Projeto que anistia envolvidos no 8/1 será votado na CCJ da Câmara depois das eleições
Por acordo, PEC que limita as decisões monocráticas de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e em outros tribunais superiores será debatida
A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara adiou a votação do projeto que concede anistia a envolvidos nos atos antidemocráticos de 8 janeiro. Por um acordo, o tema só será votado após as eleições municipais, que serão em outubro.
O combinado entre governistas e opositores estabeleceu que, já que o PL da Anistia não será votado, o colegiado iniciará nesta os debates sobre uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limita as decisões monocráticas de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e em outros tribunais superiores.
O adiamento para outubro foi considerado uma vitória dos governistas, que ingressaram com três requerimentos extra-pauta nesta terça para postergar a análise do texto.
Os governistas também se valeram de acordos que permitiram que uma ala de parlamentares do União Brasil fosse retirada da CCJ durante a sessão.
A atuação do União foi lida como um gesto ao governo, uma vez que o partido tenta angariar apoio do Planalto ao deputado Elmar Nascimento (BA) à sucessão de Arthur Lira (PP-AL) na presidência da Câmara.
Ontem à noite, Elmar se reuniu com os ministros Alexandre Padilha (Relações Institucionais), Celso Sabino (Turismo) e Juscelino Filho (Comunicações). Nesta quarta, ele se encontra com Lula.
Não foi a única movimentação que teve a eleição da Casa como pano de fundo. O PP, presidido por Ciro Nogueira, um dos principais fiadores da candidatura de Hugo Motta (Republicanos-PB) trocou de última hora três deputados que integram a CCJ, para agradar ao PL, que tem a maior bancada da Câmara, cujo apoio é considerado essencial para vencer a disputa.
Em ato realizado na Avenida Paulista no sábado, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) defendeu a anistia
Discussões e manobras
Marcada por discussões e trocas de acusações entre os deputados, a sessão foi finalizada pelo início da Ordem do Dia no plenário da Câmara. Como não foi necessário que houvesse pedido de vista do projeto para adiar a análise, a expectativa é de que governistas lancem mão deste recurso na sessão de hoje, o que adiaria a votação para depois das eleições municipais.
A oposição levou à sessão familiares de Cleriston Pereira da Cunha, réu pelo 8 de janeiro que morreu no Complexo da Papuda.
Com cartazes, parentes de presos pediam liberdade. Em um dos bate-bocas, a presidente da CCJ, a bolsonarista Caroline de Toni (PL-SC), disse que “a população quer a anistia”. A postura gerou revolta dos governistas, que contestaram a isenção da deputada para presidir a sessão.
A projeto sustenta que os invasores das sedes dos três Poderes “agiram sob um ‘efeito manada’, por não saber se expressar”.
O relator Rodrigo Valadares (União-SE) alega que a aprovação é importante para “garantir alívio institucional” e a “pacificação política”.
Caso a proposta seja aprovada, ficam anistiados “todos os que participaram de manifestações” a partir do 8 de janeiro “com motivação política e/ou eleitoral”, bem como os financiadores e apoiadores.
O texto também prevê perdão para todos os que participaram de bloqueios de estradas e acampamentos em frente a quartéis entre 30 de outubro de 2022 e a data da promulgação da lei. projeto que tramita na Câmara poderia beneficiar o ex-presidente Jair Bolsonaro, no caso de eventuais implicações do 8 de janeiro de 2023 que o atinjam.
Essa é a avaliação de especialistas em Direito Constitucional ouvidos pelo Globo. Wallace Corbo, professor da FGV Direito-Rio, entende que a amplitude da anistia que está em discussão no texto poderia acabar ajudando Bolsonaro:
— Pela amplitude poderia ser usado, em tese, para beneficiar não só pessoas que participaram diretamente mas indiretamente pelas pessoas que incentivaram, financiaram, o que poderia ser o caso do ex-presidente Jair Bolsonaro.
Também especialista na área, o advogado João Fábio da Fontoura, sócio da área de Direito Constitucional da Bornholdt Advogado, aponta que a medida pode acabar virando um salvo-conduto, tirando o caráter criminal das condutas criminosas cometidas.
— Me parece que a intenção é essa (beneficiar Bolsonaro), como uma espécie de habeas corpus preventivo — aponta.
Para ele, a anistia articulada agora pelo Congresso é maior, por exemplo, do que aquela concedida a militares após a ditadura militar.