IGREJA CATÓLIA

Papa Francisco nomeia cardeal pró-imigração e crítico de Trump como arcebispo de Washington

Escolha por Robert McElory, a dias da posse do magnata, dá sinais de como Francisco pretende se posicionar no próximo mandato do republicano

Papa Francisco - Alberto Pizzoli/AFP

O Papa Francisco nomeou o cardeal Robert McElory, bispo de San Diego, como o próximo arcebispo da capital americana Washington. McElroy, de 70 anos, é um grande defensor dos imigrantes e crítico do primeiro governo de Donald Trump, que assumirá mais uma vez a Casa Branca no próximo dia 20.

Com a decisão, Francisco transfere para um dos cargos mais importante da igreja americana um de seus principais aliados na questão da imigração. A pauta é cara a Trump e seus aliados, que prometem realizar a maior deportação em massa da história.

O bispo McElroy é forte apoiador das causas dos refugiados, do meio ambiente, e do maior acolhimento e inclusão de mulheres e LGBTQIAP+ na vida da igreja. Ele sucederá o cardeal Wilton Gregory, de 77 anos, o primeiro arcebispo negro de Washington.

O Papa também nomeou a irmã Simone Brambilla como chefe do escritório de vida religiosa da Santa Sé, tornando-a a primeira mulher líder de um departamento do Vaticano. O escritório tem responsabilidade sobre freiras, monges e frades.

A nomeação dá sinais de como o Pontífice pretende se posicionar no novo mandato de Trump, além de rebater a escolhe do republicano por Brian Burch, um crítico severo de Francisco, para ser seu embaixador no Vaticano. É esperada para sexta-feira um encontro entre o Papa e o presidente Joe Biden, católico devoto que manteve um relacionamento caloroso com o chefe da Igreja em seu mandato.

Aliado em pautas sociais
Como bispo de San Diego, McElroy trabalho perto da fronteira com o México. Estudou na Universidade de Havard com Oscar Handlin, um proeminente acadêmico que mudou a visão pública sobre o papel da imigração na histórica americana. Também possui doutorado pela Universidade de Stanford em Ciência Política e em Teologia pela Universidade Romana.

Logo após a vitória de Trump em 2016, durante uma conferência católica sobre imigração, McElroy lamentou o que descreveu como "uma profunda doença na alma da vida política americana", afirmando que seria "impensável" para os católicos "ficarem parados enquanto mais de dez por cento do nosso rebanho é arrancado do nosso meio e deportado".

Ele também se manifestou quando o republicano tentou acabar com o programa que protege da deportação cerca de 700 mil imigrantes, conhecidos como Dreamers, que entraram no país quando crianças.

Ainda no início do primeiro mandato do magnata, o bispo fez um discurso na Califórnia referindo-se diretamente ao presidente e pedindo aos fiéis que se tornassem "disruptivos" da agenda anti-imigrantes. Em sua fala, também citada pela CNN, o bispo disse que os católicos deveriam "parar aqueles que buscam enviar tropas [...] para deportar os indocumentados, para arrancar mães e pais de suas famílias, [...] parar aqueles que retratam os refugiados como inimigos."

Em dezembro passado, quando o presidente eleito prometeu novamente reprimir a imigração, o cardeal assinou uma declaração junto com outros 11 bispos da Califórnia em apoio aos "irmãos e irmãs imigrantes". "Queremos assegurar a vocês que nós e nossa mãe, a Igreja, estamos com vocês nestes dias de ansiedade", escreveram, prometendo também "defender sua dignidade e unidade familiar".

'Jogada ousada'
McElroy foi promovido à cardeal em 2022 por Francisco, o que o torna elegível para votar no sucessor do pontífice. Seus posicionamentos contrastarão em Washington com os do vice-presidente J.D Vance, que se converteu ao catolicismo em 2019 e representa atualmente a ala tradicional da Igreja, que ganhou força entre os republicanos ao se opor ao avanço do secularismo. Vance apoiou a agenda linha-dura de Trump ao longo da corrida eleitoral.

É do futuro vice-presidente a história falsa sobre imigrantes haitianos em Springfield, em Ohio, estarem roubando e comendo animais domésticos de seus vizinhos. A mentira ganhou repercussão mundial após ser repetida pelo então candidato Trump durante o primeiro e único debate contra a atual vice-presidente, Kamala Harris.

Para o historiador da igreja e professor da Universidade de Villanova, na Pensilvânia, Massimo Faggioli, em entrevista à Pensilvânia, a nomeação de McElroy é uma "jogada ousada" de Francisco e que anunciá-la no aniversário de quatro anos do ataque ao Capitólio e dias antes da posse de Trump é a "declaração na declaração".