CÚPULA DO G20

'Ecoando Vozes' no G20: expedição marítima traz ao Rio manifesto contra a poluição dos oceanos

Coletadas de Santa Catarina ao Rio de Janeiro, mensagens sobre preservação ambiental serão entregues à cúpula

"Expedição Marítima Voz dos Oceanos - Rota Brasil" de 2024, é idealizada pela Família Schurmann - Reprodução Instagram/Família Schurmann

Um pequeno veleiro simboliza a potência da cultura oceânica, a pureza infantil e a esperança pela preservação dos mares brasileiros.

Assim é a embarcação Vitória Régia, que entregará mensagens contra a poluição ambiental às autoridades da cúpula do G20, no Rio de Janeiro, durante o fórum Oceans 20 Summit, neste sábado.

O barco a vela chegou à cidade nesta quarta-feira e está atracado perto do Museu do Amanhã, no Centro, com um documento que reúne ponderações feitas por ambientalistas, estudantes, educadores, representantes da sociedade civil, líderes de iniciativas e ONGs.

Produzido coletivamente em quatro diferentes regiões do país, o material dá vida ao manifesto "Ecoando Vozes".

O Rio foi escolhido como destino final da "Expedição Marítima Voz dos Oceanos - Rota Brasil” de 2024, idealizada pela Família Schurmann, devido à cúpula global.

 



O ponto de partida foi Florianópolis, em Santa Catarina, em setembro, quando a tripulação, composta por cinco navegadores, começou a coletar os registros.

REGISTROS
Inicialmente pensado para ser um único rolo de 30m², o manifesto tem, hoje, dois (60m² de material) devido à alta demanda pela participação. Trata-se de uma mistura de registros deixados por crianças, estudantes, quilombolas, pataxós, ribeirinhos e outras pessoas que se sentiram tocadas pela iniciativa.

"Está em uma caixa de madeira. Fizemos como se fosse uma arca, um tesouro “Ecoando Vozes”. É um documento que traz as diversas vozes que encontramos no nosso caminho", pontua Alexandre Moreno, porta-voz da Família Schurmann. "É um documento literalmente grande. A sociedade civil está a bordo com a gente".

Segundo Moreno, a tripulação levou o rolo para todas as paradas e trocou experiências com líderes de projetos diversos. Nas localidades, abriu o pergaminho e construiu coletivamente o manifesto. As pessoas puderam escrever, desenhar ou deixar mensagens livremente sobre a preservação marítima.

"Seja em forma de desenho, poesia ou texto: dê o seu recado", relembra ele sobre a orientação dada aos voluntários. "A manifestação popular vai ser entregue à sociedade".

Velejador à frente de grande parte das iniciativas marítimas da família, Vilfredo Schurmann, de 76 anos, entende que “cada um pôde se expressar da sua maneira” sobre a preservação dos mares.

"Tivemos alunos de Oceanografia, universitários, doutorandos, pessoal do litoral, ribeirinhos. Cada um teve o seu momento de escrever alguma coisa. Tem cada mensagem bonita..." observa.

Foi ele quem escolheu o Vitória Régia para a expedição brasileira, que percorreu 700 milhas (1.400km). A embarcação da família, Kat, foi deixada na Nova Zelândia para ser reformada.

FEITO À MÃO
O Vitória Régia pertence ao navegador Fernando Horn, de 65 anos, amigo e companheiro de viagens de Schurmann há anos.

O veleiro de 18 metros foi feito à mão em Belém, no Pará, em 1987, porém está “praticamente novo”. Horn relata ter reformado a embarcação completamente no ano passado, o que tornou o barco um forte candidato à missão até o G20.

"Fiquei apavorado quando cheguei ao Rio. Tinha muito plástico no mar. A iniciativa privada e a pública devem se juntar para melhorar as condições", opina Schurmann. 

Crédito: Reprodução Instagram/Família Schurmann

"Já conheci muitas cidades. O prefeito que cuida da limpeza da cidade é sempre reeleito. Ele está cuidando da sua cidade e as pessoas estão vendo", complementa.

Embora o capitão avalie que o percurso total foi tranquilo, acredita que a Cidade Maravilhosa recebeu o veleiro de forma supreendentemente violenta:

"O desafio foi chegar ao Rio. Entrou um vento Sul forte e pegamos 35 a 40 nós, quase 80km/h perto do Pão de Açúcar. O vento foi tão forte que virou e, depois, quebrou a retranca".

Além do “Ecoando Vozes”, a parceria Voz dos Oceanos, G20 Brasil e Oceans 20 também prevê a produção de diário de bordo da expedição, publicado em formato de boletins on-line, conteúdos para podcasts e redes sociais. A iniciativa tem apoio mundial do programa da Organização das Nações Unidas (ONU) para o Meio Ambiente (PNUMA).

ROTAS
As cidades que fazem parte da rota "Expedição Marítima Voz dos Oceanos - Rota Brasil” são:

- Florianópolis; Itajaí; Balneário Camboriú e São Francisco do Sul (em Santa Catarina);

- Paranaguá e Ilha do Mel (no Paraná);

- Santos; Ilhabela e Ubatuba (em São Paulo);

- Paraty, Angra dos Reis/Porto Frade, Ilha Grande e, finalmente, Rio de Janeiro (no Rio de Janeiro).

Essa é a segunda expedição em território brasileiro, cujo objetivo é conscientizar a população sobre a poluição plástica nos oceanos e as urgências climáticas.

O percurso da embarcação faz parte do projeto de conservação ambiental “A Voz dos Oceanos”, uma parceria da Voz dos Oceanos, do G20 Brasil e da Oceans 20.

A rota será retomada em 2025. Vai partir da Cidade Maravilhosa para Belém, no Pará, onde deve encontrar o veleiro Kat, embarcação que deve concluir uma jornada internacional.

Ao longo da primeira etapa, há cerca de dois anos, a iniciativa testemunhou a presença de plásticos e microplásticos em 100 destinos de mais de dez países das Américas do Sul, Central e do Norte e da Oceania.

O fórum Oceans 20 Summit, local de entrega do pergaminho, será realizado no Museu do Amanhã, zona portuária, das 14h às 16h. Ele representa um marco na promoção de uma gestão sustentável dos oceanos e no desenvolvimento de uma "economia azul próspera", pontua a Família Schurmann.

PRESERVAÇÃO
Ao lado da família, o capitão Vilfredo Schurmann navega há quatro décadas. Ele já cruzou o mundo algumas vezes e, além de admirar as belezas marinhas e terrestres em mais de 50 países, deparou-se com os males humanos no meio ambiente.

"Nesses 40 anos de navegação, vimos a degradação de perto. Não somos alarmistas, mas a coisa está feia. Os oceanos estão perdendo suas cores", alerta o navegador.

"Falamos em limpar os mares já há 30 anos. Nos chamavam de “ecochatos”. Hoje, é completamente diferente. As pessoas veem e estão preocupadas, principalmente os jovens. É impressionante".

Pesquisador e professor da Uerj, o biólogo marinho Fábio Araújo salienta que o oceano é essencial para a vida humana. Além de ser fonte de alimentos para os seres humanos e regular o clima do planeta, grande parte do oxigênio respirado vem dele, e não da Floresta Amazônia, algo que está erroneamente no senso comum.

"Temos que conhecer mais sobre o oceano e entender a sua importância. As pessoas só preservam aquilo que conhecem — reforça o profissional". 

"É necessário divulgar a cultura oceânica, o conhecimento sobre o oceano. Pode ser feito no espaço escolar e, também, informalmente".

O profissional alerta que o Brasil é responsável por 3,44 milhões de toneladas de plástico que chegam aos oceanos todos os anos. São de 86 a 150 milhões de toneladas desses resíduos na água.

A estimativa foi feita a partir de um estudo do Blue Keepers, projeto ligado ao Pacto Global da Organização das Nações Unidas (ONU), feito em 2023. No ano interior, a pesquisa indicou que cada brasileiro poderia ser responsável por poluir os mares com 16kg de plásticos anualmente.