Redes Sociais

Bloqueio do X no Brasil alimenta debate sobre o que pode ser dito nas redes sociais

Antigo Twitter deixou de funcionar no dia 31 de agosto por ordem do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes

Apesar da ordem judicial de bloqueio do X em todo o Brasil, emitida pelo desembargador do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, alguns usuários ainda conseguem acessar as páginas da rede social no país - Mauro Pimentel/AFP

Uma decisão drástica, mas necessária, ou apenas censura? A suspensão do X no Brasil levantou o debate sobre os limites da liberdade de expressão nas redes sociais, no momento em que outros países também buscam acabar com aplicativos como o Telegram ou o TikTok.

O antigo Twitter deixou de funcionar no dia 31 de agosto por ordem do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, que acusou a empresa do bilionário Elon Musk de espalhar desinformação e descumprir reiteradamente suas decisões.

O bloqueio afetou 22 milhões de usuários que começaram a migrar para redes menores, como Bluesky e Threads, sob pena de enfrentarem pesadas multas.

"O Brasil claramente aderiu ao debate global sobre as redes sociais e a liberdade de expressão", analisou Carl Tobias, professor de Direito da Universidade de Richmond, nos Estados Unidos.

Para ele, a disputa entre Musk e a Justiça brasileira "reflete preocupações similares sobre qual é a melhor forma de regular" estas plataformas, uma questão que também está sendo debatida nos EUA e na Europa.

Na França, o fundador do Telegram, Pavel Durov, foi indiciado no final de agosto por publicar conteúdo ilegal em seu aplicativo, enquanto o TikTok enfrenta acusações na Justiça americana de violar a privacidade de seus usuários menores de idade.

Depois de bloqueado no Brasil, o X poderá enfrentar um destino semelhante na União Europeia, que avalia multas milionárias e até a suspensão temporária do serviço por possíveis violações de uma nova lei que busca acabar com as brechas legais na internet.

Musk, um "problema global"
Para Tobias, o "equilíbrio" entre o combate à desinformação e ao discurso de ódio está no centro do debate, bem como o respeito pela liberdade de expressão, em meio a um contexto no qual as plataformas digitais possuem um grande impacto na sociedade.

Além de fazer campanha para o republicano Donald Trump nos Estados Unidos, Musk interfere no debate político de outros países e dá seu apoio à direita e à extrema direita no Reino Unido ou no Brasil.

"Elon Musk é um problema global", afirma Afonso de Albuquerque, para quem também trata-se "da soberania dos Estados frente ao poder dos bilionários".

O magnata "comprou o Twitter e transformou no X por conta de um projeto político, [que] tem a ver com [sua] inserção dentro de um circuito da extrema direita", declarou o professor de Comunicação da Universidade Federal Fluminense.

No âmbito do combate à desinformação, Moraes acusou o X de desrespeitar as ordens judiciais de bloquear contas de figuras influentes dos movimentos conservadores ligadas ao ex-presidente Jair Bolsonaro.

"Assassinar a democracia"
Sua decisão foi aplaudida pela esquerda liderada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e criticada pela oposição de direita.

"Ele pensa que é o quê?", questionou Lula em alusão a Musk em uma entrevista à Rádio MaisPB, no dia 30 de agosto.

Afirmou ainda que a democracia "não é o direito de mentir, espalhar o ódio e atentar contra a vontade do povo", declarou o mandatário em pronunciamento nacional no dia 6 de setembro.

Para o deputado Elvino Bohn Gass, do Partido dos Trabalhadores de Lula, Musk quer "colonizar digitalmente o Brasil".

Em direção contrária, milhares de bolsonaristas protestaram contra Moraes no último sábado, em uma manifestação em São Paulo, para defender a "liberdade" e seu líder chamou o ministro de "ditador".

Aliados de Bolsonaro desafiaram a proibição e continuaram a publicar no X, como seu filho Eduardo, deputado federal, que acusou o ministro do STF de "assassinar a democracia".

Motivação política? 
Diante desta controvérsia, a população, além de dividida, não vê apenas uma questão judicial.

A maioria dos brasileiros (56,5%) enxerga uma "motivação política" na decisão de Moraes e estima que as ações do STF contra o X "enfraqueceram a democracia" (54,4%), segundo pesquisa da AtlasIntel entre mais de 1.600 entrevistados. Contudo, quase metade (49,7%) concorda com Moraes em relação a Musk.

O debate também repercute fora do Brasil.

Embora tenha julgado o bloqueio como "lamentável", por afetar o trabalho dos jornalistas, a organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF) considerou a decisão "justificada" devido às negativas da rede em responder aos pedidos das autoridades.

Em contrapartida, o jornal liberal The Economist declarou que a Justiça brasileira foi longe demais ao restringir a liberdade de expressão, em um contexto no qual as "democracias ricas" recorrem cada vez mais às "tesouras da censura".