Servidora vítima de feminicídio no Cabo de Santo Agostinho tentou terminar relacionamento
Reportagem da Folha de Pernambuco esteve no IML, na tarde desta quinta-feira (13), para acompanhar a liberação do corpo de Tamires de Almeida e conversou com prima da servidora
Um relacionamento que começou com mentiras e terminou em tragédia: é o que conta a família de Tamires de Almeida Costa Lima, de 34 anos, servidora pública da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) que foi assassinada a facadas na noite da última terça-feira em Enseada dos Corais, no Cabo de Santo Agostinho, Região Metropolitana do Recife.
A reportagem da Folha de Pernambuco esteve no Instituto de Medicina Legal (IML) em Santo Amaro, na tarde desta quarta-feira (13), para acompanhar a liberação do corpo de Tamires, vítima de feminicídio, e conversou com a prima da servidora, que apesar de falar sobre o relacionamento da parente, pediu para não ser identificada.
O principal suspeito de cometer o crime é o companheiro de Tamires, que foi preso em flagrante pela Polícia Militar de Pernambuco.
O relacionamento
De acordo com a prima da vítima, o casal estava separado há cerca de um mês, após aproximadamente oito anos em um relacionamento que começou através da internet.
“O relacionamento já começou com ele mentindo, mostrando ser alguém que não era. Ele usou as fotos de um parente para conversar com ela e, por muito tempo, ficou evitando conhecê-la pessoalmente”, contou.
Segundo ela, Cleber José dos Santos, de 33 anos, se apresentou à família de forma bastante prestativa no começo.
“Quando ele chegou, foi bem recebido pela nossa família. Em todo início de relacionamento as pessoas se mostram prestativas. Mas, com o passar do tempo, vão mostrando quem realmente são, e foi isso que aconteceu. De uns tempos pra cá, a família (principalmente os pais, que já são idosos) passou apenas a aturá-lo, por medo de ela querer ir embora com ele”, relatou a mulher.
O término
Porém, ainda de acordo com a prima, pelas atitudes de Cleber, a própria Tamires não tinha mais vontade de dar continuidade ao relacionamento, tendo terminado com o suspeito há cerca de um mês.
“Ele não tinha respeito pelos pais dela, e nem por ela. Não respeitava ninguém da nossa família. É uma pessoa que não sabe se relacionar com outras pessoas, não trata ninguém bem. Bruto, muito perverso e acha que ele é quem sabe de tudo, e que só ele é quem resolve tudo. E foi assim que ele quis tomar a frente todas as coisas da casa dos pais dela”, contou a parente.
Desrespeitando a vontade da vítima, o suspeito seguiu contatando-a com frequência e, inclusive, lhe cobrando satisfações toda vez que ela saia da casa onde morava com os pais, no bairro da Várzea, para se divertir. Segundo a prima, ele também a acusava de traição e perseguia com frequência após o fim do relacionamento.
“Os pais se submetiam a aceitar a presença dele dentro da casa em atenção a ela. Ela sempre foi uma menina boa, estudiosa, preocupada com os pais, uma menina doce… e eles temiam perdê-la para uma pessoa como ele. Assim, quando acabou, ele continuou arrumando pretextos para estar sempre por lá”, afirmou a prima.
De acordo com ela, foi assim que o suspeito teria conseguido levá-la para a casa de veraneio da família, em Enseada dos Corais.
Antes da ida para Enseada, Tamires teria passado o final de semana em Maceió. A parente informou que, apesar de existir a versão de que Cleber teria ido junto, a família nada pode confirmar.
“Se ela foi com ele, nós acreditamos que deve ter sido sob ameaça, pois ela sempre avisava quando ia viajar, e dessa vez ela não falou nada sobre a viagem”, disse.
De acordo com a familiar, Cleber quis se mostrar uma pessoa bondosa para a família nas últimas semanas. O suspeito teria presenteado os pais da vítima e uma tia que mora com eles, sem qualquer motivo, algo que não tinha o costume de fazer.
O crime
Para atraí-la para a casa na Enseada dos Corais, o suspeito teria falado que precisava lavar bem o carro, alegando que a casa da família tinha mais espaço, para poder vendê-lo ainda nesta semana e comprar um novo veículo.
De acordo com a família, ele teria dito à vítima que, além de vender o carro, alugaria um apartamento na Argentina, onde passaria alguns meses.
“Acreditamos que foi tudo premeditado. Quando ele apareceu na casa dela para levá-la, a mãe dela quis ir junto, mas ele disse: 'melhor a senhora ficar'. Mais tarde, por volta das 22h, ele ligou para ela e pediu que fosse o mais rápido possível para o local, pois Tamires estaria 'tentando matá-lo com uma faca e teria tentado atear fogo na casa”, contou a prima.
Os vizinhos ouviram os gritos de Tamires, acionaram a polícia e invadiram o local para tentar apagar o fogo.
O Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) também foi acionado para a ocorrência, mas, ao chegar no residência, Tamires já estava morta. Segundo a familiar, a polícia teria chegado pouco tempo depois do chamado e prendeu Cleber José dos Santos em flagrante. Ele foi autuado por feminicídio.
Repercussão
A notícia sobre a morte de Tamires surpreendeu tanto a família quanto os colegas de trabalho da servidora. “Apesar do comportamento dele, nunca imaginamos que ele pudesse fazer uma atrocidade dessas. É muito triste”, disse a prima.
Tamires, segundo a família, era bastante dedicada, tinha duas graduações, mestrado, pós-graduação e MBA (Master in Business Administration).
A UFPE e o Hospital das Clínicas (HC) da UFPE emitiram uma nota lamentando a morte da administradora. Tamires ingressou na UFPE em 2014, como assistente em administração, e atuava no HC há um ano, na coordenação da Inspetoria de Segurança Institucional ligada à Unidade de Suporte Operacional (Usop).
Para o HC, esta é mais do que uma tragédia pessoal e familiar. “É um problema social que exige ações de toda a sociedade, e que ninguém deve se calar diante de tamanha brutalidade”.
O corpo de Tamires será sepultado hoje, às 14h, no Cemitério Memorial Guararapes, em Jaboatão. O velório começará às 10h.
Onde buscar ajuda
A Lei Maria da Penha estabelece que todo o caso de violência doméstica e intrafamiliar é crime, deve ser apurado por meio de inquérito policial e ser remetido ao Ministério Público.
A violência contra a mulher pode ser manifestada das formas: física, psicológica, sexual, patrimonial e moral.
Em todos os casos, lembre-se que você não está sozinha e pode fazer a denúncia de diversas formas.
Veja como e onde receber acolhimento em caso de violência doméstica em Pernambuco:
Ligue de forma gratuita para o 190: Polícia Militar de Pernambuco (PMPE). O serviço é disponível 24h por dia, todos os dias.
Ligue de forma gratuita para o 180: Central de Atendimento à Mulher. O serviço do Governo Federal fica disponível 24h por dia, todos os dias, e recebe ligações de todos os lugares do Brasil. Ele registra e encaminha denúncias de violência contra a mulher aos órgãos competentes.
Ligue de forma gratuita para o 0800.281.81.87: Ouvidoria da Mulher de PE. O serviço funciona até às 20h, depois desse horário é recomendado ligar para o 190.
A Polícia Civil de Pernambuco (PCPE) dispõe de 15 Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAM). Algumas delas funcionam 24h por dia. Confira as unidades:
Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAM)
- Recife (1ª Delegacia de Polícia da Mulher) PLANTÃO 24H
Endereço: Rua do Pombal, s/n, Praça do Campo, Santo Amaro.
Telefone: (81) 3184.3356 / 3184.3352
- Jaboatão dos Guararapes (2ª Delegacia de Polícia da Mulher) PLANTÃO 24H
Endereço: Rua Estrada da Batalha, s/n, Prazeres - 6º Batalhão.
Telefone: (81) 3184.3444 / 3184.7198.
- Petrolina (3ª Delegacia de Polícia da Mulher) PLANTÃO 24H
Endereço: Avenida das Nações, nº 220, Centro.
Telefone: (87) 3866.6625
- Caruaru (4ª Delegacia Especializada da Mulher) PLANTÃO 24H
Endereço: Rua Dalton Santos, nº 115, São Francisco.
Telefone: (81) 3719.9107 / 3719.9106
- Paulista (5ª Delegacia de Polícia da Mulher) PLANTÃO 24H
Endereço: Praça Frederico Lundgren, s/n, Centro
Telefone: (81) 3184.7075 / 3184.7077
- Cabo de Santo Agostinho (14ª Delegacia de Polícia da Mulher) PLANTÃO 24H
Endereço: Av. Conde da Boa Vista (antiga BR 101), S/N, Pontezinha.
Telefone: (81) 3184.3414 / 3184.3413
- Olinda (15ª Delegacia Especializada da Mulher) PLANTÃO 24H
Endereço: Avenida Governador Carlos de Lima Cavalcanti, 2405 - Casa Caiada.
Telefone: (81) 98663.6677
- Surubim (7ª Delegacia de Polícia da Mulher)
Endereço: Rua Santos Dumont, nº 85, Oscar Loureiro.
Telefone: (81) 3624.1983 / 3624.1984
- Goiana (8ª Delegacia de Polícia da Mulher)
Endereço: Rua 65, Loteamento Carvalho Feitosa, s/n, Centro.
Telefone: (81) 3626.8510
- Garanhuns (9ª Delegacia de Polícia da Mulher)
Endereço: Avenida Frei Caneca, nº 460, Centro.
Telefone: (87) 3761.8510/ (87) 3761.8507
- Vitória de Santo Antão (10ª Delegacia de Polícia da Mulher)
Endereço: Av. Henrique de Holanda, nº 1333, Redenção.
Telefone: (81) 3526.8789 / 3526.8928
- Salgueiro (11ª Delegacia Especializada da Mulher)
Endereço: Rua Antônio Figueiredo Sampaio, 93, no bairro Nossa Senhora das Graças.
- Afogados da Ingazeira (13ª Delegacia de Polícia da Mulher)
Endereço: R. Valdevino J. Praxedes, s/n, bairro Manoela Valadares
Telefone: (87) 3838.8713 / (87) 3838.8782
- Palmares (16ª Delegacia Especializada da Mulher)
Endereço: R. Cap. Pedro Ivo, 590 - Centro, Palmares
- Arcoverde (17ª Delegacia Especializada da Mulher)
Endereço: Rua Augusto Cavalcanti, 276 Centro da Cidade
Telefone: (87) 98877-2210
Serviços no Recife
A Prefeitura do Recife disponibiliza alguns serviços voltados para as mulheres vítimas de violência doméstica.
Centro de Referência Clarice Lispector
O local funciona 24h, todos os dias da semana, e conta com espaço para o abrigamento emergencial de usuárias em atendimento, acompanhadas ou não de filhos.
Endereço: Rua Doutor Silva Ferreira, 122, em Santo Amaro.
Serviço Especializado e Regionalizado - SER Clarice Lispector
O local acolhe mulheres em situação de violência, por meio de uma equipe multidisciplinar formada por duas assistentes sociais, duas advogadas, duas psicólogas e duas educadoras.
Endereço: Avenida Recife, nº 700, Areias.
Atendimento: 7h às 19h, de segunda a domingo
Salas da Mulher
As Salas da Mulher de cada Compaz são responsáveis pelo primeiro acolhimento das cidadãs.
Unidades do Compaz: Eduardo Campos (Alto Santa Terezinha), Ariano Suassuna (Cordeiro), Miguel Arraes (Praça Caxangá), Dom Hélder Câmara (Coque) e o recém-inaugurado Paulo Freire (Ibura).
Plantão WhatsApp (24 horas) para casos de violência doméstica: (81) 99488.6138.