Ofensiva rebelde avança no norte da Síria e grupos tomam província 20 km ao sul de Damasco
Exército sírio, leal a Bashar al-Assad, concentrou tropas para responder à ofensiva que avança em direção à capital e afirma ter começado a retomar territórios
As forças rebeldes sírias lideradas pelo grupo jihadista Hayet Tahirir al-Sham (HTS) realizaram novos avanços em direção à cidade de Homs, terceira cidade mais populosa do país, em mais um dia em que a ofensiva lançada na semana passada continua a obter vitórias militares contra as tropas de Bashar al-Assad.
O regime sírio, ainda incapaz de conter os rebeldes, também sofreu uma derrota ao sul de Damasco, com uma insurgência tomando o controle da província de Daraa, localizada a 20 km da capital.
O comandante militar da aliança rebelde liderada pelo HTS, Hassan Abdel Ghani, afirmou neste sábado que suas forças estão "a menos de 20 km da entrada sul de Damasco", o que significaria a abertura de um segundo front na ofensiva lançada a partir do nordeste do país, iniciada semana passada. A ONG Observatório Sírio para Direitos Humanos (OSDH), monitor com sede em Londres, que acompanha o conflito a partir de fontes no país, indicou que vários grupos rebeldes locais controlam a província de Daraa.
"Agora [os rebeldes] controlam mais de 90% da província de Daraa, incluindo a capital de mesmo nome, após a retirada sucessiva das forças do regime", indicou a organização.
O Exército da Síria, leal a Assad, confirmou em um comunicado que tropas mobilizadas em Daraa e Sweida — uma outra província do sul do país — estão sendo realocadas para "estabilizar um perímetro de segurança". De acordo com o OSDH, forças sírias também se retiraram da província de Quneitra, na fronteira das Colinas de Golã. Mais cedo, os militares afirmaram que estavam começando a retomar partes das províncias de Homs e Hama.
A ofensiva lançada pelo HTS reacendeu um conflito que estava adormecido desde o começo desta década e pegou de surpresa as forças sírias. Com um rápido avanço a partir da província de Idlib, no extremo noroeste do país, na fronteira com a Turquia, os rebeldes tomaram Aleppo, segunda maior cidade síria, e Hama, a quarta maior cidade.
A coluna principal continua seu deslocamento ao sul, onde se aproxima da cidade de Homs, terceira mais populosa. As tropas já teriam alcançado a cidade de al-Dar al-Kabera, uma cidade localizada a cerca de 10 km do centro de Homs.
Ao longo de 13 anos de conflito, que deslocou uma miríade de grupos nacionais e estrangeiros ao campo de batalha, Assad conseguiu se manter no poder e no controle das principais cidades do país por meio de um extenso apoio internacional, sobretudo de Rússia, Irã e do movimento libanês Hezbollah. Com cada um de seus principais aliados envolvidos em conflitos próprios, da Ucrânia à Gaza, o líder sírio, cuja família está há 50 anos no poder, está enfrentando dificuldades para conseguir uma mobilização.
Diante do cenário desfavorável, Assad recebeu uma notícia importante neste sábado, com o anúncio da milícia xiita libanesa de que enviou 2 mil homens para auxiliar a defesa de uma cidade síria na fronteira. Atualmente, as forças oficiais já contam com o apoio aéreo russo, que tem participado de bombardeios a posições inimigas do regime
Promessa de não-sectarismo
À medida que o avanço dos grupos jihadistas provocou alarme entre a população civil etnicamente diversa da síria e em países estrangeiros — com Rússia, EUA e Jordânia, por exemplo, indicando que seus cidadãos deixassem o país imediatamente em voos comerciais —, as lideranças da coalizão liderada pelo HTS têm insistido de que a tomada de poder pelo grupo não levaria a revanchismos ou sectarismo.
— Pedimos que todas as seitas sejam tranquilizadas... pois a era do sectarismo e da tirania acabou para sempre — afirmou Abdel Ghani, em uma declaração neste sábado, compartilhada pelo Telegram.
Em uma entrevista à rede americana CNN divulgada na sexta-feira, o líder do HTS, Abu Mohammed al-Jawlani, também tentou tranquilizar as partes internas e externas envolvidas no conflito sobre o temor de uma retaliação, afirmando que o objetivo principal é derrubar Assad do poder — na quarta-feira, quando da tomada de Hama, ele já havia dito que as tropas iriam avançar sem "revanchismo".
— As pessoas que temem a governança islâmica ou viram implementações incorretas dela ou não a entendem adequadamente — disse al-Jawlani. — Algumas violações contra eles [minorias religiosas] ocorreram por certos indivíduos durante períodos de caos, mas resolvemos essas questões.
Ninguém tem o direito de apagar outro grupo. Essas seitas coexistem nesta região há centenas de anos, e ninguém tem o direito de eliminá-las.
Apesar das promessas, a desconfiança dentro do país é motivo de temor e levou milhares de pessoas em regiões próximas às áreas de ação rebeldes a fugir.
Na sexta-feira, a ONU estimou que o conflito já provocou o deslocamento de 370 mil pessoas desde 27 de novembro, alertando que o número pode aumentar para 1,5 milhão.