Galípolo elogia Haddad, diz que não há 'bala de prata' para o fiscal
Em jantar com empresários, diretor de política monetária foi questionado sobre impacto dos juros na economia real
O diretor de Política Monetária do Banco Central, Gabriel Galípolo, afirmou nesta quinta-feira que não tem uma “bala de prata” para solucionar o déficit nas contas públicas e que é preciso desmontar “disfuncionalidades” de maneira persistente. Ele ressaltou, no entanto, que não é papel da autoridade monetária dar sugestões sobre o fiscal.
Próximo presidente do BC, Galípolo participou de evento da organização Esfera Brasil, em São Paulo, e foi questionado por empresários sobre o pacote de medidas do governo, detalhado mais cedo, e sobre o efeito para a economia real dos juros altos.
Ele assegurou que o BC seguirá “firme” o objetivo de levar a inflação para a meta, mesmo com os efeitos colaterais:
— (O BC) vai cumprir o seu mandato e segue firme no seu objetivo que é perseguir a meta de inflação. Isso pode se dar em doses diferentes, com mais custos ou menos custos, mas esse é o mandato do Banco Central e a gente segue firme nesse objetivo de perseguição da meta — enfatizou.
Galípolo acrescentou que era "importante" reafirmar o mandato do BC em um ambiente em que a sociedade está "mais conflagrada":
— O papel do BC está ali olhando para a bola dele. A bola dele é inflação. E o instrumento que ele tem para colocar a inflação na meta é a taxa de juros — afirmou o diretor, acrescentando que "o mal maior" seria o BC não agir. — O impacto pior é a inflação (para a população). Com certeza o impacto pior é a inflação.
Sobre a possibilidade de ter de subir mais os juros na presidência da autoridade monetária, ele disse que não daria para imaginar "ir para o BC" e achar que não seria necessário "passar por momentos de subir juros":
— Se você pretende ser miss simpatia, seu lugar não é o Banco Central. A função do Banco Central não é voce sair obrigatoriamente aplaudido por todo mundo.
'Empenho' de Haddad
O encontro com cerca de 50 empresários teve a presença de Joesley Batista, da J&F, Rubens Menin, fundador da MRV, e Luiz Carlos Trabuco Cappi, do Bradesco. Galípolo evitou comentar diretamente o pacote fiscal apresentado pelo Ministério da Fazenda, que gerou reação negativa do mercado, mas disse que não há “bala de prata” para o déficit nas contas públicas:
— Sobre o déficit nominal, tem a ver com o que gente estava comentando sobre questões mais estruturais — respondeu, quando perguntado sobre a situação das contas públicas, acrescentando que era preciso “desmontar disfuncionalidades de maneira persistente”. — Não vai ter uma maneira que você vai conseguir ter uma bala de prata. Você desmontar aquilo que atrapalha ou que é um pouco dissonante das melhores práticas seja na pauta econômica ou na pauta fiscal é muito importante.
O governo federal apresentou nesta quinta-feira os detalhes do pacote de medidas fiscais que têm a meta de gerar R$ 71,9 bilhões de economia entre 2025 e 2026, com impacto acumulado de R$ 327 bilhões até 2030. O mercado financeiro recebeu o pacote com desconfiança. O foco do mal-estar foi a inclusão, no mesmo anúncio, de uma reforma tributária para renda que inclui o aumento na faixa de isenção do IR para quem recebe até R$ 5 mil.
O dólar, que tinha batido valor histórico na véspera, alcançou R$ 6 no início da tarde desta quinta-feira, ultrapassando a máxima histórica durante um pregão. No fim do dia, a moeda encerrou as negociações com recorde renovado para o valor de fechamento, vendida a R$ 5,98, em alta de 1,30%. Galípolo disse que seu papel não era “fazer comentário sobre política fiscal”, mas assegurou confiança em Haddad:
— Eu tenho convicção do empenho do meu amigo Fernando Haddad em endereçar esses temas — afirmou o futuro presidente do BC. — Se o Fernando se convence que aquilo é o certo para a sociedade, ele compra a briga e vai até o final mesmo.
'Não tem nada que se queixar do mercado'
No início da semana, o diretor de política monetária participou de reuniões com o presidente Lula sobre as medidas de corte de gastos.
Galípolo afirmou que o BC não é chamado pelo governo para dar sugestões de política fiscal quando participa dessas reuniões, mas para dar um diagnóstico do que está "acontecendo no mercado".
— Quando o BC é chamado, ele não é chamado para dizer o que precisa ser feito [....]. O papel do BC não é extrapolar a sua alçada de função da política monetária e sim dizer como o mercado está interpretando, porque os ativos estão se comportando dessa maneira e quais as expectativas que existem ali.
Após uma questão de Rubens Menin, que citou a reação negativa do mercado financeiro ao pacote de corte de gastos, Galípolo lembrou de uma frase do ex-primeiro ministro britânico Winston Churchill, ao dizer que a função da autoridade monetária era "entender a reação" dos agentes financeiros:
— Churchill tinha uma frase que o politico reclamar do jornalista é como um marinheiro reclamar do mar. Essa é uma frase que pode valer muito bem para autoridade monetária e mercado. Se queixar do mercado é a mesma coisa que o marinheiro se queixar do mar. Não tem nada que se queixar do mercado.