Na contramão de Trump: Lula e Biden anunciarão parceria sobre energias limpas
O recado do Brasil, afirmaram fontes oficiais, é claro: "Independentemente do resultado" nas recentes eleições americanas, "o governo Lula vai defender a agenda que vem construindo com os EUA"
O encontro bilateral entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e o americano Joe Biden, no próximo dia 19, terá como grande novidade, confirmaram fontes oficiais ao Globo, uma iniciativa conjunta sobre transição energética, tema prioritário para ambos.
O recado do Brasil, afirmaram fontes oficiais, é claro: “Independentemente do resultado” nas recentes eleições americanas, que abriram as portas da Casa Branca ao retorno do republicano Donald Trump ao poder em Washington a partir de 20 de janeiro próximo, “o governo Lula vai defender a agenda que vem construindo com os EUA”.
Desânimo no Planalto
Trump negligenciou a transição energética em seu primeiro governo (2017-2021) e o tema perdeu fôlego após sua vitória nas urnas, mas, apesar do evidente desânimo que o resultado provocou no governo brasileiro, o Palácio do Planalto e o Itamaraty mantiveram intacto o plano de voo previsto para a reunião bilateral dos dois chefes de Estado.
O entendimento será similar à Parceria pelos Direitos dos Trabalhadores e Trabalhadoras, anunciada em setembro de 2023 pelos dois presidentes, que também será parte da agenda de temas a serem conversados por Lula e Biden no Rio. A parceria sobre transição energética começou a ser preparada no início de 2024, e a ideia dos dois governos sempre foi começar a implementá-la a partir de 2025.
O combate às mudanças climáticas é um dos temas mais importantes da agenda compartilhada pelo Brasil de Lula e os EUA de Biden e, agora, um dos que deverão gerar mais atrito entre o presidente brasileiro e Trump. Fontes do governo admitiram que “o futuro da iniciativa é incerto, mas ela será anunciada”. Um dos objetivos da iniciativa é trabalhar para alterar a matriz energética dos dois países e promover alternativas renováveis. Equipes dos dois governos começarão a trabalhar para elaborar um plano de ação, que vai na contramão da visão de Trump sobre energia. “Vamos defender as energias limpas, falar sobre biocombustíveis, hidrogênio verde, carros elétricos”, comentou uma das fontes consultadas. Um mundo muito distante do presidente eleito americano, defensor dos combustíveis fósseis e considerado por ambientalistas um negacionista climático.
Antes de desembarcar no Rio, Biden visitará Manaus, no domingo, onde visitará a Floresta Amazônica “para conversar com líderes locais, indígenas e outros que trabalham para preservar e proteger esse ecossistema crítico”, informou a Embaixada dos EUA. Será, como a parceria com Lula, uma sinalização clara de que a agenda do governo democrata sobre clima será mantida até o último dia de governo.
O governo Biden vem expressando sua preocupação pelo futuro das políticas de combate às mudanças climáticas a partir de janeiro. Segundo o New York Times, “assessores do governo Biden estão correndo para conceder centenas de milhões de dólares em subsídios e finalizar regulamentações ambientais em um esforço para garantir a agenda climática” do democrata antes que Trump retorne. A informação foi confirmada ao jornal por John Podesta, conselheiro sênior de Biden sobre energias limpas.
Na mesma reportagem, Podesta, um dos principais representantes dos EUA na COP 29, em andamento no Azerbaijão, afirma que durante o evento buscará acalmar aliados de seu país sobre o futuro das políticas de transição energética, ponto central da iniciativa que será anunciada por Lula e Biden no Rio, no âmbito da cúpula de líderes do G20. “Não há dúvida de que ter alguém liderando o governo federal que acha que a mudança climática é uma farsa é um impedimento para acelerar a ação”, disse o Podesta ao New York Times. E acrescentou: “Este não é o fim da nossa luta por um planeta mais limpo e seguro.”
Segundo relatório elaborado pela Universidade Johns Hopkins e publicado pelo jornal The Guardian, a ameaça de Trump de revogar as principais políticas sobre mudanças climáticas aprovadas no governo Biden poderia implicar a transferência de cerca de US$ 80 bilhões em investimentos para outros países, e custar aos EUA até US$ 50 bilhões em exportações perdidas, cedendo terreno à China e a outras potências emergentes na corrida para construir carros elétricos, baterias e energia solar e eólica.
Geopolítica e trabalho
Para o governo Lula, anunciar uma iniciativa sobre energias limpas após um encontro com Biden é uma sinalização importante, que, segundo fontes oficiais, “reafirma que as prioridades do Brasil não são negociáveis”. O governo brasileiro, frisaram as fontes, “está disposto a conversar com o futuro governo Trump sobre a parceria, inclusive fazer ajustes. Mas também sabemos que a iniciativa poderia simplesmente nunca sair do papel”.
Os detalhes finais do acordo estão sendo negociados. A ideia é que seja divulgada uma declaração conjunta assinada pelos dois presidentes, apresentado a iniciativa. Até agora, participaram das conversas representantes dos ministérios do Meio Ambiente, Agricultura e Fazenda, entre outros. A dimensão do financiamento, afirmaram as fontes, “é fundamental para que iniciativas sobre clima avancem”.
Biden e Lula também conversarão sobre os conflitos geopolíticos globais, e os avanços na parceria sobre trabalho, entre outros temas. A ideia dos dois governos é incorporar novos países ao entendimento lançado em 2023, que visa defender uma “agenda de justiça e sustentabilidade na economia global e garantir que o crescimento econômico não deixe ninguém para trás”, de acordo com o comunicado divulgado na época.