RIO DE JANEIRO

Medo de morrer, crise de ansiedade e choro: reação de quem viveu o pânico no tiroteio na Av. Brasil

Homem de 60 anos morreu após ser baleado na cabeça, outras cinco pessoas ficaram feridas

Passageiros tentam se proteger em meio ao tiroteio na manhã desta quinta (24) na Av. Brasil, no Rio de Janeiro - X/reprodução

A movimentada Avenida Brasil, por onde passam milhares de cariocas todos os dias, foi fechada na manhã desta quinta-feira devido um intenso tiroteio na Cidade Alta, Zona Norte do Rio, entre a Polícia Militar e criminosos. Um homem de 60 anos morreu após ser baleado na cabeça, e outros cinco ficaram feridos. O clima de tensão na região afetou moradores, estudantes e trabalhadores que por ali passam todos os dias.

Carlos Miranda, de 45 anos, é produtor e estava de folga do trabalho nesta quinta-feira. Ele contou ao Globo, enquanto estava em um ponto de ônibus, que ficou 55 minutos parado no trânsito por conta do tiroteio e sofreu uma crise de ansiedade.

— Estou de folga hoje, estava tentando ir para casa, moro em Vigário Geral. Estava no ônibus saindo de Campo Grande, sentido Parada de Lucas, e tive que descer no meio do caminho. Antes disso, fiquei parado 55 minutos. Minha família estava muito preocupada, pediu para eu sair de onde estava e voltar, desistir de ir para casa. Fiquei muito impactado com o que aconteceu, tive uma crise de ansiedade quando descobri. Estou muito impactado com a violência do Rio de Janeiro, cada dia pior — falou.

Três dos baleados foram levados para o Hospital Municipal Dr. Moacyr Rodrigues do Carmo, em Duque de Caxias, onde a vítima chegou sem vida. Outros três atingidos por tiros foram socorridos e encaminhados para o Hospital Federal de Bonsucesso, incluindo um homem de 48 anos, também ferido na cabeça.

Sérgio Nascimento, 49 anos, trabalha na bilheteria da estação do BRT de Vigário Geral. O serviço foi paralisado por causa dos tiro e voltou a ser normalizado, segundo a Mobi-Rio, às 9h15. Ele relata que no momento do tiroteio, o clima no ponto era de “caos”.

— Foi tenso, todo mundo correndo para lá e para cá, tentando se abrigar, era tiro vindo de tudo quanto era lado. Você não tinha o que fazer, não sabia como se abrigar, como ajudar. Eu estava na cabine já. Me abaixei, tentei fugir do tiro. Durou cerca de duas horas. Ficaram várias linhas paradas, só voltou a funcionar por volta de 9h30 — disse ao Globo.

Os agentes realizavam uma operação no Complexo de Israel, com objetivo de prender criminosos envolvidos no roubo de carros e cargas na região. A Polícia Militar retirou suas tropas do local. Equipes do 16º BPM (Olaria), do 3º BPM (Méier) e do 4º BPM (São Cristóvão) estavam no conjunto de favelas numa operação para coibir roubos de veículos e de cargas. A informação é do Bom Dia Rio, da TV Globo.

Um dos feridos no tiroteio entre PMs e traficantes no Rio de Janeiro. Pessoa estava em ônibus - Foto: X/reprodução

O passageiro Renato Oliveira, de 48 anos, que estava no ônibus 493 (Central x Ponto Chic), da empresa Tinguá, foi baleado na cabeça e levado para o Hospital Federal de Bonsucesso. Fontes confirmaram que ele teve morte cerebral confirmada no fim desta manhã.

Grávida estava no confronto
Mariana Lopes Andrade, de 24 anos, é estudante de enfermagem da UFRJ e está grávida de sete meses. Ela estava em um ônibus da linha 388 (Cesarão x Candelária) quando o confronto entre os policiais e criminosos iniciou.

A jovem teve que descer e atravessar a pista até chegar em um ponto de ônibus na Fazenda Botafogo para pedir um carro de aplicativo até a faculdade.

— Estava a caminho da faculdade quando tudo parou. Tive que descer no meio da Avenida Brasil e vir para o ponto de ônibus porque não andava. Não sabia o que era, não ouvi os tiros, nada, só descobri depois o motivo. Agora “tô” aqui esperando um uber para ver se chego a tempo de pegar alguma aula ainda, mas já perdi as primeiras do dia — contou ao Globo.

Susto a caminho do trabalho
O confronto impactou na rotina de quem costuma usar a via para chegar ao trabalho. Valfredo Santos Araújo, 55, é morador da Praça Dois, em Vigário Geral. Ele trabalha como conferente em uma empresa de automóveis e estava no trajeto para o serviço quando tudo aconteceu

— Fiz o meu dia a dia normal. Sai de casa, peguei uma van e desci na esquina da Brasil. Quando saltei já me deparei com a avenida toda parada, que é normal, mas comecei a ouvir tiros. Isso me fez voltar na hora para casa, fiquei assustado com a situação porque estava muito alto. Parecia que era do meu lado. Geralmente tenho que chegar às 8h no trabalho, e só estou chegando agora, 10h20. O patrão entende o nosso lado — falou.

O mesmo aconteceu com Anderson Sousa, 32. Ele é de Nova Iguaçu e trabalha em Vigario Geral, como repositor. Ele estava atrasado em mais de duas horas para seu expediente.

— Sai de casa às 5h30 para pegar às 8h. Cheguei agora só, são 10h. Tive que descer na Linha Vermelha para vir andando até aqui, demorei mais de 20 minutos. Vou chegar no trabalho cansado e estressado já. Precisei atravessar a pista e tudo, mas não ouvi e nem vi nada.

Mãe tranquiliza filha
Um vídeo compartilhado em redes sociais mostram momentos de angústia vividos por mãe e filha, na manhã desta quinta-feira, quando o ônibus em que elas estavam passava pela Avenida Brasil. As imagens mostram as duas deitadas no chão do coletivo. A menina, muito nervosa, chora. A mãe tenta consolá-la: "Em nome de Jesus, se acalma".

É possível ouvir os barulhos de tiros, disparados durante uma operação da Polícia Militar no conjunto de favelas. "Calma, respira", continua a mulher, que se posiciona de maneira protetora. Atrás delas é possível ver outros passageiros também deitados no chão.

Passageiros em pânico
Victoria Dantas, moradora de Guadalupe, Zona Norte do Rio, estava a caminho do trabalho e gravou um vídeo dentro do BRT, capturando os momentos de desespero e tensão vividos pelos passageiros. Ela conta que entrou no BRT ainda na estação de Guadalupe, já observando a superlotação.

— A estação estava muito cheia lá em Guadalupe. Eu entrei e tinha um pessoal comentando dentro do ônibus que tava tudo fechado, que tava tendo tiroteio na Cidade Alta. Mas tem gente que às vezes fala besteira e não é nada — relatou.

Ao avançar pelo trajeto, Victoria percebeu que a situação era mais grave do que imaginava.

— Quando a gente saiu de Vigário Geral para chegar na Cidade Alta, já comecei a ouvir o tiroteio. Nisso, todo mundo já baixou dentro do ônibus — descreve. Segundo ela, o motorista parou o BRT no meio da pista, sem condições de avançar ou sair do veículo, e informou aos passageiros que teriam que esperar.

— Ele falou que ia ter que esperar o tiroteio acalmar. Todo mundo deitou no chão e ficou lá. A gente ficou mais ou menos uns 40 minutos assim — relembra.