JUROS

'Quanto mais demorar o ajuste fiscal, maior é o choque', diz Campos Neto

Segundo o presidente do BC, ''é muito difícil ter juros mais baixos se o fiscal não tiver organizado''

"Sem ter as contas organizadas, o País dificilmente terá juros estruturais 'mais baixos e estáveis'", afirmou Campos Neto - Canva

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, afirmou que uma redução estrutural da taxas básica de juros no Brasil está condicionada a "choques positivos” na política fiscal.

Ele ressaltou que, sem ter as contas organizadas, o país dificilmente terá juros estruturais “mais baixos e estáveis”.

Em entrevista à Folha de SP, Campos Neto afirmou que há pressa para o governo de Luiz Inácio Lula da Silva apresentar medidas de corte de gastos capazes de reverter a piora da percepção de risco do Brasil, e que o tempo é super-relevante. Para o presidente do BC, a demora do anúncio deixa cicatrizes no meio do caminho, como investimentos desperdiçados.

"Quanto mais se espera, depois mais você acaba tendo que fazer. O choque que precisa ser produzido depois é maior", disse à Folha.

Na opinião de Campos Neto, há dois caminhos: cortar despesas na "carne" em 2025 e apresentar medidas que indiquem aos agentes econômicos que o arcabouço fiscal ficará mais sustentável no futuro.

"Eventualmente, caminhamos para uma bifurcação. Para ter uma saída mais organizada, precisa fazer um choque fiscal positivo.

Em vez de esperar chegar essa bifurcação, se a gente consegue se antecipar e criar uma surpresa positiva para o mercado em termos de choque fiscal, ajuda.

É uma percepção de que, de fato, o governo está fazendo um corte de gastos que seja relevante não só no curto prazo, mas também de forma estrutural para frente".

Questionado sobre qual seria um corte de gastos relevante, Campos Neto afirmou que, tendo em vista pesquisas de mercado, tem escutado algo entre R$ 30 bilhões e R$ 50 bilhões no ano de 2025 e alguma coisa estrutural.

No caso de as medidas de cortes de gastos forem consideradas mais brandas do que o esperado, Campos Neto ressaltou que, em nenhum lugar da ata do Copom está escrito que o BC pretende acelerar a alta de juros:

"Continuamos dizendo que a gente prefere ter um guidance (sinalização futura) aberto e que vamos analisar ao longo do tempo".

Na semana passada, o Comitê de Política Monetária (Copom) aumentou a Selic em 0,5 ponto percentual, de 10,75% para 11,25% ao ano. Na ata, divulgada nesta terça-feira, o colegiado cita o “desconforto" com a distância das expectativas de inflação em relação à meta de 3,0%.

Em participação por videoconferência no 12º Fórum Liberdade e Democracia de Vitória, organizado pelo Instituto Líderes do Amanhã, Campos Neto destacou que há uma expectativa de convergência da inflação na maior parte do mundo, “com raras exceções”, e afirmou que o Brasil, entre as grandes economia, é o único em que o mercado financeiro tem a percepção de que ainda é necessário um ajuste forte nos juros.

"Infelizmente o Brasil é o único nessa situação entre os grandes países e a gente precisa entender e endereçar isso, porque é muito importante", disse o chefe da autoridade monetária, que acrescentou que convergir a inflação para a meta é “mandado” do Banco Central “dado pelo governo”.