Promessas, fogos e uva-passa
Convenhamos, às vésperas de mais um Ano Novo, talvez devêssemos adotar uma promessa realmente prática: prometer não prometer. Porque, no final das contas, passada a queima de fogos, “não está mais aqui quem falou”. Entre pequenas juras e planos grandiosos, tudo passa – até a uva-passa.
Refiro-me, claro, àqueles que, como eu, não leram os festejadíssimos clássicos contemporâneos sobre foco, produtividade e afins – embora, no final do ano passado, tenham prometido ler neste ano, no mínimo, dois livros por mês.
Ao que parece, a cada final de ano, convenciona-se que, nesse período, promessas são feitas para não serem cumpridas – tal como os fervorosos votos de moralidade após cada novo pecadilho político.
Nessa quadra festiva, em que se renova a esperança por dias melhores, as promessas são iguais às que o adúltero incorrigível faz ao eterno amor da sua vida: esvaem-se após os primeiros brindes, como as bolhas do champanhe bebido ao som de uma extasiante canção.
As promessas de fim de ano têm a mesma concretude que o encontro da turma das antigas idealizado por amigos nostálgicos ao se cruzarem no shopping; que o velho “passa lá em casa” e o requentado “vamos marcar um café”.
Mas, pensando bem, essa é justamente uma das belezas da condição humana: mesmo tropeçando nos próprios pés, seguir em frente, movido por bem-intencionadas promessas.
Entre o desejo sincero de mudança e a força dos maus hábitos, seguimos nossa jornada. Afinal, se sonhar é mais simples que realizar, não sonhar é estar vivo sem viver.
Assim, no próximo réveillon, prometamos… Mas nem tanto – para que ao menos essas novas promessas não passem, como a uva-passa.
Advogado criminalista.
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