Espanha

Mau cheiro preocupa moradores de Valencia após temporal que deixou mais de 200 mortos

Autoridades de saúde relataram dois casos prováveis de leptospirose em voluntários

A enchente de 29 de outubro, que chegou à marca de 770 litros de água por metro quadrado em poucas horas - Jose Jordan/AFP

Nas cidades próximas a Valência, devastadas pelas enchentes que deixaram mais de 200 mortos na semana passada, o cheiro da lama criou preocupação com a salubridade do local para as equipes de resgate e vizinhos.

“Não é ideal para a saúde” respirar estes odores, diz à AFP Miguel Rodilla, biólogo da Universidade Politécnica de Valência, embora acredite que seriam necessárias “concentrações mais elevadas” de elementos em decomposição para que fossem tóxicos. Nas áreas alagadas, muitas pessoas voltaram a usar máscaras, como durante a pandemia de Covid-19, e algumas pessoas reclamam de dores de cabeça e tonturas por causa do mau cheiro.

“As evidências científicas dizem que existe o risco de agentes patogênicos, especialmente em águas paradas, que podem desencadear distúrbios gastrointestinais ou pneumonia”, explicou a ministra da Saúde, Mónica García, à rádio pública RNE, depois do aparecimento de alguns casos de gastroenterites, descartando "um surto."

Além disso, as autoridades regionais de saúde relataram “dois casos prováveis de leptospirose” em dois voluntários que limpavam as ruas. A doença, que é contraída pelo contato com urina de animais e é comum em enchentes, não é grave, mas pode causar febre, diarreia e vômitos.

Sobre o processo que desencadeia o mau cheiro que reina na região, Rodilla explicou que quando a lama perde água e seca “os processos de decomposição da matéria orgânica ficam sem oxigênio e é aí que começam a aparecer esses odores”.

“Tem aquele cheiro de podre, cheiro de coisa morta, e não é necessariamente que haja cadáveres por perto, mas simplesmente que há matéria orgânica em decomposição”, explica.

As nuances da podridão
Em Valência, tudo o que apodrece debaixo da lama acrescenta nuances e uma intensidade ao fedor que chega a um nível nauseante.

“É carne podre”, explica Toni Marco, de 40 anos, funcionária de uma empresa privada de limpeza, apontando para um supermercado destruído na cidade de Sedaví, após notar a careta de desgosto do jornalista.

A carne “ficou para trás no dia da cheia e até agora não conseguiram retirá-la”, mais de dez dias depois das cheias e dos frigoríficos terem perdido energia. Catarroja é uma localidade muito afetada pelas cheias que mataram mais de 200 pessoas no dia 29 de outubro.

Dez dias depois, ainda é um atoleiro e é um dos locais visitados pela AFP onde o fedor é mais forte.

“Cada decomposição de um elemento tem um cheiro diferente” e isso explica porque os cheiros “mudam” de rua para rua, explica à AFP Ángel Aldehuela, bombeiro de 51 anos da província de Sevilha. “Além disso”, lembra ele, “pode haver um animal morto” debaixo da lama.

Pior, se não for limpo rapidamente
Segundo o Ministério da Saúde do governo regional valenciano, “não foi detectado nenhum surto de infecções, nem qualquer situação de relevância para a saúde pública” em geral, mas a ONG Greenpeace respondeu que, no caso da lama, fará "sua própria análise". Para o bombeiro sevilhano Aldehuela, o mau cheiro na Catarroja “vai piorar, sem dúvida”.

"Não sei quanto tempo pode persistir, vai depender obviamente dos meios de limpeza que disponibilizarem a estas pessoas, mas estamos falando de dias com certeza, e de algumas semanas também", prevê.

Nas localidades onde os trabalhos de limpeza avançam em um bom ritmo, “cheira a pão ou cheira a fruta, quando há três dias dá para imaginar o fedor que havia ali”, disse Javier Marcos, chefe-geral da Unidade de Emergência Militar, na sexta-feira.

A zona de inundação terá mais problemas de saúde nos próximos dias e semanas por causa de toda a água parada. Assim, as autoridades regionais de saúde valencianas anunciaram que pediram aos 79 municípios afetados que aplicassem “uma série de medidas de controle de mosquitos e outros insectos para evitar a sua proliferação”.