VENEZUELA

Prefeito opositor de Maduro é preso na Venezuela, e partido denuncia ato 'injustificado'

Ministério Público fala em 'corrupção' no gabinete de Rafael Ramírez; número de presos políticos desde a onda repressiva pós-eleitoral no país supera 1,7 mil

Apoiadores da oposição venezuelana seguram cartazes com os dizeres - Pierre-Philippe Marcou/AFP

O prefeito de Maracaibo, a segunda maior cidade da Venezuela, foi detido com outras cinco pessoas de sua equipe na noite de terça-feira por agentes de inteligência, sem mandado judicial. A prisão de de 49 anos, do partido Primeiro Justiça (PJ), ocorre num momento em que o número de presos políticos desde a onda repressiva pós-eleitoral no país supera 1,7 mil — e gerou condenações de todos os setores da oposição.

— Detiveram o prefeito Rafael Ramírez e não informaram os motivos — disse o ex-vereador de Maracaibo, Ángel Monagas. — Com sua detenção, abre-se um capítulo perigoso para outros prefeitos. Há outros prefeitos que estão na mira.

Quase 24 horas depois de sua detenção, o Ministério Público da Venezuela informou que havia iniciado uma investigação por crimes de corrupção contra os funcionários da prefeitura de Maracaibo, e que Ramírez e seus colaboradores seriam apresentados ao tribunal. O PJ, partido do prefeito opositor, afirmou na quarta-feira que a prisão era “injustificada”, enquanto o MP disse ter recolhido “elementos e provas suficientes que incriminam os referidos investigados”.

Na semana passada, o chefe de gabinete de Ramírez, Pedro Guanipa, irmão do dirigente da Plataforma Unitária Juan Pablo Guanipa, também foi detido quando se preparava para carimbar seu passaporte para viajar à Colômbia por compromissos familiares. O chefe do Parlamento, Jorge Rodríguez, o acusou de corrupção.

Nesta quarta, a imprensa local informou que agentes do Serviço Bolivariano de Inteligência (Sebin) permaneciam na sede da prefeitura de Maracaibo.

“Desconhecemos detalhes sobre sua condição, assim como as razões que motivaram esse procedimento, violador dos nossos princípios consagrados na Constituição da República Bolivariana da Venezuela”, afirmou o Primeiro Justiça em comunicado.

A líder da oposição, María Corina Machado, também condenou a prisão em mensagem nas redes sociais. “Denunciamos ao mundo como a onda repressiva do regime se intensifica. Agora contra Rafael Ramírez Colina, prefeito em exercício de Maracaibo, e outros membros de sua equipe de trabalho. Com essa onda de terror, o regime busca dividir o movimento social que se expressou em 28 de julho e que derrotou a tirania.”

Desde janeiro deste ano, pelo menos 20 prefeitos opositores foram presos, perseguidos ou destituídos como parte da repressão do chavismo à dissidência e àqueles que apoiaram a candidatura de Edmundo González Urrutia, indicado por María Corina, para as eleições presidenciais de 28 de julho.

Desses, cinco continuam presos e 10 foram inabilitados. No total, 200 líderes da oposição foram detidos neste ano, incluindo membros de campanha de María Corina e González Urrutia. Com as novas prisões, a crise política gerada pelas eleições presidenciais na Venezuela é agravada.

“Quem tem insistido em buscar soluções dentro do caminho democrático considera que a prisão do prefeito de Maracaibo em nada ajuda a alcançar a paz que o país necessita”, escreveu Manuel Rosales, governador do estado de Zulia, cuja capital é Maracaibo, e ex-candidato presidencial. “Ramírez tem sido um lutador social de conhecida trajetória que atualmente trabalha com sua equipe na recuperação da cidade e, além disso, tem sido um defensor do diálogo, contribuindo para a busca da paz”.

Em julho, o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, teve sua reeleição proclamada — resultado que foi amplamente questionado pela oposição e pela comunidade internacional. Enquanto os órgãos eleitorais do país, controlados pelo chavismo, se recusaram a apresentar as atas de votação que comprovariam a suposta vitória de Maduro, a oposição apresentou o que diz ser grande parte desses documentos, que indicam a vitória do opositor González Urrutia com mais de 30 pontos percentuais.

Na quarta-feira, o Centro Carter, um dos poucos observadores internacionais autorizados pelo governo a acompanhar o pleito, apresentou à Organização dos Estados Americanos (OEA), em Washington, as “atas originais” das eleições na Venezuela que “demonstram” a vitória do opositor sobre Maduro, segundo a instituição. Durante a sessão do conselho permanente, o secretário-geral da OEA, Luis Almagro, denunciou um processo eleitoral que “não foi nem justo, nem livre”.

Zulia tem o maior número de eleitores do país e é um tradicional reduto da oposição. O próprio presidente Nicolás Maduro atacou Rosales, governador de Zulia, por seu apoio a González Urrutia. Ainda assim, Rodríguez, principal operador político do governo, fez esta semana um apelo ao “diálogo político” aos setores que participaram dos últimos pleitos, numa primeira sessão convocada para esta quinta-feira.