MÚSICA

Em "Coração Sangrento", Zeca Baleiro volta a ser "experimentador do início de carreira"

Cantor e compositor maranhense faz show com o catarinense Wado, do recente "Coração Sangrento", nesta sexta (13), no Teatro do Parque

Zeca Baleiro, cantor e compositor - Divulgação

Um “Zeca experimentador, do início de carreira” para driblar o "às vezes êxito da carreira (que) acomoda um pouco (...)”.

É este o Zeca Baleiro que está no recente “Coração Sangrento”- álbum assinado e recém-lançado em parceria com o catarinense, radicado em Maceió, Wado, e que ganha lançamento nesta sexta-feira (13) com show no Teatro do Parque.

Por Wado, artista catarinense com quem Zeca já havia trocado composições, ele cultiva admiração e afinidade - condições para culminâncias em trabalhos como o disco, que em dez faixas revela o quão certeira foi a parceria.

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“ (...) não componho com quem eu não gosto”, revela o maranhense em conversa com a Folha de Pernambuco, ocasião em que falou da mescla de leveza e desassossego de “Coração Sangrento”, da cena musical pernambucana, em especial de PC Silva e Juliano Holanda, também parceiros musicais.
 

FOLHAPE: Qual o Zeca Baleiro que habita em “Coração Sangrento”? Por aqui a impressão é de que foram muitas as referências musicais… 

É o Zeca experimentador, do início da carreira, que gostava de transitar por vários ritmos, linguagens, experimentar timbres… Esse trabalho com Wado permitiu isso, era um trabalho mais alternativo e isso é bom.

Poder alternar esses projetos dá a oportunidade de dar vazão a esse lado mais experimentador, mais irrequieto… às vezes o êxito da carreira acomoda um pouco a gente, naturalmente, inevitavelmente. 

Então, tem muitas referências mesmo, muitas referências minhas, muitas referências do Wado e é um disco que eu adoro ouvir. Acho muito gostoso mesmo, prazeroso de ouvir.

Canções trabalhadas a partir da pandemia... Mas sob inspiração daquele período sombrio? Já que não há tom de pessimismo, ao contrário, o disco é tomado de levezas.

Muitas feitas sob a inspiração daquele “momento sombrio”, mas muitas canções de esperança, de crença na humanidade, que a gente estava precisando muito, para a gente e para passar para os outros também. 

O disco tem uma leveza, tem um pouco de esperança, tem um pouco de questionamento sobre esse novo mundo tomado pela tecnologia, como: qual o futuro da humanidade, qual o futuro da canção, qual o futuro da poesia num mundo tomado de tecnologia, com tanta gente desempregada pelo algoritmo?. 

Preocupações assim, mais subjetivas, mais filosóficas talvez, mas tudo tratado com muita leveza, sem presunção, acho. O disco é muito leve.

FOLHAPE: O disco traz o Zeca erudito (e popular), o tom crítico (e necessário), a noção sempre assertiva sobre o tempo e suas realidades… São singularidades do teu trabalho - e do de Wado também?

Como se deu essa sintonia entre vocês? Porque ela se faz nítida em cada uma das faixas.

Que bom que você percebeu isso. Sim, são características dos nossos trabalhos e foi o que nos fez criar afinidade, amizade e ter vontade de parceria. As minhas parcerias sempre se dão a partir de uma amizade ou de uma admiração mútua. 

Nunca é uma coisa meramente “profissional”, não componho com quem eu não gosto, não componho com quem eu não tenho afinidade, não componho com quem eu não tenho carinho.

Então, na pandemia, além de Chico César e Wado, que foram parcerias que geraram dois discos, eu também compus com Vicente Barreto mais de 30 canções, com Juliano Holanda outras tantas. 

Agora fiz, depois da pandemia, mais 10 músicas com Lô Borges, que talvez resultem num disco dele. Isso para mim é muito instigante, sempre compor em parceria. E o Wado e eu, apesar das diferenças, tanto de geração como de universos, temos em comum muitas referências e esse amor à música brasileira.

FOLHAPE: Aliás, sobre Wado… o disco era o que faltava para consolidar essa parceria entre vocês e essa admiração mútua?

Pois é, a gente se conheceu, sei lá, no início dos anos 2000. Fiquei muito impactado com o primeiro disco dele, alguém nos apresentou, que eu já não lembro quem, e desde então ficamos amigos, parceiros e tal. 

Wado e Zeca Baleiro | Crédito: Fernanda Tein

Eu cheguei a lançar um disco dele, uma coletânea pelo meu selo, que na época fazia discos físicos ainda, um CD, “O Ano da Serpente”. 

E sempre compondo… Gravei a música “Era”, nossa primeira parceria, no disco “O Coração do Homem-Bomba", depois ele gravou “Zás”, depois eu gravei “Zás”... Foram sete canções gravadas em discos nossos até que veio essa safra mais substanciosa na pandemia, de umas 14 canções, das quais a gente elegeu 10 para o disco.

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FOLHAPE: Fala um pouco sobre Sérgio Fouad, Zeca? É dele a produção e mais o que neste disco?
O Sérgio Fouad é um grande e novo parceiro, a gente se conhece desde a masterização e mixagem do “Chão de Giz”, em que eu canto Zé Ramalho. 

E ele virou um parceiro eterno, um cara muito arejado, um ótimo produtor, um grande amigo, com ideias muito frescas e muito aberto.

Um cara que transita da música brasileira ao rock com muita desenvoltura. É muito por responsabilidade dele esse frescor do disco, esse lirismo, cordas, timbres eletrônicos sutis, tudo de muito bom gosto. O Sérgio é um craque.

FOLHAPE: O que te chama atenção nesta nova safra de artistas da música? A pergunta vem com o intuito de falar do pernambucano PC Silva - que recentemente nos trouxe disco novo e a faixa “Lambada Exuberante”.

PC integra o rol de uma nova cena pernambucana que tem voado alto. A exemplo de Juliano Holanda, que foi quem apresentou vocês dois, é isso?

O PC é um grande e novo parceiro também, já temos umas cinco, seis canções. Me foi apresentado pelo Juliano Holanda, com quem já tenho umas 14 canções, e também já dividi o palco com Almério, Martins… é uma cena muito bacana. 

Fui ver o Reverbo em São Paulo, achei muito interessante a concepção, aquela coisa coletiva, gregária, comunitária que está faltando na música… 

Os caminhos hoje são muito individuais, individualistas e é bonito ver isso, quase uma volta aos anos 70 quando tudo era mais em grupo.

Eu estou muito feliz com essa nova cena de Recife, que é muito interessante, um pouco liberta da marca do manguebeat, que foi uma coisa muito forte, poderosa, tanto em termos estéticos como comerciais, de visibilidade midiática. 

Mas essas coisas muito fortes às vezes acabam solapando outras tentativas de linguagem e agora eu vejo uma turma jovem se voltando mais para a canção, para uma quase tradição da música brasileira mais renovada, também remodelada. 

Isso é muito bonito, alvissareiro, promissor, eu sou muito fã dessa nova geração. O PC é um grande compositor, o Juliano é outro grande compositor. 

Alguma faixa do disco tem um ‘quê’ de especial para você, Zeca? Ou para você e para Wado? 

Eu gosto de todas. Tem uns dias em que umas reverberam mais na sua alma. Eu gosto muito da música que abre, “Coração Sangrento”, e da música que fecha, “Amores e Celulares”, que é quase uma modinha contemporânea, né? Fazendo um paralelo entre perder amores e perder celulares. Mas eu gosto do disco por inteiro. 

Serviço
Show “Coração Sangrento”, de Zeca Baleiro e Wado

Quando: nesta sexta-feira (13), às 20h
Onde: Teatro do Parque - Rua do Hospício, 81, Boa Vista
Ingressos a partir de R$ 80 via Sympla
Informações: (81) 9 9488-6833