Investigação

Idas a eventos e imóvel reforçam proximidade de Elmar com o "Rei do lixo"

Apuração da PF foi remetida esta semana ao Supremo Tribunal Federal

Elmar Nascimento, Sandro Mabel, José Marcos Moura e Antonio Rueda, em outubro do ano passado - Reprodução

O deputado federal Elmar Nascimento (União-BA) e o empresário José Marcos Moura, conhecido pelo apelido “Rei do Lixo”, mantiveram relação de proximidade nos últimos dois anos, incluindo o período próximo à deflagração da Operação Overclean pela Polícia Federal (PF).

A operação encontrou documentos de uma transação imobiliária entre Moura e Elmar, conforme revelou a CNN, responsável por julgar autoridades com foro privilegiado.

Em setembro, o empresário e o deputado assistiram juntos a um show de forró em Campo Formoso (BA), reduto eleitoral de Elmar. A investigação da PF foi remetida esta semana ao Supremo Tribunal Federal.

Elmar não figurou como investigado em nenhuma das duas fases da operação, mas a decisão de remeter o caso ao STF, comunicada na quinta-feira pela 2ª Vara Federal de Salvador, sugere que a PF encontrou indícios que ligam o caso a pessoas com foro privilegiado. Os autos estão sob sigilo.

Moura, cuja alcunha faz referência a serviços de recolhimento de lixo prestados por uma de suas empresas, a MM Limpeza Urbana, chegou a ser preso na primeira fase da operação, no início de dezembro.

A investigação da PF o apontou como um dos articuladores de um esquema de desvio de emendas parlamentares, mediante pagamento de propina para garantir contratos a outras empresas ligadas a seu grupo. Ele foi solto ainda em dezembro, mas está sujeito a medidas cautelares, como uso de tornozeleira eletrônica e proibição de manter contato com outros investigados.

Presença VIP
Três meses antes da prisão de Moura, o empresário recebeu tratamento de estrela durante um show do cantor de forró Nattan no Festival das Esmeraldas, realizado em Campo Formoso. A presença de Moura no festival foi revelada pelo portal Metrópoles.

Na transmissão do show, consultada pelo GLOBO, Nattan se dirige em mais de um momento a Elmar e Moura, que estão em uma área VIP no lado esquerdo do palco. Em uma passagem ao microfone, o cantor se dirige ao deputado com a frase “Elmar, o garçom me abandonou”, e em seguida chama o empresário: “Marcos Moura, pega seu copo que hoje nós vamos tomar uma”. O cantor também faz mais de uma alusão ao presidente do União Brasil, Antonio Rueda, também presente ao festival, a quem se refere como “Ruedinha” e “meu patrão”.

“Marcos Moura, dia 11 de novembro nós estamos em Las Vegas. (...) Cadê Rueda? Tem que respeitar esse Marcos Moura, o homem é do forró”, afirma o cantor.

Na ocasião, Elmar fazia as vezes de anfitrião de caciques do União Brasil no festival, buscando sinalizar respaldo da sigla enquanto articulava sua candidatura à presidência da Câmara. No ano anterior, o deputado havia convidado o ministro da Casa Civil, Rui Costa (PT), para o festival, em uma tentativa de se aproximar do governo.

Moura, por sua vez, havia se tornado integrante da direção nacional do União Brasil em junho, após Rueda assumir a presidência. A indicação do empresário foi atribuída ao ex-prefeito de Salvador, ACM Neto (União), outro cacique da sigla que foi ao festival.

Em outra agenda com Elmar, o empresário compareceu ao evento de comemoração da eleição de Sandro Mabel (União) à prefeitura de Goiânia, no fim de outubro. Rueda também foi ao evento.

O relacionamento entre Elmar e o empresário remonta a abril de 2023, quando o deputado comprou um apartamento da Patrimonial Moura, empresa ligada ao “Rei do Lixo”, em um condomínio de Salvador. A escritura da transação, conforme revelado pela CNN, foi encontrada pela PF em um cofre de Moura.

O documento afirma ainda que, na negociação, Elmar repassou a Moura um outro apartamento no mesmo condomínio. Em sua declaração de bens prestada à Justiça Eleitoral na eleição de 2022, Elmar havia afirmado ser dono de “50% (de) apartamento” no condomínio, e avaliou sua participação no imóvel em R$ 206 mil. Já o valor devido por Elmar a Moura na transação chegou a R$ 1,3 milhão.

Procurado pelo Globo, Elmar não retornou o contato.

Segundo a decisão judicial que autorizou a primeira fase da Operação Overclean, dados obtidos pela PF com a quebra de sigilo de Moura mostraram que o empresário atuava no “direcionamento de contratações públicas” em favor da Larclean Saúde Ambiental, empresa dos irmãos Alex e Fábio Rezende Parente. De acordo com a investigação da PF, que surgiu a partir de suspeitas em obras tocadas pelos irmãos na Bahia, a atuação do grupo mirou também outros estados, como Amapá, Goiás, Tocantins e Rio.

Levantamento do Globo identificou contratações da Larclean que hoje estão sob alçada do União Brasil. A empresa recebeu R$ 1,4 milhão em contratos com o governo de Goiás desde 2019, sob a gestão de Ronaldo Caiado (União). Também recebeu R$ 3,2 milhões por um contrato de dedetização firmado com a Secretaria de Saúde de Goiânia.

No Rio, a Larclean foi contratada, sem licitação, para prestar serviços de dedetização à Assembleia Legislativa (Alerj), sob a presidência de Rodrigo Bacellar (União), e recebeu R$ 63 mil até agora.