Caso Marielle: "A primeira coisa que Arthur fez foi falar papai", diz viúva do motorista Anderson
Ela faz parte da lista de testemunhas arroladas pelo Ministério Público do Rio
Quarta testemunha de acusação a ser ouvida no julgamento de Ronnie Lessa e Élcio Queiroz, a viúva do motorista Anderson Gomes, morto na mesma ocasião em que a vereadora Marielle Franco foi executada, Ágatha Arnaus lembrou das primeiras palavras que o filho falou.
— A primeira coisa que Arthur fez foi falar "papai" — contou ela, durante o depoimento. — Eu não sei se o Arthur tem toda a compreensão do que aconteceu (morte do pai). Ele viveu uma vida com uma mãe destruída. Ele não andava, não falava. Ele perdeu todos os Dias dos Pais, as festas da família. Não teve oportunidade de um momento tranquilo com o pai.
Durante o julgamento, o Ministério Público mostrou um vídeo de Anderson tomando conhecimento de que seria pai. Ághata chorou muito nesse momento, mas também se emocionou ao falar dos momentos difíceis que passou ao lado do filho, agora viúva.
— O pior momento que eu vivi com meu filho foi seis meses depois da morte do Anderson. O Arthur precisou passar por uma cirurgia e eu estava sozinha com ele. Foi a primeira vez que eu estava sem o Anderson em um hospital com meu filho. Os médicos falavam para eu me preparar, porque a situação era frágil. O Anderson era a pessoa que sempre dizia que tudo ia dar certo. Eu achei que fosse perder a família que eu construí, eu não ia aguentar — desabafa.
Dali em diante, Ágatha relata, o esforço foi na urgência de elaborar o luto e manter os cuidados com o desenvolvimento do filho, na esperança de acalmar a dor.
— Meu pai me falou uma vez que a partir daquele momento, muitas coisas que eu fizesse seriam as primeiras sem o Anderson. E nos primeiros anos eu me apressei para fazer todas essas coisas para passar logo aquela dor o mais rápido possível. Só que não passa. Não vai passar nunca. Sempre vai ter uma coisa que é a primeira vez sem o Anderson — desabafa emocionada.
O crime
O crime aconteceu na noite de 14 de março de 2018. Marielle, Anderson e Fernanda estavam no carro, quando a parlamentar ia para casa após uma agenda no Centro do Rio.
O Cobalt prata em que estavam Lessa e Queiroz emparelhou com o carro, no momento em que passavam pelo bairro Estácio, quando foram disparados os diversos tiros, com uma submetralhadora. A vereadora e o motorista foram feridos e morreram ainda no local.
O ataque gerou comoção e pedidos por justiça no Brasil e no mundo.
Madrugada adentro
A audiência deve se estender até a madrugada. Os dois réus respondem por duplo homicídio triplamente qualificado (motivo torpe, emboscada e recurso que dificultou a defesa da vítima) e pela tentativa de homicídio contra Fernanda Chaves.
O julgamento tem transmissão ao vivo pelo canal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro no YouTube.
Participação remota
A advogada de Élcio de Queiroz, Ana Paula Nogueira, pediu à juíza Lucia Glioche para as algemas serem retiradas do cliente enquanto ele participa do julgamento.
Os réus participam por videoconferência: Lessa a partir do Complexo Penitenciário de Tremembé, em São Paulo; e Queiroz do Complexo da Papuda, presídio federal em Brasília.
Eles foram retirados da sala virtual a pedido da primeira testemunha de acusação, Fernanda Chaves, que estava com Marielle e Anderson no carro, e sobreviveu à tentativa de homicídio.
Delação premiada
Em delação premiada, assinada com a Polícia Federal, Ronnie Lessa apontou como mandantes Domingos Brazão, conselheiro do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro; o irmão dele, Chiquinho Brazão, deputado federal (sem partido-RJ); e o ex-chefe da Polícia Civil do Rio e delegado Rivaldo Barbosa.Os três negam as acusações. Também foi o ex-PM quem revelou o que seria a motivação pelo crime: o embate da parlamentar contra a exploração de terras para construção irregular na Zona Oeste do Rio.