EUROPA

Polícia da Geórgia detém ao menos 43 pessoas durante protestos

País tem sido abalado por tumultos desde que o partido governista declarou vitória nas eleições parlamentares de outubro, que a oposição pró-UE condenou como falsificadas

Manifestantes pró-União Europeia na Geórgia - Vano Shalamov/AFP

A polícia da Geórgia prendeu ao menos 43 pessoas durante a madrugada desta sexta-feira em uma violenta repressão aos protestos contra a decisão do governo de adiar as negociações de adesão à União Europeia. O país tem sido abalado por tumultos desde que o partido governista declarou vitória nas eleições parlamentares de outubro, que a oposição pró-UE condenou como falsificadas.

A força de choque usou cassetetes, balas de borracha, gás lacrimogêneo e canhões de água para dispersar os protestos que se formaram do lado de fora do Parlamento em Tbilisi por volta das 2h (horário local), agredindo manifestantes pacíficos e jornalistas, conforme testemunhou um repórter da AFP. Barricadas foram levantadas em algumas ruas da capital pelos manifestantes, segundo a BBC. O protesto durou até 6h (horário local), mas outras manifestações são esperadas ainda nesta sexta.

O Ministério do Interior disse que 32 de seus funcionários ficaram feridos e que “43 pessoas foram detidas pelas forças da lei por desobedecerem a ordens legais da polícia e por pequenos atos de vandalismo”.

Milhares de pessoas saíram às ruas depois que o primeiro-ministro Irakli Kobakhidze, do partido governista Sonho Georgiano, anunciou que o país do Cáucaso não se filiaria à União Europeia até 2028. A oposição acusou o governo de desviar Tbilisi de seu antigo sonho de ingressar no bloco europeu e de gravitar em direção à Rússia. Por sua vez, Kobakhidze acusou o bloco de “chantagem” depois que os legisladores da UE pediram que as eleições parlamentares do mês passado na Geórgia fossem repetidas. Eles citaram “irregularidades significativas”.

Desde 2012, a Geórgia tem sido governada pelo Sonho Georgiano, um partido que, segundo os críticos, tem tentado afastar o país da UE e aproximá-lo da Rússia.

Dois políticos da coalizão de oposição Coalizão pela Mudança, Elene Khoshtaria e Nana Malashkhia, teriam sido feridos durante os protestos. Khoshtaria teve um braço quebrado, enquanto Malashkhia teve o nariz fraturado, segundo a coalizão.

"Durante a repressão, nós nos abrigamos em uma farmácia, mas as forças especiais entraram atrás de nós. Se não fosse pela presença da mídia, eles poderiam ter nos espancado até a morte", disse Giorgi Butikashvili, membro do Parlamento, à BBC.

Imagens nas mídias sociais também mostraram um jornalista da estação de TV Formula, da oposição, sendo severamente espancado pela polícia. Outros representantes da mídia que usavam identificação de imprensa claramente visíveis também foram alvos. O proeminente poeta Zviad Ratiani estava entre os detidos, informou a associação de escritores PEN na Geórgia, exigindo sua libertação imediata.

Mais de 100 diplomatas georgianos assinaram uma carta nesta sexta-feira contra a suspensão das negociações sobre a adesão do país à UE. O comunicado foi publicado nas redes sociais pela funcionária do Ministério das Relações Exteriores, Kti Pruidze, com o apoio de 130 funcionários da Pasta.

A carta aberta afirma que a recusa da Geórgia em negociar a adesão à União Europeia até ao final de 2028 “não corresponde aos interesses estratégicos do país”.

“A recusa unilateral do país a esta oportunidade terá consequências estratégicas negativas. É possível que deixem de ser criadas condições tão favoráveis para a adesão às estruturas europeias e euro-atlânticas. Além disso, atrasar o processo de negociação de adesão levará ao isolamento do país”, escrevem os diplomatas.

A Ucrânia disse nesta sexta-feira que estava “decepcionada” com a decisão de Tbilisi de interromper as negociações de adesão à UE, acusando o governo georgiano de tentar “agradar Moscou”.

Os legisladores da oposição estão boicotando o novo Parlamento, enquanto o presidente pró-UE da Geórgia, Salome Zurabishvili, tentou anular os resultados das eleições por meio do tribunal constitucional do país.

O anúncio do primeiro-ministro de adiar a adesão à UE ocorreu horas depois que o Parlamento Europeu adotou uma resolução não vinculativa rejeitando os resultados das eleições de 26 de outubro na Geórgia, alegando “irregularidades significativas”.

A resolução exigia uma nova votação dentro de um ano sob supervisão internacional e a imposição de sanções às principais autoridades georgianas, incluindo o primeiro-ministro Kobakhidze.

"Decidimos não colocar em pauta a questão da adesão à União Europeia até o final de 2028", disse Kobakhidze, acusando o Parlamento Europeu de “chantagem”, mas se comprometendo a continuar implementando reformas. "Até 2028, a Geórgia estará mais preparada do que qualquer outro país candidato para iniciar as negociações de adesão com Bruxelas e se tornar um estado membro em 2030".

Na quinta-feira, os deputados do Sonho Georgiano votaram unanimemente para que Kobakhidze continuasse como primeiro-ministro. No entanto, especialistas em direito constitucional afirmam que todas as decisões tomadas pelo novo Parlamento são inválidas, pois ainda está aguardando uma decisão judicial sobre a tentativa de Zurabishvili de anular os resultados da eleição.

Na quarta-feira, o partido governista indicou o político de extrema-direita e ex-jogador de futebol Mikheil Kavelashvili para o cargo cerimonial de presidente, aumentando ainda mais as tensões.

O antigo país soviético ganhou oficialmente o status de candidato à UE em dezembro de 2023, uma aspiração que é apoiada por 80% da população, de acordo com pesquisas. Mas, no início deste ano, Bruxelas congelou o processo de adesão da Geórgia, citando a necessidade de Tbilisi resolver o que diz ser um retrocesso democrático.