Lula defende solução e respeito aos direitos humanos em crise por lei marcial na Coreia do Sul
Medida estabelecia restrições aos direitos da população, e foi rechaçada por todo o espectro político do país, inclusive por aliados de Yoon Suk-yeol.
O governo Lula divulgou nota, nesta terça-feira, na qual afirma que acompanha atentamente os desdobramentos da declaração de Lei Marcial de emergência na Coreia do Sul e sua posterior revogação.
"O governo do Brasil manifesta sua expectativa de uma resolução pacífica, fundamentada no respeito aos direitos humanos, às instituições democráticas e ao Estado de Direito, e reafirma a confiança no diálogo como caminho para soluções que assegurem a normalidade institucional e a paz na Península coreana", diz a nota do Itamaraty.
O governo disse que não há registro, até o momento, de incidentes consulares envolvendo nacionais brasileiros.
Entenda o que houve
O presidente da Coreia do Sul, Yoon Suk-yeol, voltou atrás nesta terça-feira e suspendeu a lei marcial decretada sob o pretexto de proteger o país das "forças comunistas" e em meio a uma forte disputa com a oposição no Parlamento. A medida — que proibia atividades políticas e estabelecia o controle da imprensa — foi rechaçada de forma unânime pelos parlamentares, que acusaram Yoon de agir ilegalmente. Nas ruas, manifestantes pedem, além da renúncia, sua prisão.
"Às 11 horas da noite passada, declarei a lei marcial com uma vontade resoluta de salvar o país contra forças antiestatais que estão tentando paralisar as funções essenciais do país e colapsar a ordem constitucional da democracia liberal ", disse Yoon, em pronunciamento já na madrugada de quarta-feira na Coreia do Sul, tarde de terça no Brasil.
"No entanto, devido ao pedido da Assembleia Nacional para levantar a lei marcial, a lei marcial foi suspensa. Retiraremos as tropas destacadas e aceitaremos imediatamente o pedido da Assembleia Nacional por meio da reunião do gabinete e levantaremos a lei marcial."
Segundo Yoon, a decisão será oficializada em reunião com os membros do gabinete ministerial, prevista para as próximas horas.
"Convoquei imediatamente uma reunião de gabinete, mas, como era de manhã cedo, o quórum para decisão ainda não foi alcançado, por isso suspenderei a lei marcial o mais rápido possível ", o presidente, antes de desferir críticas ao Parlamento, dominado pela oposição.
— Peço à Assembleia Nacional que pare imediatamente com as ações ultrajantes que paralisam a função do Estado por meio de repetidos [pedidos de] impeachment, manipulação legislativa e manipulação orçamental.
Perto das 23h de terça-feira pelo horário local, 11 da manhã em Brasília, Yoon surpreendeu a Coreia do Sul ao declarar lei marcial no país, em uma decisão, segundo ele, “para erradicar as forças pró-Coreia do Norte e proteger a ordem constitucional livre”. Ele não detalhou quais seriam as ameaças vindas do Norte, mas sinalizou que, na verdade, era uma resposta às seguidas derrotas sofridas no Legislativo.
"Para salvaguardar uma Coreia do Sul liberal das ameaças representadas pelas forças comunistas da Coreia do Norte e para eliminar os elementos antiestatais (...), declaro a lei marcial de emergência", disse Yoon, em um discurso transmitido ao vivo para a nação. — Sem considerar os meios de subsistência das pessoas, o partido da oposição paralisou o governo unicamente por interesse de julgamentos políticos, investigações especiais e para proteger seu líder da Justiça.
Após o discurso, o líder da oposição da Coreia do Sul, Lee Jae-myung, denunciou a lei marcial como "ilegal" e pediu ao povo para que se reunisse no Parlamento, em protesto. Lee, que foi esfaqueado no pescoço no começo do ano por um homem que fingiu ser um apoiador, perdeu por poucos votos para Yoon na eleição de 2022.
"A ordem presidencial após a declaração ilegal da lei marcial é uma ordem que viola a Constituição e a lei, e segui-la é em si ilegal. Por favor, venham à Assembleia Nacional agora. Estou indo para lá também — afirmou Lee, pedindo que as tropas retornassem aos quartéis. — Quem comanda vocês não é a pessoa que declarou a lei marcial ilegal, inconstitucional e inválida. Vocês devem seguir as ordens do povo soberano."
Os coreanos atenderam ao chamado: durante a madrugada (horário local), milhares de pessoas protestaram em frente ao local. "Prendam Yoon Suk-yeol!", gritavam. Segundo a lei marcial, até então em vigor, "greves, paralisações e protestos que incitem o caos social” estavam proibidos.
Soldados tentaram bloquear a entrada da Assembleia, impedindo que os parlamentares acessassem o plenário, mas 190 conseguiram passar e votaram contra Yoon. Desses, 172 eram da oposição e 18 da própria sigla do presidente, o Partido do Poder Popular (PPP). Com 300 assentos na Casa, era necessária maioria simples para derrubar a medida.
"Esta declaração de lei marcial perdeu seu efeito prático devido à decisão da Assembleia Nacional de suspender a lei marcial. Portanto, é ilegal para os militares e a polícia exercerem o poder público com base na lei marcial ", afirmou o líder do PPP, Han Dong-hoon, em entrevista coletiva. — Como partido no poder, lamentamos muito que tal situação tenha ocorrido."
Entenda as medidas
No discurso televisionado, o presidente sul-coreano acusou os legisladores de cortar "todos os orçamentos-chave essenciais para as funções fundamentais do país, como o combate aos crimes relacionados às drogas e a manutenção da segurança pública, transformando a Coreia do Sul em um paraíso das drogas e em um estado de caos na segurança pública".
"Nosso Congresso Nacional se tornou um refúgio para criminosos, uma toca de ditadura legislativa que busca paralisar os sistemas judicial e administrativo e derrubar nossa ordem democrática liberal ", disse, qualificando a oposição como dominada por "forças antiestatais que tentam derrubar o regime" e considerou sua decisão "inevitável".
Restaurarei a normalidade no país.
Yoon não detalhou as medidas que seriam adotadas, mas o chefe do Estado-Maior do Exército, Park An-soo, encarregado pela execução da lei marcial, anunciou em seguida que todas as atividades políticas estariam suspensas — e isso incluía, além de greves, a própria Assembleia Nacional, que tinha o poder de reverter a declaração de Yoon. Havia rumores de que o Legislativo seria dissolvido, e novas eleições convocadas.
Repercussão
Os Estados Unidos disseram nesta terça-feira que estão “seriamente preocupados” com a declaração de lei marcial pela Coreia do Sul.
— Os Estados Unidos não foram notificados com antecedência sobre este anúncio — afirmou a porta-voz da Casa Branca, Karine Jean-Pierre, a uma repórter da agência Yonhap. — A administração [dos EUA] está em contato com o governo coreano e monitorando de perto a situação à medida que aprendemos mais sobre ela.
A ONU também afirmou estar acompanhando “com preocupação” a situação.
"Estamos acompanhando a situação de perto com preocupação ", disse Stephane Dujarric, porta-voz do secretário-geral, acrescentando que não poderia comentar mais sobre uma situação que está "mudando rapidamente".