CORTE DE GASTOS

Votações apertadas e críticas de aliados indicam dificuldade para governo aprovar pacote de corte

Congresso aprovou urgência de projetos com margem pequena de votos favoráveis

Congresso Nacional - Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil/Arquivo

As votações apertadas das urgências dos projetos do pacote econômico na noite de quarta-feira (4) no Congresso indicam que o governo terá um caminho difícil para aprovar o corte de gastos desenhado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

Por uma diferença de apenas três votos, o Executivo não sofreu uma derrota no requerimento para acelerar a tramitação do projeto de lei complementar com gatilhos do arcabouço fiscal. O placar foi 260 a 98, quando eram necessários 257 deputados dizendo sim à medida.

Cobranças pelo pagamento de emendas parlamentares, resistência da base governista em mexer em programas sociais e até mágoa de preteridos na sucessão da Mesa Diretora da Câmara são elementos que pesaram nas votações de quarta-feira e que devem reverberar nas próximas semanas, nas quais o governo tem pressa para aprovar as medidas econômicas.

—Não se trata de retirar direitos. Nós vamos discutir isso na hora certa. O que é importante neste momento é nós votarmos a urgência, acelerarmos a discussão e nós entregarmos ao país a votação dessa matéria até o dia 20 ou 21 de dezembro— apelou o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE) durante a votação.

O União Brasil, liderado pelo deputado Elmar Nascimento, entregou 44 votos contrários, de um total de 53, na votação da urgência do projeto. Há no partido muita insatisfação em relação às emendas parlamentares, principalmente, após a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que ampliou restrições para liberação da verba. Além disso, Elmar foi preterido pelo Palácio do Planalto e pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), na disputa pela eleição da Casa, marcada para fevereiro de 2025.

O PSD, do líder Antonio Britto, também preterido nessa mesma disputa, entregou 20 votos contrários de um total de 37, na votação. Já o Republicanos, de Hugo Motta —preferido para substituir Lira no ano que vem— teve apenas três votos “não”.

Para apaziguar a questão das emendas, o governo fez dois movimentos na semana, um para tentar acelerar o pagamento de valores represados e outro de acionar a Advocacia Geral da União para se contrapor à decisão do STF e sinalizar que “está ao lado do Congresso” nessa questão.

No início da semana, a Secretaria de Relações Institucionais pediu ao Ministério da Fazenda a liberação de R$ 7,8 bilhões para realizar o pagamento nos próximos dias de emendas já empenhadas. Os repasses, no entanto, só devem iniciar a partir de sexta-feira e cair nas contas das prefeituras na próxima semana. Até lá, as negociações com os parlamentares devem ser difíceis.

Há também “fogo amigo” no caminho do governo para aprovar o pacote. Apesar de o PT ter votado em bloco a favor das urgências, petistas têm criticado, em caráter reservado, as medidas dos projetos que mexem com programas sociais e bandeiras do partido. Um dos projetos altera os cálculos de renda pessoal e familiar que definem se determinado candidato tem ou não direito ao Benefício de Prestação Continuada (BPC), salário mínimo pago a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda.

Já entre os aliados, o PSOL votou em peso contra as urgências.

—Nós não queremos operar na lógica do ajuste. Portanto, entendemos que não há urgência para esse tipo de ajuste, que é injusto e que só grava os que mais precisam do Estado e dos programas sociais. Vamos cortar lá em cima e não deixar para as calendas isso— afirmou o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ) durante a votação.

Mesmo entre os partidos da base que votaram a favor, houve sinalizações de que serão pedidas mudanças no teor dos projetos para que eles possam ser aprovados pelo Congresso.

—Evidentemente todos nós temos questionamentos em relação a esses dois projetos de lei, mas o que nós estamos votando aqui é a urgência. É preciso que esta Casa dê a sinalização de que tem compromisso com o Brasil que nós tanto queremos. É evidente que nós queremos rediscutir o posicionamento relativo ao BPC e tantos outros pontos que precisam ser discutidos — afirmou o deputado André Figueiredo (PDT-CE), líder da maioria.

Apesar das insatisfações e do caminho difícil pela frente, a Câmara aprovou ontem à noite, após um dia de indefinições, duas urgências do pacote de Haddad. A primeira delas foi o projeto de lei complementar com gatilhos do arcabouço fiscal e que permite o bloqueio de emendas parlamentares, por 260 a 98. Já a urgência do texto que limita o crescimento real do salário mínimo ao máximo permitido pelo arcabouço fiscal, foi aprovado na sequência, por 267 a 158.

A aprovação da urgência acelera a tramitação da proposta e faz com que o projeto não tenha que passar por comissões temáticas e seja votado direto no plenário.

A votação ocorreu após o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), dizer que o governo não tinha votos sequer para aprovar as urgências, mas garantir que a Casa não iria “faltar”. Uma reunião de líderes foi realizada no começo da noite e, apesar do acordo para aprovar a urgência, não houve acordo para nomeação da relatoria do projeto ou compromisso com o mérito do projeto.