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Laboratório interditado após contaminação por HIV teve capacidade técnica questionada

O concorrente também argumentou que os atestados de capacidade técnica apresentados pelo laboratório não haviam sido emitidos por hospitais

Transplante de órgãos - Fotos públicas/Reprodução

O laboratório Patologia Clínica Dr. Saleme, investigado pela contaminação de pelo menos seis pessoas por HIV após receberem órgãos transplantados, teve sua capacidade técnica para produzir exames questionada por uma concorrente durante o processo de licitação que culminou na contratação da empresa pela Fundação Saúde, órgão vinculado à Secretaria estadual de Saúde do Rio.

Segundo o recurso interposto por uma concorrente, o laboratório não conseguiu comprovar que tinha experiência prévia para executar metade dos exames previstos por contrato.

O documento que faz parte do processo de concorrência aponta que o Dr. Saleme só conseguiu comprovar a execução de 581 mil exames por ano — e o edital previa pelo menos 628 mil.

O concorrente também argumentou que os atestados de capacidade técnica apresentados pelo laboratório não haviam sido emitidos por hospitais, mas sim por Unidades de Pronto Atendimento (UPAs), que "não realizam todos os exames exigidos em uma unidade hospitalar".

O Dr. Saleme alegou, em ofício que também faz parte da licitação, que "realiza o objeto do certame há mais de dez anos, já tendo realizado, só em favor da Secretaria municipal de Nova Iguaçu, mais de 2 milhões de exames clínicos e anatomia patológica". A Fundação Saúde entendeu que "a empresa vencedora atendeu as exigências do edital" e homologou o resultado.

O laboratório venceu, em outubro de 2023, um processo de licitação para prestar serviço de análises clínicas em unidades geridas pela Fundação Saúde.

O contrato, inicialmente, tinha o valor de R$ 9.801.008,74, mas teve o valor aumentado, em março deste ano, em R$ 1.679.459,04 para incluir o atendimento a mais duas unidades, os postos de atendimento médico de Cavalcanti e de Coelho Neto.

Os sócios do Patologia Clínica Doutor Saleme são parentes do deputado federal e ex-secretário de Saúde do Rio Luiz Antônio de Souza Teixeira Júnior, o Doutor Luizinho. Matheus Sales Teoxeira Bandoli Vieira, que é sócio-diretor da empresa e assinou contratos com o governo, é primo de Doutor Luizinho. Já Walter Vieira, outro sócio do laboratório, é casado com a tia do político.

Doutor Luizinho foi secretário de janeiro a setembro de 2023. Desde janeiro de 2023, o laboratório recebeu pagamentos que somam mais de R$ 20 milhões do governo do Rio, segundo dados do Portal da Transparência. Em períodos eleitorais, Matheus faz campanha para o primo nas redes sociais.

Entenda o caso
Seis pessoas testaram positivo para HIV após receberem órgãos transplantados no Estado do Rio. A informação foi divulgada pela Bandnews nesta sexta-feira e confirmada pela Secretaria de Estado de Saúde (SES) ao Globo.

O laboratório privado PCS Lab Saleme, contratado por licitação pela Fundação Saúde para atender o programa de transplantes, passou por uma fiscalização da Anvisa e foi interditado, após serem encontradas inúmeras irregularidades. Com isso, os exames passaram a ser realizados pelo Hemorio. O Ministério Público do Estado do Rio (MPRJ) investiga o caso.

Em nota, o laboratório PCS Lab informou que abriu uma sindicância interna para apurar as responsabilidades do caso. O laboratório afirmou que comunicou à Central Estadual de Transplantes os resultados de todos os exames de HIV realizados em amostras de sangue de doadores de órgãos entre 1º de dezembro de 2023 e 12 de setembro de 2024, período em que prestou serviços à Fundação de Saúde do Governo do Estado.

E que nesses procedimentos foram utilizados os kits de diagnóstico recomendados pelo Ministério da Saúde e pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A empresa disse ainda que dará suporte médico e psicológico aos pacientes infectados com HIV e seus familiares; e reiterou que está à disposição das autoridades policiais, sanitárias e de classe que investigam o caso.