O que se sabe sobre o novo míssil balístico russo Oreshnik, usado em ataque na Ucrânia

Existência do armamento foi revelada pelo presidente Vladimir Putin em pronunciamento

O que se sabe sobre o novo míssil balístico russo Oreshnik, usado em ataque na Ucrânia - AFP

O anúncio feito pelo presidente da Rússia, Vladimir Putin, de que um novo míssil balístico de médio alcance foi usado em um ataque contra a região ucraniana de Dnipropetrovsk acendeu alertas ao redor do mundo.

O equipamento teria a capacidade de levar ogivas nucleares — o que não o fez nesta quinta-feira, segundo serviços de inteligência — e seu emprego foi encarado como uma perigosa mensagem ao Ocidente.

Segundo Putin, o míssil, chamado Oreshnik, atinge dez vezes a velocidade do som (Mach 10), “que é de 2,5 a 3 quilômetros por segundo". O líder russo afirmou que esse era um míssil de médio alcance (MRBM), o que, de acordo com a Associação para o Controle de Armas, significa um alcance entre mil e 3 mil quilômetros, além de uma margem de erro de cerca de 150 metros em relação ao alvo determinado.

O presidente russo declarou que "atualmente não há maneiras de conter esta arma", e especialistas dizem que os atuais sistemas de defesa aérea em operação na Ucrânia não são capazes de interceptar mísseis balísticos.

Uma das alternativas, como apontou a empresa de consultoria Defense Express, em artigo nesta quinta-feira, é o sistema THAAD (Defesa Terminal de Área de Alta Altitude, em inglês), mas os EUA têm hoje apenas sete baterias operacionais.

Em seu canal no Telegram, Yan Matveev, analista militar russo, disse acreditar que o Oreshnik seja uma adaptação do projeto de míssil balístico de alcance intermediário (IRBM) RS-26 Rubej, que tem alcance de até 5,8 mil km e capacidade de levar até quatro ogivas nucleares de 0,3 megaton cada (a bomba Little Boy, usada pelos EUA contra Hiroshima, em 1945, tinha poder explosivo de 0,015 megaton).

Oficialmente, o programa de desenvolvimento do RS-26 havia sido paralisado em 2018, e uma decisão final sobre a continuidade ou não não seria tomada antes de 2027, afirmou o site militar russo Top War, citando o orçamento militar do país.

No passado, os EUA afirmaram que o projeto violava o Tratado de Forças Nucleares de Alcance Intermediário, assinado em 1987 por Washington e Moscou e que previa a eliminação dos mísseis balísticos e de cruzeiro com alcance entre 500 e 5,5 mil km. O acordo foi abandonado em 2019.

Entre as semelhanças operacionais com o RS-26, o Oreshnik, afirmam especialistas e fontes dos serviços de inteligência dos EUA e Reino Unido, poderia levar uma carga conhecida como MIRV (Veículo de Reentrada Múltiplo Independentemente Direcionado, em inglês), que lhe permite transportar múltiplas ogivas, inclusive nucleares.

— Este é um grande foguete com capacidade de carga útil, presumivelmente MIRVs, e tem a capacidade associada a ele de transportar cargas nucleares — disse à CNN Tom Karako, diretor do Projeto de Defesa de Mísseis do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais (CSIS), apontando que provavelmente foi a primeira vez em que o sistema de múltiplas ogivas foi usado em combate.

Contudo, Matveev destaca que esse lançar um míssil balístico é caro e ineficiente em um cenário como o conflito na Ucrânia — não há informações detalhadas sobre os danos provocados em Dnipro, e um vídeo divulgado pelo vice-presidente do Conselho de Segurança russo, Dmitry Medvedev, não mostra grandes explosões. As autoridades locais afirmam que três pessoas ficaram feridas, e houve danos em um centro de reabilitação e "uma unidade industrial". Mais cedo, Putin disse que o míssil destruiu uma fábrica de armamentos.

Para Pavel Povdig, analista nuclear independente baseado em Genebra, a escolha pode ter sido mais simbólica do que prática.

— A ideia principal é demonstrar que a Rússia está pronta para usar esses mísseis, inclusive para os fins a que se destinam. O sinal é que, se necessário, serão utilizadas com uma ogiva nuclear — disse ao site independente russo iStories.

O argumento foi corroborado por Fabian Hoffmann, pesquisador na Universidade de Oslo.

— O que eles querem nos dizer hoje é "vejam, o ataque da noite passada tinha uma ogiva não nuclear, mas vocês sabem, se o que quer que vocês estejam fazendo continuar, o próximo ataque pode ser com uma ogiva nuclear" — opinou ao New York Times.

Ele afirma que os russos já cogitam realizar um teste atômico (envolvendo seus mísseis) há algum tempo, mas optaram pelo ataque "convencional" para não incomodar aliados regionais, especialmente a China, e ao mesmo tempo enviar um sinal claro ao Ocidente.

— Isto é uma escalada — disse Tatiana Stanovaya, pesquisadora do Centro Carnegie, citada pelo New York Times. —Eu realmente acredito que a situação é muito perigosa.

Desde o início do conflito, Vladimir Putin tem usado com uma preocupante frequência a chamada "carta nuclear", deixando claro que pode empregar seu arsenal caso sofra um ataque de grande porte, incluindo com armamentos convencionais, ou se entender que há uma "ameaça crítica" à soberania da Federação Russa.

Desde o fim de semana, após a autorização dos EUA para que a Ucrânia use armas ocidentais contta o território russo, Putin tem elevado o tom e o rumo de suas ações: na terça-feira, dia do primeiro ataque com os mísseis americanos ATACMS contra Bryansk e Kursk, ele aprovou mudanças na doutrina nuclear russa, rebaixando a "linha vermelha" que poderia levá-lo a considerar um ataque envolvendo algumas de suas 5,5 mil ogivas atômicas. No discurso desta quinta-feira, Putin deixou claro que o reforço aos arsenais ucranianos não devem intimidar seus planos de guerra.

— Nós sempre preferimos, e ainda estamos prontos, para resolver todas as questões contenciosas por meios pacíficos — afirmou. — Mas também estamos prontos para qualquer acontecimento. Se alguém ainda duvida disso, é em vão. Sempre haverá uma resposta.