Um ponto de vista do Marco Zero

A falta que faz o diálogo político

Luiz Otávio Cavalcanti - Arthur Mota/Folha de Pernambuco

"Política é o fazer conjunto, não há solidão na política".
      Hannah Arendt 


Final da Segunda Guerra Mundial, 1945. Europa destruída. Os Estados Unidos, íntegros. Menos Pearl Harbor. Porque o país ficou fora do teatro de operações bélicas. Com gordas reservas cambiais, PIB crescendo, emprego em alta.

No contexto de recuperação da economia global, os norte-americanos cuidaram, então, da imagem da nação. Como ? Por meio de investimentos em arte, música, pintura, teatro, balé, museus. E cinema. Glenn Miller, Frank Sinatra, Ella Fitzgerald, Ernest Hemingway, e filmes, Rio Vermelho, viajavam o mundo todo. Jogando sons, letras, imagens da produção intelectual norte-americana para plateias de outros continentes. Movimento chamado, em 1980, pelo sociólogo, Joseph Nye, de soft power.

Nye analisou o amadurecimento das instituições de cada país. E identificou quatro fontes de poder: o poder econômico, o poder militar, o poder tecnológico e o soft power. Soft power é um conjunto de valores culturais que, em função de sua beleza e atração, influencia ações em outras sociedades. Contribuindo para que surja ambiente de cooperação internacional.

Passa-se o tempo. Ao longo dos últimos quarenta anos, aparece uma onda de nacionalismo. Misturado com populismo. Binômio explosivo, fatal. Que provoca fragmentação política nas relações entre países. E faz perder o senso de paz. A ONU não tem força; a Rússia dominou a Crimeia; depois invadiu a Ucrânia; o conflito entre Hamas e Israel foi retomado. Na verdade, o ambiente de convivência entre as nações se deteriorou profundamente.   

O prédio das Nações Unidas, em Nova York, mais parece catedral onde se ouve repetidamente o réquiem de Mozart. Registrando o arquivamento de falidas propostas de acordo. Oh, senhores do mundo, onde estão lideranças que semeiem o encontro de vontades, pensado por Hannah Arendt ? Oh, senhores da guerra, como é possível sustar a poeira de destruição improvável de que falou a prudência de Voltaire ? Oh, senhores da concórdia, como é possível cerzir o pergaminho no qual o orvalho da amizade reluza mais que bombas ? Não precisamos de um Napoleão. Precisamos de um Nelson Mandela.   

A vida é bela. E é na alegria e na esperança que regamos nossos jardins. Como disse o franco-argelino, Albert Camus, é essa admirável vontade de nada separar que sempre reconciliará o coração doloroso dos homens com as primaveras do mundo.