Rede ABC fecha acordo em caso de difamação e pagará R$ 90 milhões a Donald Trump
Em março, âncora disse que o presidente eleito havia estuprado a escritora E. Jean Carroll, após Justiça de Nova York considerar Trump culpado por abuso sexual
A rede americana ABC fechou um acordo para encerrar um caso de difamação movida pelo presidente eleito dos EUA, Donald Trump, ligado a uma entrevista exibida no começo do ano. Pelo acerto, a empresa terá que pagar US$ 15 milhões (R$ 90 milhões) ao republicano, em uma das raras vitórias obtidas por ele em casos do tipo.
O processo girava em torno de uma entrevista feita pelo âncora George Stephanopoulos com a deputada republicana Nancy Mace, exibida no dia 10 de março, na qual, o jornalista afirmou “10 vezes”, segundo a defesa de Trump, que o então candidato à Presidência dos EUA havia estuprado a escritora E. Jean Carroll nos anos 1990.
Em 2023, um júri do estado de Nova York concluiu que Trump abusou sexualmente de Carroll em uma loja de departamentos nos anos 1990, mas não que a havia estuprado, como disse Stephanopoulos — na época, o ex-presidente foi condenado a pagar US$ 5 milhões (R$ 30,21 milhões) em reparações por agressão sexual e difamação — em março, ele pagou uma fiança de US$ 83,3 milhões (R$ 503,33 milhões) para que pudese recorrer da condenação, e no começo do ano a escritora, que reitera ter sido estuprada, recebeu outros US$ 83,3 milhões (R$ 503,33 milhões) do republicano, em indenizações por falas difamatórias.
Para a defesa de Trump, ao afirmar que ele havia estuprado a escritora — a definição do crime de estupro é restrita em Nova York — Stephanopoulos fez declarações "falsas, intencionais, maliciosas e projetadas para causar danos", uma vez que, pela decisão judicial, ele cometeu abuso sexual, crime que nega ter cometido mesmo condenado.
Em julho, uma juíza rejeitou o arquivamento do processo contra a ABC, alegando que as diferenças entre os dois crimes, de estupro e abuso sexual, eram significativas o suficiente para justificar a sequência do caso. Antes do desfecho anunciado neste domingo, Stephanopoulos e Trump foram convocados para prestar depoimentos.
Após o acordo, a ABC afirmou, em comunicado, que a rede e Stephanopoulos “lamentam declarações sobre o presidente Donald J. Trump feitas durante uma entrevista de George Stephanopoulos com a deputada Nancy Mace no [programa] This Week da ABC em 10 de março de 2024”, e que está satisfeita “que as partes tenham chegado a um acordo para rejeitar o processo nos termos do processo judicial”.
Além dos US$ 15 milhões, o acordo prevê que a rede pague os custos dos advogados de Trump, de cerca de US$ 1 milhão, e que emita um pedido formal de desculpas. Trump não se pronunciou.
A vitória contra a ABC é relativamente rara para um político que faz dos processos contra jornalistas e empresas de comunicação uma parte de sua imagem. Em 2023, ele entrou com uma ação contra a rede CNN alegando que tinham o comparado ao ditador nazista Adolf Hittler, mas o caso foi arquivado pouco depois.
Em outubro, agora contra a rede CBS, pediu US$ 10 bilhões (R$ 60,1 bilhões) de indenização por causa de uma entrevista com sua rival na eleição presidencial, a democrata Kamala Harris, a qual considerou ser um “atos partidário e ilegal de eleição e interferência eleitoral” com a intenção de “enganar o público e tentar inclinar a balança” a favor da democrata.
Para analistas, a ABC poderia ter evitado um acordo e aguardado um veredito formal, uma vez que condenações do tipo não são comuns.
— Grandes organizações de notícias têm sido frequentemente muito cautelosas em relação a acordos em processos de difamação movidos por autoridades públicas e figuras públicas, porque temem o criar um padrão perigoso ao fazê-lo, e porque têm todo o peso da Primeira Emenda (que trata da liberdade de expressão) do seu lado — disse RonNell Andersen Jones, professora de Direito na Universidade de Utah, ao New York Times.
Ela ainda entende que a decisão da ABC pode ser um sinal de uma mudança de atitude no setor.
— Comparada à grande imprensa americana de uma década atrás, a imprensa de hoje é muito menos robusta financeiramente, muito mais ameaçada politicamente e exponencialmente menos confiante de que um determinado júri valorizará a liberdade de imprensa, em vez de abraçar uma difamação dela — concluiu a professora.
(Com The New York Times)