INVESTIGAÇÃO

Mensagens apreendidas por PF indicam que militares não acreditavam em punição por tentativa de golpe

Em grupo de WhatsApp, integrantes dos 'kids pretos' afirmaram que Alexandre de Moraes não iria querer 'mexer no vespeiro'

Fachada do Prédio da Polícia Federal em Brasília - Rafa Neddermeyer/Agência Brasil

Em conversas em um grupo de WhatsApp obtidas pela Polícia Federal, um grupo de militares demonstrou pouca preocupação em uma eventual punição por tentativa de golpe.

Em uma mensagem de 4 de janeiro de 2023, um integrante do chat escreveu que o ministro Alexandre de Moraes, relator do caso no Supremo Tribunal Federal (STF), não iria querer "mexer nesse vespeiro" e que, se houvesse "caça às bruxas" dentro do Exército, seria como "apagar fogo com gasolina".

"Se alguém tiver lido nossas mensagens, vai preferir fingir que não leu. Primeiro que além desse grupo existem milhares outros. Vão mandar prender ou punir todo mundo? Na bucha eles preferem fingir que está tudo bem, que as FA não são golpistas. (...) Mas na prática ninguém quer mais instabilidade ainda. Imagina o AM (Alexandre de Moraes) mexendo nesse vespeiro! Imagina dentro da própria Força essa eventual caça às bruxas!!! = apagar fogo com gasolina", diz a mensagem enviada no grupo "Dossss!!!", do qual o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, era um dos administradores.

O grupo de bate-papo entrou na mira da Polícia Federal depois que um integrante postou uma carta para pressionar o então comandante do Exército, general Freire Gomes, a aderir ao plano golpista, no fim de 2022. "E aí, agora todos colocaremos o nome nessa rela aí. Ou seremos leões de Zap", postou um militar, pedindo adesões ao documento.

Apesar da pressão de outros generais e integrantes do governo Bolsonaro, Freire Gomes se recusou a participar da trama, assim como o comandante da Aeronáutica, Baptista Junior, segundo as investigações da PF.

As mensagens de teor golpista no grupo levaram a PF a intimar alguns de seus usuários a prestar depoimento. Um deles afirmou que o nome do grupo se referia à última sílaba do termo "Comandos" e era formado por cerca de 90 militares que passaram pelos batalhões das Forças Especiais, conhecidos como "kids pretos".

Segundo a PF, pelo menos seis kids pretos foram mobilizados para executar um plano de captura e "neutralização" do ministro do STF Alexandre de Moraes, do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do vice Geraldo Alckmin. No grupo, um integrante chegou a perguntar se "vai ter careca sendo arrastado por blindado em Brasília?", numa clara ameaça a Moraes.

As informações constam de anexos do inquérito sobre a trama golpista que foram tornados públicos nesta semana. A PF indiciou 37 pessoas por tentativa de golpe, tentativa de abolição violenta do Estado de Direito Democrático e organização criminosa.