia aérea nacional Iran Air.
O diplomata americano afirmou que a república islâmica seguiu em frente, apesar dos avisos de Washington, e que dezenas de soldados russos treinaram no Irã utilizando o míssil Fath-360, que tem um alcance de 120 km.
— Tínhamos alertado o Irã em privado que tomar esta medida constituiria uma escalada dramática — disse Blinken em entrevista coletiva ao lado do ministro das Relações Exteriores britânico, David Lammy.
— O novo presidente do Irã afirmou repetidamente que quer restabelecer o diálogo com a Europa. Quer que as sanções sejam reduzidas. Ações desestabilizadoras como estas terão o efeito oposto.
Na segunda-feira, a União Europeia (UE) garantiu que os aliados ocidentais tinham “informações” sobre o fornecimento de mísseis balísticos iranianos à Rússia. No mesmo dia, o Irã rejeitou as acusações, enquanto Moscou não confirmou e nem negou as informações, indicando apenas que a administração russa mantém relações com o governo iraniano “em diferentes setores”.
O porta-voz da diplomacia europeia, Peter Stano, disse que “a posição unânime dos líderes europeus sempre foi clara”, e que a UE “responderá rapidamente, inclusive tomando novas medidas restritivas significativas contra o Irã”.
Na semana passada, autoridades dos Estados Unidos e da Europa confirmaram ao Wall Street Journal que, após meses de alertas sobre sanções, o Irã enviou “vários mísseis balísticos” de curto alcance para a Rússia.
Segundo especialistas, se confirmado, é esperado que os novos armamentos ajudem Moscou a intensificar seus esforços para destruir a infraestrutura civil da Ucrânia — um esforço que, de acordo com o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, atualmente envolve cerca de 4 mil bombas por mês em todo o país.
Guerra: Ataque com mais de 140 drones ucranianos mata uma pessoa e força o fechamento de aeroportos em Moscou
Lammy afirmou que ele e Blinken viajarão juntos nesta semana para a Ucrânia. O americano chegou a Londres na segunda-feira para se encontrar com o ministro britânico e com o primeiro-ministro do Reino Unido, Keir Starmer, para compartilhar a determinação de ambos os países em ajudar a Ucrânia e resolver as diferenças sobre a guerra em Gaza.
A visita do secretário de Estado precede a de Starmer à Casa Branca na sexta-feira, no que foi a segunda viagem do premier trabalhista a Washington desde que chegou ao poder, em julho.
Historicamente, considera-se que os democratas sempre estiveram mais próximos dos trabalhistas britânicos do que dos conservadores. Mas para Keir Starmer, um alinhamento total com os democratas poderia ser arriscado dois meses antes das eleições americanas, caso o partido de Blinken seja derrotado nas eleições.
A vice-presidente dos Estados Unidos, Kamala Harris, deu aos democratas uma maior esperança de vitória após sua entrada tardia na campanha, e pesquisas mostram uma disputa acirrada entre ela e o ex-presidente Donald Trump.
Irã nega envolvimento
Em declaração divulgada na sexta-feira pela missão permanente do Irã nas Nações Unidas, Teerã já havia negado o envolvimento. Em comunicado, a representação iraniana afirmou que o país “considera o fornecimento de assistência militar às partes envolvidas no conflito — que leva ao aumento de baixas humanas, destruição de infraestrutura e distanciamento das negociações de cessar-fogo — como desumano”.
A nota acrescentou que o governo iraniano “não apenas se abstém de se envolver em tais ações, mas também exorta outros países a cessarem o fornecimento de armas” para ambos os lados da guerra.
O Grupo dos 7 (que reúne Japão, Estados Unidos, Itália, França, Alemanha, Canadá e Reino Unido) advertiu em março que aplicaria sanções coordenadas ao Irã caso a transferência de mísseis fosse realizada. O aviso foi repetido numa cúpula da Otan, a aliança militar do ocidente, em julho.
No sábado, Sean Savett, porta-voz do Conselho de Segurança Nacional dos EUA, recusou-se a confirmar o envio de mísseis, mas sugeriu uma crescente cooperação entre Teerã e Moscou.
— Estamos alertando sobre a crescente parceria de segurança entre a Rússia e o Irã desde o início da invasão em grande escala da Ucrânia, e estamos alarmados com esses relatos — disse.
— Qualquer transferência de mísseis balísticos iranianos para a Rússia representaria uma escalada dramática no apoio do Irã à guerra da Rússia contra a Ucrânia e levaria à morte de mais civis ucranianos.
Essa parceria ameaça a segurança europeia e ilustra como a influência desestabilizadora do Irã vai além do Oriente Médio e alcança o mundo todo.
Diplomacia elaborada
Apesar das ameaças e das relações tensas entre Washington e Teerã, o presidente dos EUA, Joe Biden, tem vários motivos para agir com cautela. Um deles é que o governo democrata vem realizando uma diplomacia elaborada com o Irã há meses, buscando evitar que a guerra na Faixa de Gaza se transforme num conflito regional.
Por meio de intermediários, oficiais da Casa Branca têm exortado Teerã a não lançar ataques militares contra Israel ou ordenar uma ofensiva em larga escala por meio de seu aliado no Líbano, o grupo xiita Hezbollah.
O Irã e a Rússia, países aliados, aceleraram a sua aproximação nos setores econômico, energético e militar desde o início da guerra na Ucrânia, em fevereiro de 2022, e da imposição de sanções ocidentais contra Moscou.
O fornecimento de mísseis iranianos para a Rússia poderia levar Biden a aprovar mísseis de longo alcance para a Ucrânia, sugeriram autoridades no sábado. No entanto, o funcionário europeu afirmou ao The Times que Biden tem sido cauteloso em pressionar seu homólogo russo, Vladimir Putin, com medo de uma escalada da guerra e de um conflito direto com a Otan.
Para Andrew Weiss, especialista em Rússia no Fundo Carnegie para a Paz Internacional, a “verdadeira questão” é por que o Irã “tomou essa decisão tardia de transferir os mísseis, dado os sinais claros da Europa sobre as sanções que inevitavelmente” serão impostas.
Weiss afirmou que o Irã está especialmente preocupado com a possibilidade de uma ação punitiva por parte da Europa — que não possui tantas sanções contra Teerã como os EUA — em relação a qualquer transferência de mísseis para a Rússia.
Há também uma preocupação entre os funcionários ocidentais de não pressionar demais o novo presidente do Irã, Masoud Pezeshkian, que é visto como um moderado dentro do establishment governante do país.
Eleito em julho, Pezeshkian afirmou que espera melhorar a economia doméstica garantindo alívio das sanções da Europa e dos Estados Unidos. Funcionários ocidentais também esperam que ele ajude nos esforços para restringir o programa de enriquecimento nuclear do Irã.
(Com AFP e New York Times)