BRASIL

A cada R$ 1 de incentivo à energia renovável, país dá R$ 4,52 a combustíveis fósseis

Levantamento do Inesc indica que 81,9% dos benefícios governamentais vão para petróleo e gás natural

Dinheiro - Marcello Casal Jr. /Agência Brasil

O Brasil ainda oferece mais incentivos à indústria de combustíveis fósseis do que às fontes renováveis de energia. Um levantamento feito pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) mostra que a cada R$ 1 em incentivos dados às energias renováveis no Brasil em 2023, R$ 4,52 foram destinados para a indústria de petróleo e gás.

No ano de 2023, os subsídios do governo às fontes de energia somaram R$ 99,81 bilhões. O aumento foi de 3,57% em relação ao ano anterior, impulsionado principalmente pelo crescimento de 26,82% nos subsídios às fontes renováveis, que passaram de R$ 14,2 bilhões para R$ 18 bilhões.

Os combustíveis fósseis, no entanto, ainda detêm 81,9% dos benefícios totais, alcançando R$ 81,74 bilhões.

De acordo com o levantamento, o governo reduziu em 0,45% os subsídios ao consumo de combustíveis fósseis, com o retorno da cobrança de impostos (Cide e o PIS/Cofins) sobre a gasolina, no valor de R$ 372 milhões. A isenção para o diesel, porém, foi mantida.

O Inesc afirma que, enquanto os incentivos diretamente ao consumo, que beneficiam a população, diminuíram, os destinados às empresas que exploram petróleo e gás aumentaram R$ 5,55 bilhões devido às renúncias fiscais do regime especial de tributação conhecido como Repetro (Regime Aduaneiro Especial de Exportação e Importação de Bens destinados à exploração de Petróleo e Gás Natural), que envolve suspensão de cobrança de imposto de importação e isenta temporariamente as importações de tributos e impostos como Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), PIS/Pasep e ICMS.

O Repetro foi implantado em 1999 e renovado em 2017, com vigência até 2040.

Início sem fim
Cássio Cardoso Carvalho, assessor político do Inesc, defende uma revisão de subsídios que elimine os que forem considerados ineficientes ou que são destinados, na prática, a empresas que já possuem alta tecnologia, com desenvolvimento inclusive no Brasil, e não dependeriam mais de importação.

Além disso, acrescenta, é preciso reavaliar casos como o do carvão mineral, altamente danoso ao meio ambiente e que é subsidiado até mesmo pela conta de eletricidade paga pelo consumidor final.

-- O problema no Brasil é que o subsídio tem início, mas nunca tem fim - diz ele.

Carvalho defende a retirada gradual de subsídios do setor de combustíveis fósseis. Lembra que a Petrobras é uma das empresas que mais distribuem dividendos no país e que, mesmo a parte destinada ao governo, que é o acionista majoritário, desaparece na conta de pagamento de dívidas públicas e não retorna para a população na forma de recursos para saúde e adaptação às mudanças climáticas, duas áreas diretamente impactadas pelo setor.

O especialista defende ainda que os subsídios sejam redirecionados a outros setores, como o transporte público em todo o país, que, se tivesse mais qualidade, reduziria o consumo de gasolina.

Carvalho lembra que a meta do governo, de chegar ao quarto lugar na produção de petróleo no mundo, não pode acontecer com aumento de subsídios ao setor, inclusive pelo impacto danoso nas condições climáticas em todo o mundo.

'Bolsa petróleo'
No levantamento o Inesc incluiu todas as modalidades de subsídios, como gastos tributários, gastos diretos e renúncias fiscais, tanto na produção quanto no consumo. Foi avaliada também a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), um mecanismo que repassa parte dos subsídios diretamente aos consumidores por meio da tarifa de energia elétrica.

Carvalho diz que enquanto essa espécie de "bolsa petróleo" for mantida, a transição energética no Brasil segue prejudicada.

-- É preciso entender quem está arcando com os subsídios das fontes renováveis. Nosso estudo aponta que são os consumidores de energia elétrica, por meio da conta de luz, ao passo que a indústria de óleo e gás passa ilesa -- diz ele.

A assessora política Alessandra Cardoso, que assina o relatório ao lado de Carvalho, afirma que, quanto maior a renúncia fiscal, menor a disponibilidade de recursos para investimentos em políticas públicas essenciais, como as de adaptação às mudanças climáticas