LUTO

Morre Ron Ely, o último Tarzan da televisão, aos 86 anos

Ator interpretou versão atualizada do personagem, que considerou por muito tempo uma maldição: "Fiquei tão associado ao papel que tive que ir para a Europa para conseguir trabalho"

Ron Ely como Tarzan - Reprodução

Ron Ely, o veterano ator de televisão mais conhecido por seu papel como um educado e urbano “Tarzan” nos anos 1960, morreu, aos 86 anos. A morte foi no dia 29 de setembro, na casa de uma de suas filhas, Kirsten Ely, perto de Santa Bárbara, Califórnia, mas só foi revelada pela família nesta quarta-feira.

O ator alto e musculoso, nascido no Texas, fez seu nome no início dos anos 1960 como um coadjuvante confiável em programas de TV como as comédias “Father Knows Best”, “How to Marry a Millionaire” e “The Many Loves of Dobie Gillis” antes de conseguir o papel principal em “Tarzan” em 1966.

O programa teve 57 episódios exibidos na NBC em duas temporadas, com um Tarzan atualizado para o público da época. No Os grunhidos semiverbais das versões anteriores foram abandonados e, nesta versão, Tarzan deixou a selva e aprendeu os costumes da civilização moderna antes de decidir retornar ao conforto de seu antigo lar. Jane, o par romântico tradicional de Tarzan, também não aprecia no programa, embora a macaca Chita estivesse lá.

Ossos quebrados

Ely realizava quase todas as acrobacias do personagem, o que o rendeu duas fraturas nos ombros, um músculo das costas rompido e duas mordidas de leão. “Tive tantas distensões e rupturas musculares e quebrei ombros, pulsos e ossos”, disse ele numa entrevista com Alan Mercer, em 2013. “Me machuquei em todas as partes do corpo. A conta hoje chegou, preciso levantar da cama em etapas.”

Mesmo assim, “Tarzan” tornou Ely famoso – famoso até demais, diria ele anos depois. “Esse personagem é uma armadilha, ninguém sai vivo”, disse ele ao The Fresno Bee em 2014. “Fiquei tão associado ao papel que tive que ir para a Europa para conseguir trabalho”.

Ely voltou aos Estados Unidos em 1975 para interpretar outro herói popular no filme “Doc Savage: The Man of Bronze”. Na televisão, fez ainda participações especiais numa longa lista de programas entre os anos 1970 e 1990, incluindo “The Love Boat”, “Marcus Welby, M.D.”, “Fantasy Island” e “Hawkeye”. E interpretou Mike Nelson, o papel originalmente desempenhado por Lloyd Bridges, numa recriação de “Sea Hunt” no final dos anos 1980.

Ely apresentou o concurso Miss América em 1980 e 1981 e se interessou por game shows, apresentando “Face the Music” por duas temporadas, começando em 1980. Fez uma pausa na atuação na década de 1990 para criar seus três filhos, Kirsten, Kaitland e Cameron. Ele também escreveu dois romances policiais, “Night Shadows” (1994) e “East Beach” (1995).

Depois que seus filhos cresceram, voltou às telas em 2014 com um papel no filme para televisão “Expecting Amish”, sobre uma jovem Amish cuja vida muda quando ela visita Hollywood.

Tragédia Familiar

“Saí da atuação para criar uma família e poder passar mais tempo com eles aqui em Santa Bárbara”, disse Ely ao Fresno Bee em 2014. “Agora, todas as crianças passaram pela faculdade. Aí minha família me perguntou: ‘Por que você está aqui?’”

Em outubro de 2019, a esposa dele, Valerie Lundeen Ely, foi encontrada morta a facadas em sua casa em Santa Bárbara. Policiais responderam a um chamado de “distúrbio familiar” e, ao chegarem, atiraram e mataram Cameron. Ele teria matado a mãe e “representava uma ameaça”, segundo a a polícia.

Um ano depois, Ron Ely e sua família entraram com uma ação por homicídio culposo contra o gabinete do xerife de Santa Bárbara, alegando que Cameron estava desarmado e que os policiais atiraram nele sem avisar.

“O tiroteio ocorreu menos de 20 segundos depois que os policiais acusados viram o falecido Cameron aparecer com as mãos para cima, o ato universal de rendição”, disse o processo.

De acordo com o gabinete do xerife, Cameron teria dito aos policiais que tinha uma arma enquanto continuava caminhando em direção a eles, apesar dos avisos para parar. Um júri decidiu em 2022 que os policiais agiram em legítima defesa.

Paixão pela Califórnia

Ronald Pierce Ely nasceu em 2 de junho de 1938, em Amarillo, Texas. Seu pai, Vernon, era fazendeiro e xerife voluntário, e sua mãe, Sybil, era digitadora e gravadora do governo local. No ensino médio, Ron gravitou em torno de aulas de oratória e atuação e ganhou um concurso estadual de leitura de poesia, que lhe rendeu uma bolsa de estudos para a Universidade do Texas, em Austin.

Ele considerou estudar engenharia de petróleo, mas sua curiosidade em atuar o atraiu para Hollywood. Perto do final do primeiro ano, ele e um amigo foram de carro para a Califórnia. Ele nunca voltou. “Foi em abril, com todas as flores fazendo o ar cheirar a perfume”, disse a Alan Mercer. “Quando isso me atingiu, eu fui conquistado.”

Ele assinou um contrato com a 20th Century Fox e logo conseguiu um pequeno papel na versão cinematográfica de 1958 do musical “South Pacific”. Isso levou a papéis cada vez maiores, incluindo o interesse amoroso de Jill St. John em “The Remarkable Mr. Pennypacker” (1959).

Mas ele sempre voltava ao trabalho na TV, que considerava estável e mais interessante. Seus papéis variaram muito, embora ele fosse mais conhecido por programas de ação e aventura, incluindo o papel principal em “The Aquanauts”, sobre uma equipe de mergulhadores, exibido na CBS na temporada 1960-1961.

Seu primeiro casamento, com Helen Jane Triplett, sua namorada do ensino médio, terminou em divórcio. Ele se casou com Lundeen em 1984. Além de sua filha Kirsten, ele deixa sua outra filha, Kaitland Sweet, e dois netos.

Um homem profundamente reservado, Ely manteve distância dos fãs de “Tarzan”, mesmo décadas depois. Mas acabou aceitando a admiração deles e até apareceu na Comic-Con em 2012, para marcar os 100 anos desde que Edgar Rice Burroughs publicou o romance original “Tarzan of the Apes”.

“Percebi que havia pessoas que me conectavam tão totalmente com o personagem que, se eu o rejeitasse, significaria abandoná-los”, disse ao NJ.com naquele ano. “Eu finalmente aceitei isso. Mudei de ideia.”