É perigoso entrar na água gelada em dias mais quentes? Especialistas revelam mitos e verdades
Em dias de altas temperaturas, há cuidados que podem ser tomados para evitar riscos como choque térmico e desidratação
Com os dias de calor intenso e muitas pessoas aproveitando o início do ano para tirar as férias, um destino surge em comum para os moradores do litoral: a praia. Um banho de mar gelado é uma solução para amenizar as altas temperaturas especialmente para aqueles que não têm um ar condicionado em casa – ou estão fugindo de um valor extra na conta de luz no fim do mês.
Mas será que existem riscos numa mudança tão abrupta de temperatura corporal ao sair de uma sensação térmica que pode chegar a 40ºC e entrar numa água que muitas vezes está abaixo dos 18ºC? O Globo conversou com especialistas que esclareceram os mitos e verdades sobre o tema.
Existe risco de choque térmico?
O cardiologista, professor da Universidade do Estado da Bahia (Uneb) e presidente da Sociedade Brasileira de Arritmia Cardíaca (Sobrac), Alexsandro Fagundes, explica que sim:
— O choque térmico é um conjunto de alterações que podem acontecer no corpo diante de uma exposição abrupta a uma mudança de temperatura do organismo. Isso é passível de acontecer ao se entrar direto na água gelada num dia de exposição muito forte ao calor, com sensação térmica acima de 40ºC, especialmente nos estados do Sudeste, onde a temperatura da água do mar costuma ser mais fria.
No Rio de Janeiro, por exemplo, desde a última sexta-feira a capital está com classificação Nível 3 de Calor, de uma escala de cinco, segundo o Centro de Operações Rio. O nível se estabelece quando há registro de 36°C a 40°C com previsão de permanência ou aumento por, ao menos, três dias consecutivos.
Para esta terça-feira, a previsão de máxima subiu no fim da manhã para 41°C. Já a temperatura da água do mar vai na direção inversa: chegou a 16,5°C em praias como Copacabana e Leme na manhã de domingo, algo típico da estação.
Quais os sinais de um choque térmico?
— Os riscos diante dessa mudança muito abrupta ao cair direto na água gelada é da vasoconstrição e das modificações reativas que a temperatura fria promove no organismo. Essa vasoconstrição pode alterar a perfusão de órgãos nobres, principalmente o cérebro, levando a uma hipotensão, abalos musculares, sensação de desmaio, tontura e eventualmente até ao risco de afogamento num caso muito extremo — explica Fagundes.
A vasoconstrição é uma redução do diâmetro dos vasos sanguíneos, ou seja, um estreitamento, e acontece em resposta à exposição abrupta a temperaturas mais baixas como um mecanismo fisiológico para evitar a perda de calor. No entanto, isso eleva a pressão arterial do corpo, o que pode alterar a perfusão (fluxo do sangue) em órgãos importantes, como explica o cardiologista.
Fagundes diz que sim, há cuidados que podem ser tomados para evitar um risco de choque térmico em dias de calor intenso, e um deles é molhar partes do corpo antes de mergulhar para que o organismo não sofra uma mudança brusca de temperatura:
— É importante tomar alguns cuidados para fazer essa mudança de temperatura de forma gradativa. Vale a pena ir molhando o corpo aos poucos. E estar bem hidratado também ajuda a evitar essa complicação. Além disso, jamais entre na água em lugares que não tenham alguma vigilância, alguém por perto, ou seja, a possibilidade de socorro caso alguma coisa lhe aconteça dentro do mar.
Crianças e idosos são mais vulneráveis à desidratação?
Marcelo Franken, cardiologista do Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, também reforça a importância de se estar bem hidratado nos dias de calor intenso e explica que a perda de fluidos também afeta a pressão arterial do organismo.
— O corpo humano tende a manter a temperatura constante entre 36ºC e 37ºC. Quando as temperaturas se elevam, o corpo dá início a mecanismos para resfriamento, como por exemplo a transpiração, que em excesso sem a adequada reposição de fluidos pode levar a desidratação — explica, e continua:
— A desidratação leva à diminuição da pressão arterial, perda da capacidade do organismo de levar sangue com nutrientes para todos os tecidos e alterações de eletrólitos no sangue. Isso poderá levar a sonolência, confusão mental, desmaios, e em casos mais graves arritmias, insuficiência renal, AVC e infarto.
Neste contexto, o especialista conta que sim, crianças e idosos são mais vulneráveis a cenários de desidratação: — Idosos sentem menos sede e muitas vezes não tem iniciativa para tomar água, crianças pequenas também só irão repor as perdas líquidas se forem oferecidas. Além disso, portadores de doenças crônicas vivem em um equilíbrio fino, com poucas reservas e o calor intenso pode causar desequilíbrio.