Em vez de se preocupar com a dieta em si, treine o cérebro para emagrecer; entenda
Muitos pesquisadores incentivam uma nova abordagem para obter uma alimentação saudável com base na ciência cognitiva
Eis uma resolução de ano novo que você pode manter: pare de fazer dieta e comece a saborear sua comida. Isso pode parecer um conselho surpreendente, mas há evidências científicas crescentes que sugerem que as dietas não funcionam.
Pesquisas mostram que a restrição alimentar só dá vontade de comer mais. E, a longo prazo, fazer dieta pode sair pela culatra, desencadeando as defesas de sobrevivência do seu corpo, como a desaceleração do seu metabolismo, que pode dificultar ainda mais perder peso no futuro.
A resolução de parar de fazer dieta não significa desistir de ter um corpo mais saudável. Mas, para conquistar o hábito de fazer dieta com sucesso, você precisará abandonar as velhas ideias sobre contar calorias, banir seus alimentos favoritos e medir o sucesso por um número em uma balança.
Então, qual é a alternativa? Muitos pesquisadores incentivam uma nova abordagem para obter uma alimentação saudável com base na ciência do cérebro. Uma variedade de técnicas que encorajam a consciência de como comemos, a aceitação relacionada aos alimentos que queremos ingerir e exercícios alimentares intuitivos pode ser usada para suprimir desejos e remodelar nossos hábitos alimentares.
— Os paradigmas em torno da força de vontade não funcionam. Você tem que começar sabendo como sua mente funciona — afirma Judson Brewer, professor associado de ciências sociais e comportamentais na Escola de Saúde Pública da Universidade Brown que estudou práticas alimentares conscientes.
Sem dietas restritivas
Deixar de lado velhos hábitos de dieta nesta época do ano é especialmente difícil por causa do fascínio dos planos para perder peso. Muitos programas e aplicativos de dieta famosos tentam atrair usuários com a promessa de que eles não estão promovendo uma dieta tradicional, apenas para impor práticas alimentares restritivas assim que você se inscrever.
Traci Mann, que chefia o laboratório de saúde e alimentação da Universidade de Minnesota, observa que, além da decepção de não perder peso, a dieta também afeta seu corpo de várias maneiras negativas. Entre outras coisas, a restrição alimentar pode afetar a memória e as funções executivas, levar a pensamentos alimentares obsessivos e disparar o cortisol, um hormônio do estresse.
— Fazer dieta é uma forma desagradável e de curta duração de tentar perder peso. Você pode emagrecer no curto prazo, mas ele (o peso) volta. Isso acontece não importa quem você seja, com pessoas com grande força de vontade e com pessoas com péssima força de vontade — explica Mann, autora de “Segredos do laboratório de alimentação: A ciência da perda de peso, o mito da força de vontade e por que você nunca deve fazer dieta novamente” (em tradução livre para o português)
Se você ainda estiver tentado a experimentar aquela dieta da moda, considere o seguinte: as evidências sugerem que a dieta restritiva e a rápida perda de peso podem levar a mudanças duradouras que podem desacelerar seu metabolismo, alterar hormônios que regulam a fome e dificultar os esforços para manter o peso.
Um corpo com peso reduzido responde de forma diferente aos alimentos e exercícios do que um corpo que não fez dieta, sugerem os estudos, e os músculos de quem está fazendo dieta podem queimar menos calorias do que o esperado durante o exercício. Essas mudanças ajudam a explicar por que pessoas que estão sempre "de dieta" podem estar comendo muito menos calorias do que aqueles ao seu redor, mas ainda não estão perdendo peso, explica Rudolph Leibel, professor de medicina do Instituto de Nutrição Humana da Universidade Columbia.
Como os hábitos alimentares são formados
Brewer, um psiquiatra especializado em vícios, testou uma série de práticas de mindfulness para ajudar as pessoas a parar de fumar, diminuir a ansiedade e reduzir a ingestão de alimentos por motivos emocionais. Ele também criou um aplicativo chamado Eat Right Now, que usa exercícios de atenção plena para ajudar as pessoas a mudarem seus hábitos alimentares.
Um estudo da Universidade Brown com 104 mulheres com sobrepeso descobriu que o treinamento de mindfulness reduziu a alimentação relacionada ao desejo em 40%. Outra revisão feita por cientistas da Universidade Columbia descobriu que o treinamento alimentar intuitivo e consciente muitas vezes resultou em pelo menos um benefício para a saúde metabólica ou cardíaca, como aumento dos níveis de glicose, redução do colesterol ou melhora da pressão arterial
Brewer observa que os comportamentos alimentares, como comer batatas fritas distraidamente ou comer sobremesas, costumam ser o resultado de ciclos de hábitos que são reforçados com o tempo.
Os laços de hábito podem ser formados a partir de experiências boas e ruins, segundo ele. Sorvete, por exemplo, é algo que podemos comer durante as comemorações. O cérebro aprende a associar comer sorvete a se sentir bem. Embora não haja nada de errado com o sorvete, ele pode se tornar um problema quando começamos a comê-lo sem pensar após um gatilho emocional, como quando nos sentimos estressados ou com raiva. Agora nossos cérebros aprenderam que o sorvete também nos faz sentir bem em momentos de estresse, reforçando o ciclo do hábito.
Com o tempo, podemos desenvolver uma série de hábitos que nos levam a comer quando estamos entediados, com raiva, estressados, cansados depois do trabalho ou apenas assistindo televisão.
— O complicado sobre os ciclos de hábito é que, quanto mais automáticos eles se tornam, com o tempo você nem mesmo escolhe conscientemente essas ações — diz Brewer.
Ao compreender seus próprios ciclos de hábito e os gatilhos por trás deles, explicou o especialista, você pode ajudar a quebrar o controle que eles exercem sobre você, atualizando seu cérebro com novas informações. Os exercícios de atenção plena, que o levam a desacelerar e pensar sobre como e por que você está comendo, podem ensinar seu cérebro que uma comida "agradável" não faz você se sentir tão bem quanto lembrava. Praticar a atenção plena a cada vez que você pegar um alimento ou decidir comê-lo pode interromper o ciclo do hábito.
Experimente o 'desafio de comer bem'
Comece a praticar a conscientização, desacelerando e pensando sobre o que você está comendo e por que está comendo. Tente não se concentrar na perda de peso, na restrição alimentar ou na eliminação dos alimentos favoritos de sua dieta. Evite rotular os alimentos como "bons" ou "ruins". Seu objetivo desta semana é focar nos sabores e texturas dos alimentos e em como você se sente antes, durante e depois de comer.
Pode levar algum tempo para desenvolver a consciência plena sobre o que você está comendo, então seja paciente.
Em um estudo, os participantes levaram entre 10 e 15 tentativas — para muitas pessoas, 38 ou mais — para começar a remodelar seus hábitos alimentares.
Aqui estão dois exercícios simples do programa Eat Right Now de Brewer para você começar.
1. Comece com um aquecimento antes da refeição
Antes de cada refeição desta semana, tente este exercício simples de conscientização. Não há necessidade de monitorar o que você come ou restringir sua dieta. Basta observar seu corpo toda vez que comer. Em uma escala de zero a 10, com zero sendo o estômago vazio e 10 sendo desconfortavelmente cheio, você está com fome ali no momento?
Na sequência, olhe para a comida, observando as texturas e cores. Agora cheire sua comida. Finalmente, pegue o garfo e dê a primeira mordida consciente. Enquanto mastiga, abaixe o garfo e preste muita atenção ao sabor e à sensação do alimento na boca.
Depois de várias mordidas, observar se você está com fome ou cheio. Você pode ouvir aqui o Dr. Brewer guiá-lo durante o aquecimento antes da refeição.
2. Mapeie seus hábitos alimentares
Use este exercício para melhorar algum comportamento alimentar que você gostaria de mudar, como comer demais ou pedir fast food.
Nossos hábitos alimentares têm três elementos: um gatilho, um comportamento e um resultado. Mapeando seus costumes, você pode fornecer a seu cérebro novas informações sobre como o hábito realmente faz você se sentir. Você pode baixar uma planilha no site do dr. Judson Brewer para ajudá-lo com este exercício.
Comece escolhendo um comportamento alimentar que você gostaria de mudar. Talvez você queira lanchar menos durante o dia, cortar delivery ou biscoitos, batatas fritas ou sorvete. Embora não haja nada de errado em desfrutar desses alimentos, você identificou isso como um comportamento alimentar problemático. Questione-se por que você pensa assim.
Agora pense sobre o que desencadeia esse comportamento. É uma emoção, como raiva ou estresse, ou você está se recompensando com uma guloseima? Ou pode ser uma situação, como assistir televisão ou fazer compras quando está com fome.
Concentre-se no resultado. Antes de comer, pergunte a si mesmo. O que estou ganhando com isso? Como vai me fazer sentir comer essa comida? Pense em como você se sentiu na última vez que comeu determinado alimento. Você gostou? Você acabou comendo muito? Você se sentiu desconfortavelmente cheio ou com náuseas? Você se sentiu culpado mais tarde e se culpou por comê-lo? Pensar em como um alimento faz você se sentir antes, durante e depois de comer atualiza as informações que seu cérebro tem sobre o quão gratificante (ou não) um alimento realmente é. E pode ajudar a quebrar a influência que um determinado alimento exerce sobre você.